mercredi 15 juillet 2009

Desejos incontroláveis











A minha rotina continuou como sempre:
levantar-me às sete da manhã, abrir as portas do Café, tomar o pequeno-almoço com as manas e o Carretas, mergulhar na azulínea mirada da tia Laura, servir os clientes e, às três da tarde, ir ao Correio comprar os meus selos e depois, sem bater, abrir docemente aquela porta azul que estava sempre apenas encostada para eu poder entrar o mais discretamente possível para evitar que os vizinhos começassem a cochichar.

A essa hora a Zinha estava sempre a fazer a sua sesta no seu grande leito de mogno, como se fora a bela adormecida, há cem anos aguardando o seu príncipe encantado que a viesse acordar com um suave beijo nos seus lábios ainda dormentes. Eu entrava pé ante pé e deitava-me a seu lado tentando não despertá-la. Colava ligeiramente os meus lábios aos dela, aquela tão apetecida boca que parecia estar ali à minha espera desde o princípio da Eternidade. Ela acordava languidamente e punha os seus braços de deusa em torno meu pescoço ainda quase virgem. Foi nessas muitas tardes juntos sobre o seu fofo leito que a minha sexualidade talvez tenha querido definir-se. Eu estreitava-a nos meus braços, beijava sofregamente a sua boca, a minha boca deslizava amedrontadamente em busca dos seus seios de mulher desejável, ia ao encontro daqueles rígidos mamilos. Minha boca abria-se para os sorver lascivamente, enquanto ela sufocadamente gemia de prazeres insuspeitos. A minha boca descia temerosamente ao encontro daquele ninho que eu queria descobrir, onde me queria anichar. Meu sexo irrompia desvairado, eu queria ser homem e desvendar esse fabuloso mistério, mas ela nunca consentiu que eu fosse tão longe como eu dava a entender. Ela apenas me disse uma única vez que se ela consentisse que tal acto fosse consumado, todos os mafrenses que a difamavam e acusavam de pedofilia acabariam por ter razão.
Ela queria que tudo o que era dito a nosso respeito pelas ruas de Mafra nunca passasse de calúnia!
Assim eu nunca consegui encontrar a resposta a esse meu tão grande desejo de saber quem eu realmente era, quais verdadeiramente as minhas tendências sexuais!
Depois dessas nossas muitas tardes interditas, antes de eu sair, ela limpava sempre as marcas do seu batom deixadas sobre a minha face ou sobre a minha camisa, com um lenço embebido do seu perfume, para eu não andar pelas ruas com vestígios que nos pudessem comprometer. Porém, mal chegado ao Café Estrela, a tia Laura, muito cinicamente, sempre me sibilava: “As bichas do Correio hoje chegavam até à porta! Pelos vistos estiveste encostado a uma senhora toda perfumada!”

Um dia a Silvina recebe uma carta do Presidente da Câmara, o Capitão Lopes, acusando-a abertamente de pedofilia e que, se ela continuasse a receber menores na sua casa, ele não poderia passar-lhe a anual certidão de bom comportamento, sem a qual ela não poderia reclamar a pensão do seu ex-marido. Assim, para continuarmos a usufruir das nossas pecaminosas tardes juntos, em vez de entrar pela porta da frente eu tinha que dar a volta e entrar pela porta do quintal, sem que os vizinhos se apercebessem. Mesmo assim os boatos continuaram a afluir e por fim, boatos e intrigas acabaram por vencer, abrindo-me um fosso à volta dessa casa amarela com barras dum tom azulado!
Encontrávamo-nos no Jardim do Cerco, às escondidas, para uma curta troca de beijos fortuitos e ponto final. Ela ia para casa e eu ali ficava só e desamparado naquele banco de jardim!

Os cadetes começaram a passar, sentavam-se a meu lado, pediam-me um cigarro, seduziam-me com seus olhos cintilantes de luxúria... depois, discretamente, conduziam-me até aos contrafundos do jardim, um sítio muito recôndito chamado Piquenique.
Foi no Piquenique que, com um pouco de saliva, penetrado brutalmente, me fizeram descobrir a minha genuína sexualidade!
Sexualidade essa que assumi e respeitaria até que sexualidade para mim houvesse!

Aucun commentaire:

Enregistrer un commentaire