lundi 20 juillet 2009

A mesa desolada


Nunca mais ouvi falar do Mariano, nem do Jorge nem da Encarnação.
O Jojo, muitas décadas mais tarde, encontrei-o por acaso em França, em Boulogne-Billancourt, onde eu então vivia. Ele dá-me a sua morada ali em Chaville, a dois passos, que viesse um dia tomar um copo “chez-lui”. O que aconteceu dias mais tarde.

Ele habitava com a mulher, numa pequena casa de campo, perdida na Floresta de Meudon. Tinha um filho adulto que nunca cheguei a conhecer.
Nessa tarde falámos de mil e uma coisas. Do que ambos tínhamos feito esses anos todos que nunca mais nos vimos.
Quando os assuntos se egotaram, acabámos de regresso a Leiria, nesses tempos quando ambos éramos jovens e tínhamos um futuro que nos acenava. Claro que o Mariano veio à baila.
Jojo, sempre pensára que eu tinha tido uma paixoneta por ele e não aquela paixão suicidária pelo Mariano
.
E nisso pairava um certo desapontamento.
Relembrou aquele dia em que eu me aprontava a saltar da sua janela abaixo, que se o tivese feito lhe teria causado uma carga de trabalhos. Que, afinal, viver valeria sempre a pena!
Para isso bastava acreditarmos em Deus e pôrmo-nos inteiramente nas suas mãos.
***

Alguns anos mais tarde, mudei-me para Meudon, ali muito perto da casa onde vivia o Jojo com a sua esposa. Um dia resolvo telefonar-lhe para sugerir-lhe de passarmos uns momentos juntos, mas quem respondeu à chamada foi a sua viuva!

João Paulo já tinha sido enterrado há tempos no cemitério de Chaville, víctima de um cancro.

Dele não me ficou nada, nem mesmo uma fotografia como recordação!
Apenas esta frustração imensa de nunca ter tido o Mariano nos meus braços, dentro de mim, nem que fosse apenas uma vez, um fragmento de dois instantes, uma só vez que talvez, a ambos, tivesse chegado? Que tudo teria sido esquecido em algumas horas, dias, anos?
Nunca o saberei, pois que ainda hoje penso nele e nos momentos de paixão que poderíamos ter vivido juntos se a Sociedade não fosse tão negativamente controladora dos destinos dos outros!
***

Que resta hoje de toda esta história?
Apenas uma mesa dessa Esplanada já sem mim, sem o Jojo, sem o Jorge, sem a Encarnação, sem o meu tão desejado Mariano que passou na minha vida como um rápido relâmpago numa inesquecível noite de Verão!

Agora, quem sabe? Quem estará neste momento à volta dessa mesa dessa esplanada da Praça Rodrigues Lobo, em Leiria? Talvez apenas alguns pombos famintos pousados sobre essa mesa desolada, essa mesa talvez agora com sauddades de mim, do Jojo, do Jorge, do Mariano?
Que será feito desse meu Deus do Olimpo que um dia quase me levou até quase ao Paraíso das Almas Penadas, para além do Arco Iris?

1 commentaire:

  1. A CRUZ


    Eu não morrera
    Simplesmente
    Deixara d’existir!
    E duma vida que perdera
    Apressadamente
    Dispursera-me a saír
    Fugia!

    Meu corpo inerte
    Na terra verde e fresca
    Da margem daquele rio
    Que a morte não desperte
    A vida grotesca
    Do meu destino tardio
    Jazia!

    Mas fugi daquele corpo inerte
    Rompi a teia d’arvoredo
    E no azul imenso mergulhei
    Que minha boca aperte
    Eternamente
    O segredo que nunca pronunciei
    Mentia!

    De mãos postas
    Junto ao queixo erguido
    D’olhos semi-cerrados
    Ao mundo virei as costas
    Como um foragido
    Dos caminhos errados
    Evoluia!

    No meu alar estatuificado
    Os sonhos brancos e leves
    Esvoaçavam etéreos no espaço
    Sobre meu corpo petrificado
    De mãos vazias sorrisos breves
    E duma vida que já não faço
    Fazia!

    Mas deram-me uma cruz
    Com uma doirada coroa de espinhos
    E pétalas dum sonho desfeito
    Para que a levasse a Jesus
    Mas perdi-me nos caminhos
    Nos caminhos do meu peito
    Perdi-a!

    E ainda hoje sem um lamento
    Continuo à procura
    Dessa cruz pesada e dura
    Que deixei caír no firmamento
    Vivia!



    Rogério do Carmo
    Leiria, 25 Novembro 1954

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