Quando cheguei a Mafra - depois desses meus inesquecíveis dias passados na Figueira - fui recebido com algumas repreensões da parte da tia Laura e dos meus pais. Eu tinha partido sem dizer adeus a ninguém nem dito para onde eu ia, tão ansioso estava de ir ter com o meu longínquo Hermínio!
O meu desaparecimento tinha sido confiado à polícia, tinham pensado nalgum rapto ou assassinato. Meus pais estavam num estado de angústia impressionante!
Após a minha reaparição no meu pacato panorama mafrense, tudo foi rapidamente posto numa prateleira - assunto arrumado - e eu pude retomar a minha habitual rotina ali à sombra do Convento. Voltei tranquilamente às minhas rotinas no Café Estrela com o Carretas e as minhas idas ao Correio, à Biblioteca, ao Jardim do Cerco, e aos meus cadetes.
Sempre que os cadetes chegavam para cumprir o seu serviço militar, fatalmente caíam ali todos no Estrela para um bom café e o convívio com todos os seus comparsas e usarem as mesas do Café como secretária. Era lá que eles escreviam as suas cartas, ouviam os relatos de futebol na rádio do Café, confraternizavam, jogavam às cartas e, através do frondoso vidro da montra, espiolhavam as formosas raparigas que passavam do outro lado do vidro, bamboleando suas garupas.
Penso que, como eles eram todos estudantes da Universidade de Coimbra, os que acabavam a sua Escola de Infantaria em Mafra e regressavam a Coimbra, largamente contavam como se tinham passado as coisas na tropa aos seus condiscípulos. Creio que era esse o caso, pois que frequentemente os que vinham pela primeira vez ao Café Estrela, vinham sempre ao balcão pedir uma bebida e depois ficavam ali especados, mirando-me fixamente, e acabavam quase sempre por perguntar se eu era o Rogério. Prova de que os que tinham partido tinham falado de mim aos acabados de chegar.
Um deles foi o Hermínio. Ele era um rapaz dos seus vinte e poucos anos, extremamente atraente. Era outra bela cabeça loira, como o Profírio, o tipo de homem que sempre muito me seduzira. Ele olhava-me insistentemente e, como eu esperava, pergunta-me se eu era o Rogério. Anuí! Ele apresentou-se como sendo o Hermínio, estudante de medicina na Faculdade de Coimbra!
Como quase todos os outros cadetes, Hermínio era alto, muito garboso na sua farda cinzenta e belas polidas botas até ao joelho, um dos meus mais voluptuosos fantasmas! Ela parecia um anjo, anjo que eu gostaria de capturar. Arrancar-lhes as asas e fazer dele a minha indefesa presa!
Numa voz muito envolvente, penetrando-me com o azul-marinho dos seus olhos entalados nas suas doiradas pestanas, enviava-me já aquele tipo de mensagem em código, pestanejada em morse, querendo fazer-me compreender que ele gostaria de me ter um dia nos seus braços. Como tantos outros no passado!
Feitas as indispensáveis apresentações, ele seguiu a sua vida e eu segui a minha: servir outros clientes, lavar as retretes, fazer pastéis de feijão, ir ao Correio, arrumar as cadeiras à volta das mesas sempre que um cliente partia, e escutar os conselhos da tia Laura. Ela nunca dava ordens, aconselhava sempre, coisas como: “Ó rapazinho, acho que devias limpar os espelhos, acho que estão um bocadinho sujos”... Ela nunca ordenava, apenas sugeria, tal como a minha mãe!
O Hermínio, como a maioria dos cadetes, passava as tardes no Estrela, na mesa da montra, a pôr a sua correspondência em dia, a jogar às cartas. A propósito de cartas, ele adorava jogar o Xadrês! Eu também gostava bastante desse jogo. Como ambos éramos grandes peritos dessa jogatana, ele frequentemente me convidava a jogar com ele. Como tínhamos pouca clientela da parte da tarde, juntava-me a ele e trazia o tabuleiro do Xadrês e acomodava-me na sua frente, à sua mesa, para mais outra movimentada partida. Essa famosa mesa da montra onde tanta vez me sentei só para ver passar os cadetes nas suas belas fardas, seus bivaques, e suas lustrosas botas até ao joelho.
Essas grandes partidas de Xadrês tornaram-se numa quase obrigatória rotina dessas longas nebulosas tardes de Mafra. Talvez porque em cima da mesa era o jogo das Damas, mas por baixo da mesa o jogo era outro!
Seus olhos enviavam-me continuamente mensagens duma lubricidade devastadora. Seus joelhos entalavam langorosamente os meus. Suas mãos desciam discretamente até aos meus joelhos, a quererem ir um pouco mais acima mas, ou ele não encontrava a coragem necessária para o fazer, ou seus braços eram curtos demais para alcançar o almejado alvo, que suas afiadas setas visavam incessantemente. Ficávamos sempre a meio meio-pau!
Essas duplas jogadas - sobre e sob a mesa - tornaram-se quase infalíveis diárias competições, às quais nem ele nem eu gostaríamos de falhar. Os nossos olhos, as nossas mãos, os nossos joelhos, que continuamente se procuravam, e que ao fim de incansável labuta sempre acabavam por se encontrarem, e entregarem a esso divino e pérfido jogo de sequiosas líbidos que eram mais fortes do que certas restritas imposições da Sociedade!
Às três, sem falta, lá vinha o belo Hermínio! Sentava-se sempre àquela mesma mesa e implorava: “Ó Rogério! Traz-me lá uma bica! Traz também o tabuleiro do Xadrês!”
Eu acorria pressuroso! Preferia mil vezes as excitantes artimanhas com o Hermínio, aos meus desenhos e leituras que habitualmente fazia da parte da tarde quando não haviam muitos clientes, ou qualquer outros importantes deveres a serem cumpridos.
Nessa tarde, ambos frente a frente, olhos nos olhos, joelhos contra joelhos, fizemos os habituais ataques sobre e sob a mesa. Ele acariciava as minhas coxas, seus olhos coriscavam desejos incontroláveis, mordiscava os seus carnudos beiços e constantemente os humidificava com a ponta da sua língua em fogo. Seus olhos penetravam-me o corpo todo, seus olhos ardendo num desejo inextinguível que só uma entrega total poderia apaziguar. Inesperadamente, suas coxas esmagam as minhas! Solta um grito, um daqueles gritos que só um orgasmo, pode causar. Seus olhos tão cerrados como cerradas estavam as suas coxas aprisionando as minhas. Num arremesso diabólico, a sua bela face crispa-se e abruptamente levanta-se como um tufão e atira com o tabuleiro do Xadrês ao chão e sai pela porta fora, desorientadamente ajustando a sua erecção e tentado encobrir a sua embaraçosa mancha de esperma a macular as suas apertadas calças cinzentas com botas até ao joelho.
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