mercredi 30 septembre 2009
Por Favor Não Me Acordem!
Porém Miki continua bem vivo na minha mente e na minha vida! Por isso gosto de rever essas fotos que ele me fez, como esta quando ele deu comigo, todo nu, adormecido sobre os ladrilhos do meu quarto, junto à larga janela, onde eu me tinha deitado para um pouco mais de bronzagem. Foi a única vez que me vi dormindo! Quem me dera nunca mais ter acordado! Deve ser maravilhoso morrer jovem e nunca ter de enfrentar as humilhações que o tempo nos faz com o passar dos anos!
A Muda Guitarra
A vida continuou a sua rotina. Tanto no hotel como em casa. Eu ia para a cama com quem podia. No meu quarto ou no seu! O Miki, penso, de vez em quando ia às putas. Miki acabou por me aceitar tal como eu era e não como ele e o Moshé tinham insinuado que eu poderia ter sido. O Miki passava mais tempo em casa do que na galderice. O Garcia e o Moché entravam e saíam quando lhes apetecia! Para o Miki isso começou a ser a coisa mais normal da vida. Gostava mesmo de se mostrar comigo na rua, e se alguém se voltasse ou olhasse mais fixamente, ele perguntava abruptamente:
- מה יש? אף פעם לא ראיתה
(O que é que há? Nunca tinhas visto?)
Miki começou a tirar-me muitas fotos como recordação desses belos tempos que vivemos em Eilat. Uma das mais bonitas foi aquele que ele me tirou a fingir que tocava guitarra, empoleirado na janela do meu quarto, que dava para o deserto! Ele tinha comprado uma guitarra em segunda mão para aprendermos a tocá-la, mas nunca encontrámos um professor que nos ensinasse a tocar esse instrumento. Os únicos que nos poderiam ter ensinado eram o Nissim e o Yossy! Mas eles trabalhavam até altas horas da manhã e depois dormiam o dia todo. Nada a fazer! Resolvemos guardar essa bonita guitarra para decorar a sala.
Essa guitarra ainda existe. Encontra-se agora encostada a uma outra parede. A parede da sala do Miki, em Herzelia! Só que, o Miki já não lhe toca! Nem nela, nem em mais nada, nem em mais ninguém! Espera-me algures para de novo ficarmos juntos para todo o sempre, lado a lado! Eternamente!
Please Do Not Disturb
Na manhã seguinte, quando o Miki se levantou, Moshé já tinha seguido para Timna. Era evidente que Miki se tinha dado conta do que se tinha passado durante a noite nos meus domínios. De cara baixa, ele evitava olhar-me nos olhos. Enquanto se barbeava resmungou que me despachasse, que hoje tínhamos muito trabalho, que tínhamos cinco grupos que chegavam de Tel Aviv, que tínhamos que pôr as mãos à obra para que tudo estivesse em ordem para essa balbúrdia toda! Ao saír da casa de banho pede-me para eu me aviar, senão tinha que ir a pé! Ao sair dei com ele em cima da sua Lambretta à minha espera. Ao ver-me ligou o motor e avançou um pouco para me fazer lugar. Até chegarmos ao hotel nenhuma palavra foi trocada. Lá chegados cada qual tomou o seu caminho. O dia decorreu normalmente. Eu e a Cynthia preparámos tudo para receber os tais grupos que chegariam da parte da tarde. Orite apareceu de corrida para nos dizer que um dos grupos só chegaria por volta das sete da tarde, que tinha feito uma pausa em Beer Sheva! Tudo correu bem até às três da tarde, quando acabei o meu turno e o Zvika me levou a casa. Em casa tudo mergulhado em profundo silêncio. Tomei um duche, fechei as cortinas da sala e fui deitar-me para descansar um pouco. Mal tinha adormecido oiço passos. A porta guinchou um nadinha e, na minha frente, o Garcia sorria-me, perguntando-me se eu tinha tempo para ele. Claro que tinha sempre tempo para este tipo de visitas. Ele foi tomar um duche e depois veio meter-se comigo na cama. Como era de esperar, aquilo não era para uma sesta. As suas mãos começaram a percorrer o meu corpo todo. Claro que eu não resisti à tentação de o montar e procurar às cegas o meu tubo sobre a mesa de cabeceira. Quando eu estava a postos, a cumprir a minha obrigação de macho a provar ao Garcia que “aquilo” não doía, antes pelo contrário, o Miki entra-nos pela porta adentro. Primeiro estacou um segundo, depois foi ao seu quarto buscar não sei que documento, e voltou a sair sem sequer se voltar. O Garcia, depois do caso arrumado, fez as malas e deixou-me, desejando-me que o incidente não me causasse nenhum mal-entendido com o Miki. Ele seguiu a sua vida e eu fui tratar da minha. Fui à Merkaze fazer as compras e organizar o jantar para mim e para o Miki, para ver se as coisas não o tinham magoado ou ofendido muito. Passou-me pela cabeça o pedido que ele me tinha feito quando lhe bati à porta para partilhar o apartamento com ele: “Se quiseres foder, vai foder para o Deserto!”
Por volta das sete da noite, estava eu na cozinha a preparar o jantar - a mesa já estava posta na sala - Miki, muito sorumbático, entra pela casa dentro, dirige-se ao seu quarto e, logo a seguir, veio ao meu encontro, sempre muito macambúzio, com um daqueles avisos que se encontram em todos os quartos do hotel “do not disturbe”, para os hóspedes porem na maçaneta da porta, do lado de fora, para não serem incomodados. Ele põe-me esse pedaço de cartão na mão e, olhando-me nos olhos, deu-me uma das maiores provas de amor que me foram dadas na vida:
- Carmo! Quando quiseres foder, vai foder para a minha cama! Fecha a porta e põe esta merda na maçaneta, da parte de fora! Fode à vontade mas não me fodas os lençóis! Se for durante a noite, não é problema! Eu durmo na cama do Moshé! Tou fodido contigo! Um dia vou mas é fazer-me maricas! Porra, tu fodes mais numa semana do que eu no ano inteiro! Como é que vocês fazem? Nós, os homens, para foder uma gaja temos de casar com ela ou gastar uma porrada de massa!
Cavalgadas Até ao Amanhecer
Em Eilat, como em Mafra, quando eu era um rapazote, haviam duas sessões de cinema por semana. Umas às Quintas e outras aos Domingos. Raramente ia ao cinema pois que nem sempre os filmes me interessavam. Uma noite, porém, quando, pela segunda vez, fui ver o "A Leste do Paraíso", esbarro com o Moshé, que tínhamos conhecido em Timna. Ficámos ambos encantados com o reencontro. Perguntei-lhe se ele não receava voltar para Timna, altas horas da noite, no seu Jipe? Claro que o Moshé era daquelas obras primas da natureza que abriam em mim um apetite feroz! Lembrei-lhe que, se ele quisesse, podia dormir em minha casa. O que ele aceitou sem quaisquer reservas! Fomos de Jipe até à porta do Sing-Sing. Ele arrumou a sua viatura sobre o largo passeio, e entrámos para talvez uma noite de insónias. Ofereci-lhe um whisky enquanto lhe preparava a cama. Conversámos um pouco enquanto os meus olhos pastavam no seu belo corpo. Ele era casado, tinha dois filhos, vivia em Tel Aviv, e estava em Timna a cumprir um contracto temporário nas Minas de Solomão, em Timna. Que para ele era um grande desconforto viver longe das grandes cidades, e dos seus. Que em Timna ele trabalhava como um escravo, que até para enontrar uma mulher ele tinha que vir a Eilat. Nessa noite, como fazia muito calor, dormimos ambos todos nus cada qual na sua cama, apenas meio cobertos com um lençol. Vi-o despir-se frente aos meus olhos que mordiscavam gulosamente aquele corpo soberbo. Apaguei a luz e quando os meus olhos se acostumaram ao escuro vi que um raio de luar que entrava através das cortinas viera visitar aquele belo corpo como um suave holofote sobre o que havia nele de melhor. Algo que eu tinha vislumbrado quando ele se despiu. Como nessa noite Moshé não teve oportunidade de ir às putas, resolveu servir-se das pratas da casa. A sua mão direita fez um bom trabalho, pois que quando o leiteiro bateu à porta a casa estremeceu toda. Depois deste incidente, Moshé voltou para ir ao cinema e vir dormir a nossa casa. Uma dessas vezes que ele veio ao cinema, aparece-me lá em casa com uma dessas mulheres da praia para um whisky. Tomámos os três um whisky cada e, de repente, ele levanta-se e diz que já voltava, que ia comprar cigarros. A sós com essa Madalena Arrependida, procurei entreter a dama com algumas anedotas. Ela vem sentar-se junto de mim e procura dispensar-me os seus serviços. Assumido e corajoso como sempre fui, informo a senhora que eu estaria muito mais pelos ajustes com o Moshé. Ela, vexada, sai e bate com a porta.
Preparei a cama para o Moshé, esperando que ele regressasse rapidamente, pois que tinha que me levantar às seis da manhã. O Miki entretanto tinha voltado e ido para a cama e, como haitualmente, minutos depois já ressonava. Finalmente Moshé volta e senta-se em cuecas na borda da sua cama, mesmo em frente da minha, e entrou em confissões: que tinha percebido que eu o desejava, que isso era uma pena, para um rapaz como eu, não sair com mulheres, que eu devia fazer um esforço para por as coisas no seu lugar. Provalmente ele tinha esbarrado com a Santa Salvadora e ela pusera tudo em pratos limpos, pondo-o ao corrente de tudo. Veio sentar-se na borda da minha cama insistindo que eu devia tentar ir para a cama com mulheres, que ir para a cama com outros homens era uma desonra para o sexo-forte! Moshé vestia apenas as suas cuecas e pela sua abertura algo se avolumava e começou gradualmente a por-se à janela e a acenar-me loucas promessas. Fraco como sempre fui para resistir a tais oferendas, respondi às suas preces e, ajoelhando como um servo, fui serviçal. Moshé porém, como sexo-forte, queria ir mais longe ainda. Preliminares, para ele, eram apenas meio caminho andado. Soergue-se e, arrebatadamente, tira as cueacas, as dele e as minhas . Unta-se com o tubo de vaselina que estava em cima da mesa de cabeceira, sempre à espera do Garcia, brutalmente vira-me, galga-me e, com um insuspeitado frenezim, aponta e inrrompe! Sufoquei um grito para não acordar o Miki, mas senti-lo dentro de mim foi como romper todas as núvens para chegar ao sétimo céu! Ele cavalgou-me desenfreadamente até chegar à meta. Mas ao chegar à meta os urros foram tais que o Miki deixou de ressonar. Depois, naquela casa, até madrugada, todos dormiram como mudas pedras!
mardi 29 septembre 2009
Homens Há Muitos! Miki Só Um!
Outra bela recordação desses idos amados tempos em Eilat, foi certamente, quando eu e o Miki íamos fazer as nossas compras ao Merkaze e que, depois, sempre nos sentávamos a uma mesa na esplanada do Café para tomar uma bebida antes de voltarmos a casa. Ele fartava-se de gozar comigo quando eu pedia uma garrafa de leite Ucal. Ambos gostávamos muito de nos sentar ali naquela pequena esplanada depois das compras feitas. Uma vez ele sacou da sua Kodak e fez-me uma foto, dizendo que eu estava muito giro, que me ficava bem o cachecol. Já estávamos em Novembro desse ano de 1963, John Kennedy acabava de ser assassinado em Dallas e, em Eilat, os Invernos podem, por vezes, ser bastante frescos.
Uma dessas vezes, íamos de regresso a casa em cima da Lambretta quando, de repente, me ocorreu que me tinha esquecido de comprar cigarros e, ao passarmos em frente dum quiosque onde vendiam jornais e tabaco, pedi ao Miki que parasse uns instantes para eu dar um salto ao quiosque para comprar cigarros. Ele parou e eu dei uma corrida até ao quiosque. Miki ficou escarranchado na moto a roer as unhas. À entrada do quiosque estavam cinco jovens maltrapilhos a tomarem un capilé, fazendo uma grande algazarra. Ao verem-me apressadamente chegar-me ao balcão e pedir um maço de cigarros, eles olham-me com um evidente ar de troça, e um deles diz para os outros:
- Olha quem aqui está! Não sabia que os panascas também fumavam!
Eu ignorei o aparte e fiz como se não tivesse ouvido nada. Ao sair, pondo os olhos no chão, passo por eles sem lhes ligar. Um deles, o mais provocador, quando eu passo, chama-me maricas de merda! O Miki, sentado na sua moto, muito calmamente, levanta-se, pucha as calças para cima e, arregaçando as mangas, caminha vagarosamente na direcção desse pequeno grupo de rascas. Agarra pelos colarinhos o que me tinha insultado, e atira-lhe à cara:
- Olhe, seu paneleiro de merda! Eu cá cu não lhe posso dar, mas isto – mostrando-lhe o punho – posso!
E deu-lhe um murro tal na cara que o pobre estatala-se no chão com os beiços a sangrarem. Miki remonta a sua moto e pede-me para me despachar, para me empoleirar na moto por detrás dele,que me "agarrasse bem a ele", que tínhamos mais que fazer!
Fomos para casa sem trocar uma palavra. A vida continuou como se nada tivesse acontecido. Mesmo agora, tantos anos passados, este incidente nunca mais foi discutido ou relembrado. O Miki, mesmo no hotel, com alguns problemas que o Mr. Neiland por vezes me causava, defendia-me sempre de qual que fosse a afronta. Graças a ele, o Chefe do Pessoal aumentou-me o ordenado sem que eu o tenha solicitado.
O Miki foi realmente o melhor amigo que jamais tive! Esse amigo que Deus pôs no meu por vezes tão solitário caminho, e que depois mo tirou!!
Um Homem Nu em Akabá
Uma noite, depois de ter acabado o meu turno com a Cynthia, o Miki veio buscar-nos para um passeio no Negev. Cynthia teve uma ideia brilhante: como o seu pai já tinha ido para a cama e normalmente deixava as chaves do seu carro em cima da sua mesa de cabeceira, ela assegurou-se que ele já tinha adormecido, e foi surripiar-lhe as chaves do seu carro. Como a Miss Petersen estava nas redondezas, convidámo-la e ela aderiu. Fomos no carro do Mr. Neiland por esse Negev fora. O Miki ia a conduzir e passou-lhe pela cabeça fazer uma espécie de fórmola Eilat-Bersheva e acabámos quase em cima de três palmeiras mesmo à beira da estrada. A Cynthia gritou: “ai o carro do meu pai”, e eu gritei: arre-gaita, meti-me com malucos.
Saímos do carro e fomos dar uma passeata pelo Deserto. A lua cheia iluminava a imensa paisagem de dunas de areia adormecidas à nossa volta. As estrelas cintilavam e pairava no ar o desejo da Cynthia de levar o Miki para detrás das dunas, mas o Miki parecia mais interessado na Miss Petersen. Miss Petersen tinha o grande vício de me espreitar quando eu ia tomar banhos de sol todo nu junta à fronteira com a Jordânia, e andava sempre a tirar fotografias a tudo o que lhe passava pela frente para a sua colecção do Negev. Eu não fazia parte do Negev mas ela não resistiu à tentação de me fazer, sem que eu me apercebesse, dezenas de fotos minhas todo nu, deitado em cima da minha toalha, a ler um livro, ali à beira do golfo de Akabá. Ela deu-me algumas cópias dessas fotos, as quais passaram a fazer parte daquele “meu tesouro” que um dia foi engolido pelas águas revoltas da Mancha, durante uma violenta tempestade. O mais interessante desta história é que, há tempos, ao navegar no meu computador, deparasse-me a foto duma pintura que estou certo foi inspirada numa dessas fotos!
Tudo Experimentei na Vida!
Outra coisa curiosa que aconteceu no hotel, com o Mr. Neiland, foi que ele, um dia, ao passar pela recepção, ao ver-me a trabalhar ao lado da loira Bárbara e, como eu também estava bastante loiro por causa do sol misturado com um pouco de água oxigenada, veio até nós e, muito cinicamente, atira:
- Caramba! Dois loiros um ao lado do outro é bastante monótono! Já temos morenas, loiras, russas, a trabalhar aqui na recepção! Só não temos uma platinada! Olha, Carmo! Tu vais ser o primeiro platinado da recepção. Olha, vai ver a mulher do Zvika! Ela é cabeleireira, pinta o cabelo à Bárbara, que platine o teu!
Ele afastou-se e entrou no seu escritório. Bárbara olhou-me atónita e declara peremptoriamente que ela não se ia fazer platinada, que o problema era meu! Calei-me muito bem caladinho. Uma insidiosa idéia se tinha já alojado na minha cabeça louca: fazer um dia uma surpresa a todos! Mr. Neiland, Bárbara, e todos os outros!
Poucos dias depois vou falar com a mulher do Zvika e contei-lhe a história do Mr. Neiland. Ela achou graça à idéia, que estava certa que me ficaria bem ser platinado e, assim, ficou combinado que eu passaria pelas suas mãos, para ver quais seriam as reacções de todos no hotel.
Um certo domingo, volto à mulher do Zvika, entrego a alma a Deus, e pus-me à disposição dela. Sentei-me na sua cadeira e fiz as minhas preces. Meia hora depois vi-me ao espelho e nem sequer me reconheci. O meu cabelo estava como prata bem areada! E ficava-me bem! Parecia uma vedeta de Hollywood!
A primeira vez que o Miki me viu assim transformado, dá um berro e pergunta-me se eu estava bem dos cornos? Depois, muito divertidamente, passa-me a mão pela cabeça e diz-me, com ar muito matreiro:
- “Agora até eu te ia ao cu”!
Imediatamente me pediu para ir lá fora para me tirar o retrato. Sentei-me em cima da sua Lambretta que estava mesmo em frente da nossa porta, e o Miki fez-me uma foto. Essa foto ainda a tenho aqui religiosamente guardada, como se fora uma relíquia!
No dia seguinte, ao chegar ao hotel para fazer o meu turno da tarde, ficaram todos banzados! A Bárbara nem queria acreditar! Mas que me ficava melhor do que o meu cabelo oxigenado que parecia trigo pronto a ser ceifado. O Mr. Neiland, quando passou e me viu parou na minha frente, mirou-me durante uns segundos e, depois, clama que tinha dito aquilo na brincadeira, mas que a partir de agora eu passaria a ser a sua diva!
A Grande Surpresa do Dia
O dia a dia no hotel decorria normalmente. Fazia os meus turnos com quem calhava, pois que, entretanto, o Miki tinha sido promovido a Assistente de Director e Relações Públicas. Eu trabalhava umas vezes de manhã outras da parte da tarde. Umas vezes com a Bárbara, outras com a Cynthia. Gostava de trabalhar com a Bárbara, mas ela era uma mulher muito precavida e o trabalho tornava-se um tanto sensaborão, ao passo que, com a Cynthia, era uma grande festa! Ela era completamente destravada e divertida e trabalhar com ela era quase como ir ao circo! Ela continuava enfatuada com o Miki, mas certamente que, telepaticamente, tinha recebido o telegrama dele, informando-a que ela não era o seu tipo de mulher!
Continuava a almoçar ou a jantar no restaurante dos hóspedes, umas vezes com a Orite, outras vezes com a Cynthia, outras com ambas mas, duma maneira geral, reuniamo-nos todos no Sing-Sing para uma copaneira e grandes farras, pois que tinha comprado o meu primeiro gira-discos da minha vida! Uma manhã, decidira ir cortar o cabelo à Merkaze e, ao passar pela loja dos discos, com grande surpresa, vislumbrei a capa dum 33 rotações da Amália, com o título Raízes. Essas raízes chamaram por mim e eu entrei. Comprei o disco da Amália, a minha querida Amália, mas ao realizar que eu não tinha um gira-discos em casa, comprei um! Fui para casa a correr, carregando o meu grande tesouro! Nem sequer cortei o cabelo! Chegado a casa instalo o gramofone em cima da minha mesa de cabeceira e ouvi o disco uma dúzia de vezes umas atrás das outras! Até que uma vizinha me bateu à porta para me dizer que gostava muito de Amália Rodrigues mas, o dia todo era demais!
As Obras ao Lado do Sing-Sing
Mas voltemos à nossa história: Havia igualmente a Miss Petersen, uma guia de turistas. Ela era sueca, muito loira e muito camaradona, que habitava no hotel, e que se encarregava de organizar e receber grupos de estrangeiros que desciam até Eilat para visitarem o sul do Negev. Ela era uma das grandes amantes das minhas tentativas de grande chefe. Mas, sexualmente, eu continuava a morrer de fome e algo teria de ser feito com alguma urgência. Parecia-me que teria de recomeçar a fazer a rua a estender a mão à misericórdia! Um dia resolvi convidar os Ha’Parvarim. Nissim enchia-me bem as medidas. Eles aceitaram o convite. Gostaram dos aperitivos e do menu, mas as poucas e discretas tentativas de conquistar o Nissim foram por água abaixo! Algo teria de ser feito. O problema começava a ser grave. A minha grande arte da minha mão direita era uma maneira pouco eficaz de calar esses meus intensos desejos de carne viva.
Deixei de frequentar o “Sof Ha’Olam” e a começar a investigar por outros caminhos. Devia haver algures alguém tão morto de partilhar o seu corpo como eu. Um dia isso veio a acontecer. No Sing-Sing habitavam muitos colegas, jovens muito capitosos, mas sempre evitei - questão de táctica - de me desfraldar com aqueles com quem trabalho. Questão de bom senso ou covardia?
Comecei a caminhar à noite rua abaixo rua acima. O Miki sabia muito bem o que eu procurava, mas fechava os olhos. Uma noite sou abordado por um bonito rapaz que mal falava o Hebraico e nulo em Inglês. Vim a descobrir que ele era Argentino e aí ficou o assunto resolvido, graças às lições de Espanhol que recebera da Anita, em Beit Hashitá! Ele chamava-se Garcia e era um petisco. Seu pai devia ter sido um chefe de cinco estrelas. Tudo no lugar certo, muito apetitoso, mas bastante tímido. Ele, ali no meio da nossa rua sem tráfego algum aparte uma Lambretta de vez em quando, sob aquela lua cheia, o seu cabelo loiro e seus olhos dum muito pálido azul, refulgiam na noite. Era evidente que ele estava à beira do precipício com vontade de se amandar mas faltava-lhe a coragem necessária para apenas mais um pequeno passo avante. Ele olhava-me com disfarçados apetites mas não ousava abrir aquela sua boca carnuda a pedir um beijo. Embaraçadamente, ousa perguntar-me que horas eram. Quando lhe disse que eram dez e meia, que andava ele a fazer na rua a tais horas? Um nadinha mais à vontade, perguntou-me se eu gostava de homens, que se falava nisso em Eilat. Disse-lhe que sim, se ele estaria à minha disposição? Perguntou muito a medo se isso entre dois homens fazia doer? Disse-lhe que não! Ele baixou consentidamente os olhos. Seus olhos vagueavam ao longo da rua e eu aproveitei a deixa para lhe sugerir que o melhor era experimentar para não morrer estúpido. Ele atreve-se a indagar onde, onde poderíamos nós fazer essa experiência. Olhei para a iluminada janela da minha sala e vi o Miki atravessando esse espaço. Pelos vistos Miki ainda se não tinha deitado. Como, mesmo ao lado havia aquela construção mergulhada na penumbra da noite, convidei-o a irmos procurar guarida nesses sombrios escombros. Ele pareceu-me amedrontado mas seguiu-me. Esse edifício ainda sem portas nem janelas ofereceu-nos o lugar ideal para nos tirar de misérias. Ele porque tinha medo, eu porque já estava de pau feito. Ali, naquele silencioso breu, apenas a lua a rasgar suavemente as trevas, ele entrega-se-me rendidamente. Beijo alvoroçadamente aquela boca que se me abria numa promessa semicerrada. Desabotoei-lhe a camisa para lhe morder os bicos do peito que se escondiam sob aquela loira penugem. Desci-lhe as calças e mostrei-lhe as muitas criatividades de que uma boca e uma língua são capazes. Ele gemia de prazer. Docemente tentei virá-lo contra a parede mas ele resistiu. Baixou-se para dar largas à sua boca e sua língua sobre o meu corpo todo que ele começou a despir. Quando lhe introduzi o meu pica-pau na sua boca, descubro nele uma sanguessuga não açaimada. Finalmente ele volta-se de sua livre vontade e pede-me por tudo que não lhe faça mal. Humedeci-lhe aquela sua entrada ainda não inaugurada, banhei a minha palpitante erecção na minha saliva na palma da minha trémula mão, apontei o dardo e disparei. Ele deu um grito mas não fugiu ao assalto. Pelo contrário, com ambas as mãos apartou aquelas sua belas e rijas nádegas para facilitar a introdução até à raiz do assaltante. Famélico como estava dum belo traseiro oferecendo-se-me tão generosamente, o caudaloso rio que corria tumultuosamente dentro de mim chegou subitamente ao mar, sem se dar ao trabalho de, primeiro, serpentear langorosamente o seu caminho por entre vales e montanhas antes de desaguar. Pressenti que ele ficara um tanto desiludido quando me perguntou se era tudo? Disse-lhe que não, que amanhã haveria mais! Que já era tarde e que tinha que me levantar às seis da manhã. Vestimo-nos em silêncio e antes de se afastar perguntou-me se nos podíamos ver outra vez. Apontei-lhe a minha porta e disse-lhe para nela bater no dia seguinte por volta das nove da noite para tomarmos uma bebida e conhecermo-nos um pouco melhor. Ele responde-me que sim, que morava na porta mesmo ao lado, no terceiro andar, mas que não podia convidar-me a subir, pois que ele compartilhava o mesmo apartamento com mais cinco jovens que trabalhavam ali nas obras. Antes de nos separarmos ele esmaga-me contra si e desta vez foi ele quem me retribuiu aquele sôfrego beijo que tinha aprendido comigo: profundo!
Os Belos Ovos Estrelados
Eu e o Miki continuávamos muito concentrados sobre a decoração do nosso apartamento. Um dia fomos comprar uma pequena mesa rectangular e quatro cadeiras que pusemos na sala, junto à janela fronteiriça, sobre um grande tapete de plástico. Como tínhamos uma cozinha já bastante bem apetrechada e eu com vontade de explorar os meus talentos como cozinheiro, começámos a convidar colegas e amigos para jantaradas a quatro. E convidados não faltavam! Os meus petiscos começaram a serem muito falados. Todos os nossos colegas que também habitavam no Sing-Sing começaram a ser clientes assíduos. Havia também a Cynthia, a filha do Mr. Neiland, que também trabalhava na recepção, a qual andava muito enfatuada com o Miki, mas o Miki não parecia muito interessado nas suas pouco discretas proposições. Ela vinha muito frequentemente visitar-nos na companhia da Orit. Foram serões que se gravaram na minha memória, e espero que também nas memórias daqueles que connosco os partilharam.
A propósito da minha cozinha, ocorreu-me agora um incidente muito divertido. Uma manhã, quando decidi fazer o nosso pequeno almoço, ia fazer uns ovos estrelados para ambos quando, ao pôr a frigideira sobre aquela rodela eléctrica onde eu cozinhava, apercebi-me que a coisa não funcionava. Acendi a luz da cozinha para ver se havia electricidade e não havia. Experimentei todos os interruptores da casa e nenhum deles deram à luz! Concluí que tinha havido um corte de electricidade. Fui bater à porta duma vizinha para ver se ela também tinha o mesmo problema. E tinha! Como sempre, eu andava descalço! Ao regressar a casa, quando pisei o meu degrau da porta, esse degrau escaldava. Passou-me pela cabeça fazer uma experiência! Eu sempre gostei de fazer experiências, fazer coisas que nunca ninguém tinha feito. Pois bem: lavei o degrau da porta muito bem lavadinho, pois que não tinha havido nenhum corte de água. Deixei secar o degrau, pus-lhe em cima um pouco de margarina, esperei que ela derretesse, parti dois ovos em cima, pus um pouco de sal e pimenta, e fui fazer a barba. Depois de ter feito a barba voltei ao meu degrau, e ele tinha ali à minha espera um bonito par de ovos estrelados para o Miki. Ele ficou encantado com os ovos e com a minha engenhosidade. A partir dessa data ele começou a chamar-me “senhor engenheiro”!
lundi 28 septembre 2009
As Drogas do Beira Mar
A minha penúria de sexo começou gradualmente a apoderar-se do meu corpo, de todo o meu sistema nervoso! Algo teria de ser feito no sentido de calar esse meu corpo que constantemente me pedia esse extraordinário prazer físico que, para mim, era como pão para a boca! Comecei então a vadiar pelos contrafundos de Eilat em busca duma bucha. Porém, à noite, Eilat era uma vila morta. Só lá em baixo, nas margens da praia, se esbarrava com outros mendigos desse mesmo linimento. Muitos deles estavam apenas de passagem para certamente curtas férias ou, muito mais frequentemente, em busca de droga. Nesse tempo o já então muito popular Haxixe, do qual uns eram dependentes, outros que, igualmente, faziam um negócio vergonhoso desse maléfico ingrediente. A única droga de que eu era e sou dependente é o tabaco. Fazia-me pena ver os dependentes desesperadamente procurarem Haxixe por toda a parte, como eu tanta vez fiz em relação ao tabaco. Eu seria capaz matar por apenas um maço de cigarros quando as tabacarias estavam cerradas! Jurei a mim mesmo nunca tentar outras drogas. O Tabaco era mais do que suficiente para fazer de mim um escravo! Comecei a fumar por causa de, quando era puto, ver os homens fumar por toda a parte, e eu também queria ser muito homem. Depois haviam aqueles gigantescos cartazes a anunciarem Marlboro, com aquele belo machão de calças muito justas e chapéu à três pancadas, em cima dum belo cavalo, a insinuarem e sugerir aos homens que para sê-lo era absolutamente necessário fumar Marlboro. E nós, os imbecis, deixávamo-nos ir na conversa. Éramos, somos, e sempre seremos, uns manipulados dessas publicidades e desse repugnante “marketing” nas poderosas mãos de detestáveis malabaristas que só pensam nos lucros, ignorando expressamente todos os inconvenientes que isso possam trazer à saúde dos consumidores, e da Natureza. Revolta-me estar ao corrente de que andam por aí a abater vigorosas árvores, o pulmão do nosso planeta, para fazerem prospectos que invadem as caixas de correio de cada um, prospectos esses que são apenas atirados ao lixo sem sequer serem lidos! Por isso eu não queria novas drogas a fazerem de mim mais uma outra vítima dessa ignóbil manigância de certos oportunistas sem respeito pelos outros. Comecei a evitar essa praia à noite pois que havia Haxixe por toda a parte a contaminar aquele leve ar puro das quentes noites de Eilat. A minha outra droga, além do tabaco era o inevitável coito, essa artimanha da natureza para que todas as raças se reproduzam. Nesse campo eu não podia fugir à regra. Uns procuravam Haxixe, eu apenas um bom traseiro do qual eu era um insaciável adito. A outra grande droga que a Sociedade me fazia ser totalmente dependente, era essa chamada Dinheiro, com a qual se pode comprar outra grande droga: o Poder! E pelo qual, neste mundo, andam por aí muitos carnívoros à solta nesta impiedosa selva chamada Terra! Terra de todos e de ninguém, pois que, seja quem for, só estamos de passagem!
Sof Há'Olam - O Fim do Mundo
Uma noite, para variar, fomos ao “Sof Ha’Olam”. Nessa altura actuava lá um Duo muito popular em Israel. Eles eram realmente excepcionais. Nessa noite descobri essa espécie de gruta que era esse “Night-Clube”. Mal entrávamos, haviam logo na nossa frente uns degraus de pedra a descer. Lá em baixo era algo que nos lembrava um antro, talvez uma caverna de Ali-Bábá. Não haviam mesas nem cadeiras, apenas um alto degrau todo à volta do recinto onde as pessoas se sentavam com o seu copo na mão. Ao centro, em terra batida, a pista de dança. Frente a essa pista, um simulacro de um diminuto palco onde esse Duo tocava e cantava. Eram o Duo Ha’Parvarim. Um deles, o mais bonito, chamava-se Nissim. O outro, mais comummente constituído, chamava-se Yossy. Ambos lado a lado, de pé, cada qual com a sua guitarra, atiravam ao público o seu bonito repertório. Das suas muitas cantigas, havia uma que depressa se tornou a minha preferida: “Erev Shel Shoshanim"! Seria essa cantiga que o Nissim me cantaria cada vez que ele passava por mim na rua, ou se sentava no mesmo Café que eu na Merkaze. Ele era um rapaz formosíssimo e apercebera-se que eu me tinha apercebido...
As Minas de Salomão
Eventualmente, Miki realizou o seu grande sonho de começar a fazer os turnos diurnos. Quando o Mr. Neiland o informou que ele iria fazer esses seus tão almejados horários, ele atira ao sorumbático director:
- Obrigado, mas só aceito com uma condição! Quero o Carmo para me assistir! Ele é um desperdício a trabalhar de noite. Ele vale mais do que isso!
Isto feito, começámos, não apenas a compartilhar o mesmo apartamento, como também os mesmos turnos! Ele começou a tomar gosto pelo apartamento e também, de vez em quando, chegava a casa com mais algum atributo para que a casa ficasse cada vez mais aprazível. Começámos a dar grandes voltas de Lambretta, para me fazer conhecer certos recantos do Deserto do Negev. Um deles, as Minas de Salomão, esse espectacular monumento da prodigiosa Natureza! Foi aí que encontrámos um belo israelita de Tel Aviv que trabalhava nessas minas. Falámos acerca do que é viver e trabalhar ali sepultado no ventre do Deserto, sem ter onde ir: um Cinema, um Café, um Restaurante! Ele, o Moshé, informa que ia frequentemente a Eilat para um passeio à beira-mar, tomar um café, e ver gente. O problema era que ele nunca podia ir ao cinema, porque para isso teria de ir de Jipe, e uma vez, de regresso à sua tenda, foi atacado por beduínos que o maltrataram para lhe roubar a carteira, e que não lhe tinham roubado o Jipe porque eles tinham os seus camelos pessoais que não queriam abandonar no Deserto. O Miki, um tanto confrangido, oferece a nossa morada ao Moshé, para quando ele quisesse ir ao cinema, que fosse, que podia dormir na nossa casa, na outra cama da sala. Ele ficou muito sensibilizado com a oferta e ofereceu-nos a sua tenda, para vivermos essa grande experiência que é dormir no meio do deserto do Negev. O Miki disse-lhe que ele podia vir quando quisesse, pois que, à noite, estávamos quase sempre em casa!
Um Lugar ao Sol
Depois MikI pegou na Lambretta e foi mostrar-me outras pequenas áreas mais ou menos isoladas de Eilat. Todas ali à volta do Sing-Sing. Mostrou-me o bairro onde moravam os pedreiros da construção civil, todos imigrantes que vinham do Yemen, assim como alguns palestinianos. O mais excitante de tudo, foi a descoberta do único “Night-Club” lá do sítio. Era o “Sóf Ha’Olam” que, traduzido em Português era “O Fim do Mundo”. E realmente era! Era uma velha casa, talvez dos tempos dos beduínos, que tinha ares de antiguídade encontrada nalguma escavação arqueológica. Ele disse-me que ia lá muita vez para dar ao pé ou engatar uma gaja. Que uma destas noites, me levaria lá, que eu ia gostar, que por lá também andavam muitos turcos que procuravam “zein”. Quando lhe perguntei o que era “zein”, pensando que era alguma droga ilícita, ele explicou-me que era aquela droga muito lícita que os homens que se prezam badalhocam o tempo todo entre as pernas. Depois voltámos a casa e limpámos um pouco o apartamento. A casa de banho estava num estado de porcaria geral. O espelho estava tão sujo que nem sequer nos podíamos ver para fazer a barba! Tínhamos, como janelas para a rua, a cozinha e a sala de entrada, que passou a ser o meu quarto. Para as traseiras tínhamos a janela do quarto do Miki e a grande e rasgada janela da sala. Essa janela dava para o Deserto do Negev. Como estávamos num rés-de- chão, era proibido abrir a janela por causa das tempestades de areia. De resto o calor era tanto que fechávamos todas as janelas para ele não entrar. Graças aos progressos de então, já tínhamos uma espécie de ar condicionado que o Miki tinha comprado na loja dos artigos eléctricos do Centro Comercial que se chamava “Merkaze”! Eu tomei gosto pela casa e comecei a, além de a limpar, a decorá-la. Comecei a ir à Merkaze comprar tecidos, colchas para as camas, coisas para pôr nas paredes, coisas para a cozinha de forma a poder improvisar uma refeiçaão quando necessário, poder fazer um bom café, enfim, fazer desse apartamento um lar para mim e para o Miki, coisa que ele pareceu bastante apreciar. Fiz cortinas para as janelas, instaladas com pioneses, enfeitei as camas com bonitas colchas, e como não tinha nada para as paredes, pintei um quadro para a sala - “As Três Graças” - para pôr por cima do meu divã que eu tinha transformado em canapé, com algumas bonitas almofadas que tinha adquirido numa das botiques da Merkaze. Comprei madeira numa loja mesmo em frente para fazer uma mesa baixa para pôr em frente da minha cama, assim como uma mesa de cabeceira para acomodar o meu despertador e o meu transístor. Em cima da mesa baixa pus uma jarrinha com flores, algumas revistas, e um grande cinzeiro. Miki, cada vez que chegava a casa imediatamente se apercebia da novidade. A cada vez ele dizia, brutalmente a esconder uma ternura sempre crescente:
- Shmok! Ishtágátá? Náfáltá ál há'roche? Bishvil má kól zé?
(Caraças! Caiste em cima dos cornos? Para quê esta tralha toda?
Mas na sua voz pressentia-se uma gratidão imensa, por detrás daquela rudeza! Sem que da sua boca saísse uma palavra, sentia-se que ele apreciava o facto de eu ter feito daquele apartamento sem alma um lar para ambos. Muitos anos mais tarde, na sua casa em Herzelia, já casado e com três adoráveis filhos, sentado na sua cadeira de baloiço no seu grande terraço, olhando-me em silêncio nos olhos, dessa boca donde normalmente só saíam grosseiras pragas, saíram as palavras mais maravilhosas que eu nunca tinha ouvido:
- Carmo, amo-te!
Foi a primeira e a última vez na minha já tão longa vida, que alguém ousou lançar-me essas mágicas palavras que têm o condão de nos invadir a alma e dar-lhe asas para mais altos voos!
O Bikino Escandaloso
Por volta das sete da manhã o pessoal começou a chegar para retomarem os seus postos. O Tzvika foi um dos primeiros, chegando com o furgão do hotel a abarrotar de gente. Aparentemente ele ia acordar o pessoal todo no Sing-Sing e depois transportava-os para o hotel. Um dos matinais passageiros era a Bárbara, que vinha tomar as rédeas da recepção, assim como pessoal da cozinha, empregados de mesa, e mulheres de limpeza. Quando eu estava muito entusiasmado a travar conhecimento com a Bárbara, por detrás de mim oiço uma voz feminina que me era muito familiar! Volto-me e quem vejo eu? A Orit! Ela estava agora a trabalhar no A Raínha do Sabá como responsável das reservações! Eu nem queria acreditar! Foi uma alegria e quase uma festa! Como eu tinha que aguardar a chegada da Governanta para resolver o assunto das minhas fardas, fomos, eu, ela, e o Miki, tomar o pequeno almoço no restaurante dos hóspedes, pois que nesse hotel nós éramos considerados pessoal com direitos a certas regalias. Durante esse lauto pequeno almoço israelita falámos de montanhas de coisas e, depois, cada qual tomou o seu rumo. Eu fui com o Miki à Governanta para obter a minha farda e, depois, a cavalo na Lambretta do Miki, lá voltámos para o Sing-Sing. Pensava que íamos logo para a cama, mas isso não eram os hábitos rotineiros do Miki. Ele preferia dormir da parte da tarde e aproveitar as manhãs para ir à praia ou tratar doutros assuntos pessoais. Em vez de nos irmos deitar, Miki levou-me a conhecer os poucos comércios ali à volta. Além do Sing-Sing, ao lado qual construiam um outro bloco de apartamentos, haviam algumas casotas de madeira e, mais abaixo, na descida que nos levava até ao Mar Vermelho, havia um grande Centro Comercial onde havia um pequeno hotel, os escritórios da Arkia, um grande Café, e muitas boutiques onde podíamos comprar roupa e sapatos. Assim como uma farmácia sob o consultório do único médico estabelecido nesse aglomorado. Havia também uma barbearia e, mesmo ao lado, uma loja de discos. Fizémos umas compras! O Miki comprou café e açúcar para levar para casa, e eu, vaidoso, comprei um bonito bikini que tinha visto na montra duma dessas botiques que vendiam roupa para homens, senhoras, e crianças. O Miki imediatamente reagiu, protestando “que a merda do bikini” iria dar que falar na praia, que aquilo era uma paneleirice de trazer por casa.Que comprasse mas era uns calções à homem!
A Raínha do Sabá
Horas mais tarde fui acordado com uma palmada do Miki. Disse-me para me despachar, para tomar um duche e vestir-me para irmos trabalhar. Que tinhamos de jantar e fazer as nossas horas e que, na manhã seguinte, a Governanta teria de me encontrar uma farda.
Ao sairmos montámos na Lambretta e vamos por aí abaixo nas calmas. Era noite cerrada e fazio um calor irrespirável. Eilat à noite era apenas algumas luzes que tremeluzavam aqui e ali. Lá em baixo, ao fundo, à beira do Golfo de Akabá, A Raínha do Sabá fulgurava sob os holofotes. Do outro lado do golfo, as milhentas luzes de Akabá reflectiam-se, ondulando mansamente, sobre as águas dormentes do golfo. Os únicos ruídos eram o motor da Lambretta, os grilos ralos e, de vez em quando, vindo dos contrafundos do Deserto adormecido, alguns uivos de lobos perdidos na noite.
Chagados ao hotel o Miki arrumou a sua Lambretta contra um muro exterior do hotel, ali logo à entrada. Entrámos para receber das mãos da Bábara - uma loira muito bem apresentada na sua farda castanha - que me desejou as boas-vindas enquanto entregava ao Miki o seu turno e as instruções para a noite. O Mr. Neiland já tinha ido para a cama e, do Bar do hall, quase em frente da recepção, chegava até nós música muito alta, as vozes de muita gente muito animada, e o tilintar de alguns copos certamente bem atestados. Havia uma pequena porta que nos conduzia a uma outra depedência na rectaguarda da recepção, onde estava instalado o P.B.X., onde um jantar para dois nos aguadava. Enquanto o Miki se ocupava dos hóspedes que se chegavam à recepção para algum qualquer serviço, eu ingeri metade daquele jantar para dois. Depois fui eu para a recepção enquanto o Miki acabava os restos desses manjares por mim deixados. A essa hora havia já pouco movimento no hall, apenas clientes do Bar que, meios ébrios, vinham buscar a sua chave para subirem aos seus aposentos, para bem curtirem a piela depois da devida “pirocada” nas respectivas consortes ou uma longa e desabrida foda nalguma distraída ninfa pescada no bar, ou ainda toda molhada acabada de sair dum mergulho na piscina.
Só começámos a entrar nas contas correntes quando a algazarra acalmou um pouco. Claro que esse trabalho eu jáconhecia, pois que, tal como o Miki, o tínhamos aprendido juntos no Tadmor. O trabalho foi rápido porque tudo se tinha passado bem durante os dois turnos diurnos. Caso contrário, por vezes, para se encontrar uma diferença dum cêntimo, tinhamos que percorrer todas a contas dos clientes para ver onde se encontrava o logro, e isso podia tomar-nos a noite toda.
Depois do trabalho terminado, o Miki mostrou-me o hotel todo. Havia o hall e, nesse espaço, haviam os elevadores que subiam e desciam o tempo todo, um pouco mais calmos durante a noite. Havia a passagem para a grande sala de jantar do hóspedes e, mesmo ao lado, o Bar. O Bar era enorme e havia um reboliço infernal. Daí passava-se para o grande jardim das traseiras onde se encontrava a pequena piscina, onde, contaram-me depois, os camelos vinham matar sede durante a noite e, que, uma dessas noites, um deles apeteceu-lhe um copo e entrou no Bar, o que causou quase uma catátrofe, pois que os clientes começaram aos gritos, e o camelo assarapantou-se e ia atirando com algumas mesas ao chão. Depois Miki deu-me algumas chaves de quartos disponíveis, para eu ir visitar e ver que tipo de quartos eu proporia aos futuros clientes. Os quartos eram todos espaçosos, bem mobilados, espaçosas casas de banho, e uma grande varanda a dar para Akabá e, as dos quartos das traseiras, que davam para o Deserto. Aí eu já começava a prever um sério problema técnico: iria certamente ter hóspedes que prefeririam quartos com vista para o Deserto, e outros iriam preferir com vista para Akabá, para esse belo Golfo do Mar Vermelho! Duma dessas varandas espreitei aquele céu coberto de míriades de estelas cintilantes. O calor permanacia e parecia bafejar as águas tranquilas do Golfo, onde as foscas luzes de Akabá, como lamparinas, ondulavam mansamente, como preguiçosas serpentes sem pressa de chegar à costa, numa repetitiva e constante cintilação duma infinita e efémera beleza.
O resto da noite, depois de terem fechado o Bar, foi traquila. O Miki levou-me lá fora através da entrada principal, para me mostrar aquele romântico pequeno lago com um grande repuxo ao meio, onde, nas suas águas froxamente iluminadas, centenas de peixes de todas as cores que, ou dormiam a nadar, ou nadavam a dormir. Era nesse lago que, durante o dia, os camelos selvagens vinham matar a sede com a sua progenitura. Mostrou-me igualmente o campo de Ténis onde nós num futuro muito próximo aprenderíamos a usar as raquetes. Miki apontou-me aquela lua dum tamanho desmesurado que, mesmo assim, não conseguia apagar aquele deslumbrante fulgir desses milhões de estrelas cintilando. Sentámo-nos na borda desse lago para fumarmos um cigarro. Miki foi abrir a janela que dava para a recepção, no caso do telefone tocar. Passámos aí uns bons momentos a despeito do calor que nos mordia a pele. Miki aproveitou esses instantes para se desculpar da sua agressividade quando tínhamos batido à sua porta “ao meio da noite”, como ele se referiu. Depois abordou a causa da sua recusa de partilhar o mesmo apartamento comigo. Que no Tadmor tinham reparado que eu andava sempre pendurado no belo Mário, e que havia um senhor muito loiro que quase todos os dias esperava por mim no seu descapotável, mesmo em frenta da Pnimiá. Que todos, a meia-voz, falavam da minha suspeitosa atração pelos homens. Disse-lhe que não era problema, que a Governanta tinha prometido encontrar-me um outro quarto. Ele reagiu quase brutalmente, afirmando que se estava cagando para os outros, que ele gostava de mim tal como eu era, precisamente porque não era como toda a gente. Que eu era especial! Depois, pousando uma das suas mãos sobre o meu ombro, disse-me quase paternalmente:
- Carmo! Agora vais descançar um pouco sobre um dos canapés do hall enquanto eu acabo o meu trabalho, e depois ficas tu acordado para controlar o tráfego, e eu vou fazer uma soneca!
jeudi 24 septembre 2009
O Sing-Sing
Ela convida-me a segui-la até ao seu gabinete. Aí ela explica-me que ia por-me a partilhar um pequeno apartamento lá em cima, no Sing-Sing, um acabado de ser erigido bloco de apartamentos onde, aparentemente, alojavam todo o pessoal do hotel. Ela encontrou apenas uma vaga a partilhar com o “night-auditor”. Foi à procura do chófer da casa, aquele Tzvika que me tinha conduzido do aeroporto, que nos levou até ao Sing-Sing. Durante o caminho ela explicou-me que era o apartamento do “night-auditor” e que a essas horas ele devia estar a dormir para começar o seu turno às onze da noite.
Ela bate docemente com as nozes dos dedos naquela porta naquele rés-de-chão. Ninguém repondeu. Ela insiste - que ele certamente estava muito ferrado no sono - e continuou a batucada. Subitamente ouve-se uma voz rouca, muito irada, a pragujar por detrás dessa muda porta. Alguém abre uma greta da porta e vocifera:
- Que raio de vida, nem se pode dormir nesta casa?
Ela explica-lhe que eu era o outro night-auditor que vinha trabalhar sob as suas ordens. Ele olhou-me, reconheceu-me, e atira à queima-roupa que não queria hóspedes lá em casa! Ela insiste, que seria apenas por uma noite, que depois ela me arranjaria outro quarto para mim. Ele concorda, mas “só uma noite”! Eu entro e a house-keeper volta para o carro do Zvika.
Quem assim falara fora alguém a quem muito queria! O Miki! Ele, o meu querido Miki, volta para a sua cama para dormir até às dez da noite, para pegar o serviço às onze horas. Eu fiquei chocadíssimo com a sua atitude. Nós éramos já amigos de longa data e recebia-me assim tão mal? Que bicho lhe lhe teria mordido?
Como nessa casa de entrada haviam duas camas, escolhi uma delas e meti a minha mala debaixo da dita. Não sabia realmente o que fazer. O comportamento do Miki tinha-me magoado profundamente no meu orgulho e sobretudo naquela indiferença à nossa velha amizade! Deitei-me sobre a cama sem abrir a mala e organizar-me, pois que, para meu grande amargor, o Miki não me queria lá em casa! Tive vontade chorar mas retive as minhas lágrimas. Deitei-me sobre a minha cama indagando que se teria passado com o Miki para, subitamente, jão não apreciar a minha companhia?
Momentos depois, arrastando os pés pesadamente sobre os ladrilhos, Miki vem ter comigo, senta-se na borda da minha cama, e começa, gaguejando, a tentar explicar-me a situação. Ele recua no tempo para me por ao corrente do que se passava na sua cabeça. Que era um escravo que os outros pensavam e diziam. Que tinha compreendido que eu não era como ele de muitas maneiras, muito especialmente, sexualmente. Que tinha andado a enrabar o panasca do turco nas suas barbas, e que começara a correr um boato muito sério acerca da minha sexualidade. Não queria que, pelo facto de partilhar o seu apartameneto comigo, começassem a badalar que secalhar eu ia para a cama com ele ou vice-versa! Depois, pousando uma das uas mãos sobre a minha coxa, diz-me, ternamente:
- Instala-te, caralho! Promete-me unicamente não trazer gajos cá p’ra casa. Se quiseres foder, vai foder lá para pó Deserto! Descança umas horitas e depois vamos trabalhar para a nossa primeira noite de contas correntes. Tu não és parvo nenhum e rapidamente vais poder tomar o meu lugar. Eu quero começar a fazer os turnos diurnos! Tou farto de fazer de toupeira! Até já! Dorme! Depois jantamos no hotel antes de começarmos a fuçar!
O Malkate Shvá
Entro pela porta rotativa para, quanto mais não fosse, fugir àquele calor abrasador. Dirijo-me à recepcção para perguntar se tinham um quarto “single” só por uma noite e quanto isso me custaria. O jovem recepcionista, desoladamente me informa que estavam “overbooked”! Não havia mais quartos para mais ninguém! Aproveitei a ocasião para perguntar ao jovem se era verdade que eles procuravam um “night-auditor”. Ele respondeu-me muito entusiasticamente que sim, e levou-me ao escritório do Director Geral - o Mr. Neiland - ali mesmo à esquerda da recepção. Ele apresenta-me ao Mr. Neiland, informando-o que eu vinha para oposto de “night-auditor”! O Mr. Neiland, muito enfaticamente, me pede para tomar lugar na sua frente. Pede-me as minhas credenciais e diploma do Tadmor. Eu tinha apenas um Diploma e duas cartas de referências, ambas muito elogiosas: uma do Hod e a outra do Ginton. Ele fingiu consultar o meu diploma, pois que o Diploma estava descrito em Hebraico, e era evidente que ele não sabia uma palavra dessa língua morta, escutando o seu sotaque distintamente Sul-Africano. Ele leu atentamente as duas cartas, olhou-me de soslaio, e apresenta-me as condições e o ordenado, e fez-me assinar um contrato por três meses. Depois pega no telefone e pediu à telefonista para falar com a “housekeeper”. Como por milagre, ela apareceu ao umbral dessa porta que, mais tarde vim a perceber, só se fechava quando o Senhor Director recebia V.I.P.!
A Aterragem Sobre a Curta Pista
Rapidamente descemos e corremos para dentro daquele pequeno edifício desse reduzido aeroporto para fugirmos ao sol e a um calor de assar sardinhas nas palmas das mãos. Eu só tinha aquela pequena maleta e tinha programado um "cenário" muito simples: tomar um taxí que me levasse até ao hotel e, chegado lá, pedir um quarto para uma pessoa, por uma noite. Depois perguntaria se precivam dum “night-auditor”!
Como havia um pequeno autocarro que tinha inscrito sobre ele o nome do hotel, pergunto ao condutor se ele vinha buscar hóspedes para esse hotel? Ele disse que sim, que me acomodasse. Esperámos uns minutos e quando não havia mais viva alma sobre a pista , o condutor pergunta se todos os passageiros iam para o “Malkat Shvá” = “Raínha do Sabbah” e, depois dessa dúvida esclarecida, ele arranca e põe-se a caminho. Um curto caminho sobre uma estreita estrada asfaltada de não mais do que um quilómetro.
A viagem durou aí uns cinco minutos. Passámos por um pequeno Motel que se chamava “Tropicana”. Logo a sguir o meu sonhado “Malkat-Shvá”! Fomos abordados por uns dois “bellboys” para nos ajudarem com as malas. Mas eu não precisava de ajuda, precisava dum emprego para começar a sério algo que viria a ser a profissão que viria a exercer com grandes méritos quase toda a minha vida.
Eilat Here I come!
Tudo decorreu bem graças a convivialidade e voz do piloto. Já quase em Eilat ele informa que as temperaturas no exterior sobre essa língua de areia, era de 42 graus à sombra. Aconselhava os passageiros a tomarem um taxi e beberem muita água! Quando, através da suja janelinha olhei para baixo, fiquei aterrado. Sobrevoávamos Eilat e o Golfo de Akabá. Eilat era apenas meia dúzia de casas e um grande hotel que previ ser o meu “Raínha do Sabbah”! A avioneta faz uma curva muito apertada para começar a aterragem. Haviam lugares para quarenta pessoas mas nós éramos apenas uma dezena. Eu agarrei-me com unhas e dentes ao meu cinto de segurança e entreguei a alma a Deus. Pensei que aquela avioneta que nos chocalhava como um “shaker” nunca seria capaz de aterrar numa pista de cem ou duzentos metros. O pequeno avião aterrou com uma travagem tão brusca que todos os passageiros bateram com a cabeça no banco da frente. Como eu não tinha banco na frente, ia dando com a cabeça na hospedeira
O Minha Primeira Viagem Aérea
Por volta das três e meia uma avioneta aterrou e poucos minutos depois começaram a passar os poucos passageiros, pouco carregados, em busca dum táxi. Os conductores já conheciam os horários das chegadas e poucos minutos antes dessas aterragens, eles pululavam à volta do pequeno aeroporto como formigas à volta do açucar.
Fiquei parvo com o visual dos passageiros que certamente voltavam de curtas férias em Eilat. Eles e elas estavam tisnados até à medula e orgulhosamente exibiam os seus belos corpos. Os homens eram calções muito curtos, sandálias, e camisas abertas de alto abaixo, as moças eram de mini-jupe até ao pescoço e decotes até aos joelhos! Mas, para nos lembrar certas injustiças da natureza, a fechar o desfile vinha um velhote a empurrar a sua esposa numa cadeirinha de rodas.
Uns dez minutos depois - penso que o tempo de limpar um pouco os assentos – uma senhora fardada vem à sala de espera e grita:
- Passageiros para Eilat, é favor subirem!
Os quantos passageiros que esperavam o avião das quatro, compuseram-se, agarraram nos embrulhos e começaram a caminhar sobre a pista, a caminho duma pequena avioneta. Quando vi o tamanho daquela coisa, eu que tinha um medo pavoroso de voar, que era a primeira vez que eu tomava um avião ou lá o que fosse, as pernas começaram a tremer-me como varas verdes, e vontade de vomitar, de urinar, defecar. Fosse o que fosse era uma boa desculpa para não por os pés naquele cangalho. Mas vi-me obrigado a ser o último a subir aqueles três degraus para embarcar naquele cadafalso! À entrada, a mesma senhora que tinha vindo à sala de espera arrebanhar os passageiros estava lá de pé, colada ao piloto. Ela cortou rasgou uma ponta do meu bilhete e ordena:
- Senta-te onde quiseres!
Em Hebraico não há o vocemecê. Há o tu para toda a gente. Que fossem varredores de ruas ou Ministros de Primeira Apanha! Sentei-me muito perto da porta, pois que os lugares à rectaguarda tinha sido todos abarbatados, em caso de queda. Aproveitei a oportunidade para regalar os meus olhos naquele petisco de homem-macho, que era o piloto. Comecei a compreender aquele boato de que os pilotos e as hospedeiras eram de levar para a cama sem perca de tempo, sem perca de avião! Ele era, além de um homem muito sedutor, uma presença, uma voz que punha todos os clitóris e algumas vergas de pé! Era uma sensual carícia que entrava pelos ouvidos e que por algum lado teria de sair! Ele levantou voo e, através dos altifalantes, começou a conversar connosco como se fossemos todos seus primos direitos. Bem, eu primo, não era, mas direito, estava! Era realmente um encanto ouvir aquela voz e todas a inforamções que nos ia dando: que o voo era 35 minutos, a altitude, e outras coisas mais a verem com aquele meu primeiro voo. O cagaço era de deitar abaixo o Marquês de Pombal, mas tinha de levar a minha cruz ao calvário! Claro que a senhora hospedeira não serviu nenhumas bebidas ou sandes. Limitou-se a tratar das suas unhas vermelhas como cortes em carne viva.
Eilat! Cá venho eu a caminho!
Chegado a Ramat Aviv, entrei no arcaico aeroporto da Arkia, comprei uma só ida para Eilat. Mesmo assim, tive de esperar duas horas pela próxima descolagem. Não fiz disso um drama, pelo contrário, fiz disso uma grande aventura. Tomei um café no Bar e depois fui dar uma volta para ver aquele grande descampado. Pus a mão em pala e lobrigo ao longe um pequeno hotel que tinha já visto da camioneta ao longo da estrada Tel Aviv-Haifa, ali muito perto de Herzelia. Eu já tinha ouvido falar nesse hotel quando trabalhara no Hod. Curioso, apanhei um táxi. Dois ou três minutos depois fui deposto frente a esse hotel. O hotel era pequeno mas já bastante moderno para essa época. Entrei à procura dum urinol, aliviei a bexiga e tomei um sumo de toranja no Bar. Dei um salto à recepção e, Santo Deus, um dos meus condiscípulos do Tadmor estava lá a trabalhar ou a acabar o seu estágio. Ele era um rapaz que mal conhecia pois que ele não se alojara na Pnimiá, e também porque era um rapaz pouco cominicativo, de muito poucas falas. Porém, quando me topou, levantou a mão alegremente e perguntou-me “má-nishmá”? = “Que há de novo”?
Contente da vida, vou-lhe apertar a mão e pedir notícias dos seus avanços na profissão. Ele nem sequer me deu tempo de fazer qualquer pergunta! Atacou logo com a grande novidade que o hotel procurava um “night-auditor”, que fosse ver o chefe do pessoal. Disse-lhe que não estava interessado, que ia para Eilat! Eilat? Risposta-me ele. Aquilo é o fim do mundo, ninguém pode viver lá perdido no Negev, entalado entre o Egipto e a Jordânia, que só iam para lá viver os reformados! Disse-lhe que tinha muita pena, mas que já tinha comprado uma ida na Arkia, e que o avião descolaria dentro duma hora. Ele estava bastante ocupado com o telefone e hóspedes que chegavam, e pediu ao chófer do hotel que me acompanhasse ao aeroporto.
Nesse muito rudimentar aeroporto, comprei um jornal e sentei-me num banco a practicar o meu Hebraico lido, coisa então nada fácil! Mas era útil e ajudava-me a passar o tempo. Já eram quase três e meia e a avioneta descolaria às quatro em ponto. Cheguei ao mísero quiosque e pedi uma “faláfel” e um sumo de toranja e um maço de cigarros Avis, o que então fumava nessas alturas. Sentei-me num banco a comer a minha faláfel e a sorver aos golinhos o meu sumo. Isto feito, acendo mais um cigarro. Nesses tempos fumar não matava, matavam eram os anos!
Entretanto começaram a chegar outros passageiros para esse mesmo voo da Arkia para Eilat. Quase todos jovens muito barulhentos e carregados de mochilas. Certamente ansiosos de chegarem a Eilat para algumas férias. Outros, mais pacatos, pareceram-me talvez serem moradores de Eilat que voltavam a casa depois de terem tratado de alguns negócios ou feito algumas compras em Tel Aviv, pois que não vinham de mochila, mas sim carregados de sacos de plástico a rebentarem de misteriosos conteúdos, alguns bem mal cheirosos.
Adeus Tibérias - Adeus Ginton
Voltemos ao Passado e reencontremos esse jovem cheio de esperanças e projectos de Futuro! Eu tinha, então, realmente a minha vida quase toda à minha espera! Pus as pernas a caminho ao encontro dele antes que me perdesse no caminho e nunca mais lá chegasse!
Nessa manhã, em Tibérias, triste de deixar esse lugar sublime e tantos bons amigos que tinha feito, não tive outra alternativa senão avançar, ir ao encontro de outros lugares nunca explorados, outros amigos, outros amantes!
O Victor tinha-me falado do hotel “A Raínha do Sabbah” em Eilat, que, segundo ele, procuravam pessoal, pois que ninguém queria trabalhar no Deserto, longe das grandes cidades cheias de pecado e armadilhas, mas que, para certos, é melhor do que vegetar entre beduínos e cabras, perdidos entre dunas de areia sopradas pelas ventanias!
Para mim era precisamente isso que me atraía, me puxava! Eu queria conhecer outras paisagens, outros costumes, outras rotinas. Assim, saco à tiracolo, desci aquela rampa toda até ao centro de Tibérias e indaguei onde poderia eu apanhar um autocarro para Eilat. Informaram-me que tinha de ir a Haifa apanhar um autocarro lá, mas que era uma viagem muito longa e que levava pelo menos oito horas. Aconselharam-me a ir apanhar um autocarro até Ramat Aviv, pedir para descer perto do Aeroporto da Arkia, e aí apanhar uma avioneta para Eilat, que era apenas uma hora de voo. Segui o conselho e pus os pés a caminho!
Nessa manhã, em Tibérias, triste de deixar esse lugar sublime e tantos bons amigos que tinha feito, não tive outra alternativa senão avançar, ir ao encontro de outros lugares nunca explorados, outros amigos, outros amantes!
O Victor tinha-me falado do hotel “A Raínha do Sabbah” em Eilat, que, segundo ele, procuravam pessoal, pois que ninguém queria trabalhar no Deserto, longe das grandes cidades cheias de pecado e armadilhas, mas que, para certos, é melhor do que vegetar entre beduínos e cabras, perdidos entre dunas de areia sopradas pelas ventanias!
Para mim era precisamente isso que me atraía, me puxava! Eu queria conhecer outras paisagens, outros costumes, outras rotinas. Assim, saco à tiracolo, desci aquela rampa toda até ao centro de Tibérias e indaguei onde poderia eu apanhar um autocarro para Eilat. Informaram-me que tinha de ir a Haifa apanhar um autocarro lá, mas que era uma viagem muito longa e que levava pelo menos oito horas. Aconselharam-me a ir apanhar um autocarro até Ramat Aviv, pedir para descer perto do Aeroporto da Arkia, e aí apanhar uma avioneta para Eilat, que era apenas uma hora de voo. Segui o conselho e pus os pés a caminho!
TV e Seus Efeitos Secundários
Acordei em sobressalto! A primeira coisa que vi foi uma das paredes do meu quarto onde se encontra implantado um quadro horroroso que comprei um dia no Monoprix para me vingar da mediocridade de certos desprezíveis negociantes do mau gosto! Sem demora me veio ao pensamento o cabrão do vizinho debaixo que me impede de alimentar os meus dois pombinhos que vêm comer à minha varanda! Assim como todos os horrores que nos são servidos ao longo dos dias e das noites nas televisões, rádios, e periódicos, mostrando-nos um mundo apodrecido pela ganância de certas criaturas que não pensam em mais nada senão no seu próprio poder e capitalismo, e tantas outras aberrações! Como repugnantes publicidades a artigos sem qualquer utilidade, a enriquecerem ainda mais esses insaciáveis inventores! Esses doentes mentais que ainda não se aperceberam que, a despeito de todos esses seus grandes poderes e insultantes fortunas, um dia, como todos os mortais, serão enfiados num caixote, deixando tudo para trás, à sua descendência! A qual, num infernal ciclo vicioso, propagarão essas mesmas nefastas obsessões às suas próprias descendêcias! Seres abomináveis que, para eles, amor, amizade, solidariedade, e tantos outros valores humanos, deixaram há muito de existir, pela pouca rentabilidade que eles representam!
Apeteceu-me adormecer de novo e voltar ao meu quintal e juntar-me a todos aqueles que esbracejavam para me alcançarem! Mas, ao ouvir os meus pombinhos arrolharem, pedindo apenas alguns grãos de milho, levantei-me e dei-lhes comida e mudei-lhes a água. Depois fui dar com o Pat na sala a ler. Conto-lhe o meu sonho e ele diz-me que, para mim, escrever as minhas memórias se tornara numa arriscada droga intelectual.
E é verdade!
A prova é que estou já aqui agora mesmo a falar-vos deste meu excêntrico sonho, pois que pesadelo é, foi, e sempre será, a sanguinária selva que é o mundo em que se vive!
A Porta Para Além do Infinito
Ontem escrevi 5 páginas acerca dos meus três meses passados em Tibérias quando, ao escrevê-las, o meu teclado pareceu desaparecer sob aquelas azulinas águas do lago Kinéret, onde , segundo a lenda, Jesus costumava passear de vez em quando. E, estranhamente, os meus dedos pareciam mergulhadores es busca dessas pérolas chamadas teclas, que também pareciam transforem-se em rosadas teias de corais. Deitei-me tarde e imediatamente mergulhei num sono profundo. Em vez de pesadelos, para variar, um sonho muito singular se apossou de todo o meu adormecido ser.
Nesse meu sonho vi um grande amigo dos tempos de Israel - o Preizach - dar-me as chaves duma casa em Jerusalem, Essa casa era minúscula. Só havia uma pequena sala e dois quartos. Digo-lhe que a casa era demasiado pequena, que não havia espaço que chegasse para abritar todos os meus sonhos e anseios. Ele aponta-me uma porta e diz-me que era a porta que dava para o quintal. Pede-me para abrir essa porta, pois que no meu quintal haviam os cinco continentes, o mundo inteiro à minha espera! Abri essa porta e o quintal era imenso! Estavam lá a crescer o meu loureiro e a pequena árvore que um criado de mesa, em Santorini, que se apaixonara por mim, me dera quando parti, como recordação dele. Pediu-me para a trazer comigo para Paris, plantá-la no meu jardim e, assim, ela poderia crescer perto de mim, e cada vez que eu olhasse para ela, eu pensaria nele! Curiosamente, ele estava realmente apaixonado por mim e nunca dei por isso. Só no dia da despedida é que ele me propos aquele pequeno abeto, escondendo nervosamente as suas lágrimas! Ambas essas árvores pareciam querer trespassar o céu! Havia um pequeno muro que separava o meu quintal do resto do mundo. Abri essa cancela e depara-se-me uma imensa esplanada que circundava o horizonte. Sentados nessa imensurável espaço, perdidos entre a regorgitante multidão, acenando-me, desejando-me as boas vindas, estavam lá todos aqueles que tanto amei, e que tinha perdido ao longo dos anos que também me vão matando. Eu não queria acreditar! Eles estavam lá todos à minha espera e eu procurava abarcá-los tods num só abraço! Mas os meus braços trespaçavam-nos sem os tocar! E eles, os meus pais e todos os meus rmãos, continuavam a acenar-me! Além deles estavam lá também, muito agitados, a estenderem-me os braços, a Amália Rodrigues, a Florbela Espanca, o Fernando Pessoa, a Golda Meir, o Ben Gurion, a Carmen Dolores, o Rogério Paulo, a Miriam, o Miki, a Hella, a Orit, e tantos outros mais. Quem seriam eles todos? Que queriam eles de mim para assim continuamente esbracejarem na minha direcção sem conseguirem alcançar-me?
mercredi 23 septembre 2009
Say One For Me
As minhas relações com o Victor mantiveram-se muito profissonais e amigáveis. Ele andava amantisado com a “housekeeper”, a Eva, que tinha feito o seu curso no Tadmor comigo. Daí nasceu uma grande amizade a três.
Com a Judy Harriet também nasceu uma grande amizade. Ela partilhava com a mãe um quarto no hotel. A sua mãe estava todas as noites no show para guardar a sua filha. Ela cantava-lhe todas as noites aquela bonita cantiga Judaica “Meine Ydish Mama”. Ela era judia e andava louca para ir para a cama com o Victor e o Victor vice versa, mas ela era uma daquelas jovens judias que para ir para a cama com um homem tinha primeiro de se casar com ele! Um Judeu, se faz favor! A Judy não podia ir a lado nenhum sem a sua dama de companhia. Apenas uma vez fui com ela ao cinema ao lado do hotel ver um filme - Say One For Me - com o Bing Crosby, onde ela tinha um pequeno papel e cantava uma cantiga. A Mama consentiu, pois toda a gente sabia ali nas redondezas que comigo ela não corria nenhum risco! Engano atroz! Muita vez tive vontade de a apertar contra mim e beijar aquela boca que, aparentemente, só lhe servia para sorrir e ingerir alimentos. Com a Judy eu estava à vontade e podia discutir com ela os atrativos do belo Victor. Eu falava-lhe das coisas que eu gostaria de fazer com ele, mas ela nunca me deixava penetrá-lo. Eu, no gozo, costumava perguntar-lhe porque não? Se ele gostasse de se fazer penetrar eu poderia satisfazer-lhe esse desejo, mas ela nunca! Aí a conversa ficava estragada! Sobretudo quando eu lhe dizia que eu podia penetrar uma mulher e um homem e que ela não podia penetrar ninguém! Isso dava-lhe um certo complexo de inferioridade. Mas a nossa amizade manteve-se até o meu estágio chegar a fim!
Quando o estágio terminou, o Victor falou-me dum hotel que tinha aberto em Eilat, ao sul do Negev, sobre o Golfo de Akabá, o “A Raínha do Sabah”. Ele aconselhou-me a dar lá um salto quando deixasse o Ginton. Quando essa data chegou, depois dum grande jantar de despedida na sala de jantar dos hóspedes com a malta toda e os hóspedes à mistura, muitos adeus, muitas palmadas nas costas e por outros sítios, lá peguei na minha trouxa, um autocarro para Eilat, e lá fui à descoberta doutras paragens, outras caras, outros Victors, outras Judies, outras maneiras de continuar vivo e feliz de o ser e de o estar!
A vida aguardava-me ainda tantas, tantas outras inesperadas aventuras...
O Palheiro das Noites Escondidas
Ganhei bastante prática profissional no Ginton, assim como arrecadado grandes memórias a reter para o resto dos meus dias. Como neste momento, escrevendo-as! Mal vejo o teclado. O azul do céu misturando-se com o azul safira do lago, o beije das montanhas, os odores, o silêncio daquelas noites luarentas e estreladas, ofuscam-me a visão. Procuro desesperadamente as teclas sobre as quais tenho de matracar para por sobre o papel todas estas grandes emoções, esta grande saudade tão semelhantes às saudades da minha meninice sob o céu azul de Portugal!
Como nunca ousei tentar seduzir o Dov, bastaram-me alguns duches juntos e ensaboadelas de certas partes do corpo que incham facilmente. A solução foi encontrada no palheiro que havia no quintal dos pais do Yossy, o ondulante criado de mesa da esplanada à beira do Mar da Galileia. O Yossy dava-se todo, mas era totalmente passivo e isso tornava dum certo modo as noites um tanto fastidiosas. Um corpo que pede, também gosta de dar! Havia sempre aquele receio constante de sermos surpendidos pelos pais dele que travava um pouco a ânsia de gritar bem alto os frouxos grunhidos de dois corpos que queriam rasgar o horizonte dos desejos incontroláveis!
Além do Yossy, para quebrar dias rotineiros, as visitas ao meio da noite, no hotel, eram muito regulares. Quando recebia novos hóspedes logo o meu faro me dizia quais os peixes que eram bons para a minha rede ou para serem atirados ao mar! De vez em quando, uma subidinha a um quarto “single” a guiar os passos de algum sonâmbulo, vinham fazer transbordar a minha taça. Depois o deslumbramento do corpo do Dov que se dava todo aos meus olhos e, talvez - se eu tivesse tentado - também ao resto do meu corpo todo! A minha sexualidade foi, durante esses três meses, bastante equilibrada. Muito mais equilibrada do que aquela dum senhor reformado que, apressadamente, escreve agora as suas memórias antes que elas lhe fujam para longe demmais!
Orquesta Filarmónica de Israel
Um dia tive a surpresa de deixar o meu quarto no hotel para ir partilhar o pequeno apartamento face à Kinérete, onde habitava o Dov Shabbat. Tive, por um lado, pena de perder a minha independência mas, por outro lado, agradou-me a ideia de ir dormir no mesmo quarto que o belo Dov! O apartamento era mais um estúdio que outra coisa. Havia só um quarto e casa de banho, um pequeno hall de entrada, uma pequena kitchinette, e uma casa de banho. Tudo era minúsculo. A única coisa grandiosa que a casa tinha - além do pénis do Dov - era a larga janela do hall de entrada que dava sobre as eternas águas de safira da Kinérete. Do outro lado do lago havia um pequeno Kibbutz já a cavalo na Jordânia. Íamos lá muita vez quando davam lá grandes espectáculos ao ar livre, nas margens desse bíblico lago, como grupos folclóricos, ballets e, uma vez, um grandioso Concerto pela Orquestra Filarmónica de Israel.
Aquela assombrosa mistura de sons: os violinos, os grilos ralos, o som das águas tranquilas, a brisa nos folhedos, a respiração do vizinho sentado ao lado...
Êxtase! Sublimidade! Assombro! Eternidade!
Tibérias - a - Bela Adormecida ...
A rotina instalou-se: uma semana eu trabalhava de manhã, outra semana da parte da tarde, e outra semana de noite. Eu apreciava estas mudanças de horários pois que isso me dava oportunidades de gozar manhãs livre, assim como também tardes livres. O trabalho de noite era mais árduo, mas também cheio de pequenas surpresas agradáveis. Antes de mais nada era preciso encontrar a prova dos nove a todas as contas dos hóspedes, e outros detalhes difíceis de explicar. Uma coisa era certa: a partir do momento que o nosso trabalho estava terminado e resolvido, tínhamos o resto da noite para dormitar ou, como algumas vezes, no meu caso, ir aconchegar um hóspede com problemas de insónias. Coisa que era totalmente contra os regulamentos, mas a pessoa que fazia as noites era um senhor reformado que era realmente um homem que não tinha ideias estreitas e que compreendia e aceitava naturalmente certos desvios da natureza humana, e me dizia que a vida era curta e devia ser bem aproveitada!
Quando eu desaparecia por uma hora ou duas, quando voltava ele perguntava sempre:
- Valeu a pena?
Claro que ele nunca ouviu falar do Fernando Pessoa, mas eu costumava sempre responder-lhe - no gozo:
- “Tudo vale a pena quando a pichota não é pequena”!
Judy Waiting For Joe
Depois do jantar ele levou-me ao Night-Club do hotel, onde actuavam dois artistas americanos, a Judy Harriet, que vinha directamente de Hollywood, e um cantor mulato que se chamava Dov Shabbat. Além da pista de dança cercada de mesas e cadeiras onde os clientes se sentavam para um jantar ou tomar bebidas enquanto desfrutavam o espectáculo, havia também uma sala onde havia uma pequena roleta. Ele sugeriu que eu ficasse para o “show”, mas que ele se ia deitar, que estava esgotado e que, esse show ele já o tinha visto uma pancada de vezes. Que não ficasse até muito tarde pois que eu seria acordado às seis da manhã para tomar o meu pequeno-almoço, e depois ir fazer com ele o turno da manhã, para ele me mostrar como se passavam as coisas. Que eu trabalharia sempre com ele, uma semana de manhã, uma semana da parte da tarde e, eventualmente, fazer algumas noites com o responsável das contas correntes. Que a minha chave devia estar sempre na recepção e não no meu bolso, pois que tinha atracada a ela um bola de chumbo que pesava cem gramas! Disse boa noite e voltou-me as costas. Costados, diria eu! Ele era alto e belo como uma estátua esculpida por Miguel Ângelo com uma cara pintada pelo Diego Velázquez.
Não resisti à tentação e fiquei até ver parte do show. Primeiro actuou o Dov Shabbat, um bonito mulatinho que tinha uma boa voz, sabia cantar, mas que não tinha repertório próprio. Ele mexia-se bem e dava nas vistas. Parecia agradar mais aos clientes masculinos do que aos femininos. Compreendi porquê! Ele era muito sensual mas era dono duns requebres de odalisca. Depois foi a vez da Judy Harriet actuar. Ela foi, para mim, uma revelação! Era, antes de mais nada, uma beleza daquelas que Hollywood nos habituara a consumir, tinha uma voz soberba, cantava divinamente, e tinha repertório seu. Uma cantiga que ela cantou que me ficou no ouvido foi “Waiting for Joe”! Mais tarde ela me ofereciria um exemplar desse seu disco que ainda conservo. Por volta das duas da manhã fui deitar-me e mergulhei no sono como um prego deitado às águas da Kinérete!
Poente Sobre as Calmas Montanhas
Para estar a tempo e horas para o jantar, comecei a subir a pé aquela interminável rampa, pois que esperar pelo próximo autocarro teria de aguentar uns vinte minutos. Vagarosamente fui trepando aquele íngreme declive deleitando-me com aquele suave por-de-sol que emprestava às montanhas em redor, aquela efémera auréola alaranjada a empastar toda a paisagem de tons violáceos. Era talvez esse o meu melhor aperitivo antes de, pela primeira vez, jantar com o Victor, e os demais que ainda nem sequer conhecia.
O jantar decorreu bem. O menu era muito idêntico ao que se comia no Kibbutz. Victor explicou-me que normalmente comia no restaurante dos hóspedes mas que, para me apresentar os outros meus colegas, jantava connosco na cantina essa noite. Havia uma amálgama de bocas que mastigavam e falavam ao mesmo tempo que, sorrateiramente, espiavam o novo vindouro. Victor aproveitou o tempo para me por ao corrente do que era o trabalho no Ginton. Que o hotel tinha duzentos quartos. Uns com cama de casal, outros com duas camas, e ainda outros com três camas. Que o trabalho era fácil, mas que era de importância capital saber receber e alojar os grupos, aqueles autocarros de turismo que normalmente despejavam quarenta pessoas à porta do hotel, estafadas, mortas por tomar um banho antes de descerem para jantar. Que o mais importante era fazer o “rooming-list”, dar a cada um o quarto que eles, antes de conhecerem o hotel, tenham talvez imaginado.
O Centro dessa Cidade Tranquila
Desci aquela grande rampa até ao centro da cidade e deitei uma vista de olhos por tudo o que aquela cidade me tinha a propor, além da sua indescritível beleza. Como meu velho hábito, procurei onde se encontravam as lojas de que viria a precisar para essa minha curta estadia de três meses, sem esquecer onde poderia ir tomar um café de vez em quando. Ao lado do hotel havia um pequeno Café sem grande importância, ao lado do pequeno Cinema local mas, lá em baixo, no centro da cidade, a espelhar-se nessas então límpidas azulíneas águas, havia uma grande esplanada a regurgitar de gente. Sentei-me a uma mesa mesmo ao lado do pequeno muro que nos separava das águas tranquilas da Kinérete, o nome que deram a esse lago onde, parece, Jesus ia de vez em quando dar um pequeno passeio. Eu estava absolutamente extasiado com tanta beleza! Isso não me impediu de me aperceber que o jovem criado de mesa que me trouxe meu “café-afuch” (meia de leite), deslizava entre as mesas como um dançarino sobre um palco. Ele fazia-me olhinhos sempre que passava perto da minha mesa. Quando paguei disse-lhe que me chamava Ruben, e que ia fazer um estágio de três meses no Ginton. Ele, com um grande sorriso, diz-me que era o melhor hotel lá do sítio, que ia lá às vezes aos espectáculos no Dancing-Bar desse hotel, que era o único sítio onde os jovens gostavam de se encontrar e dar um pouco ao pézinho. Arrematou dizendo-me que se chamava Yossy, e que “estava sempre às minhas ordens”...
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