samedi 19 décembre 2009

A Mudança Para Shlomo Hamelech







No meu Mil e Uma Noites as minhas noites eram um afago. A Frishman Street era um sossego e, a partir da meia-noite, nem um carro passava. Apenas, raramente, uma pequena mota que ao passar derrubava a amena calmaria nocturna. Porém, descendentes desse progresso tecnológico, inventaram pequenos carros descapotáveis para os jovens, para enriquecer os seus próprios inventores. A promoção foi de tal modo intensa que, rapidamente as ruas começaram a ser infestadas por esses besouros que nos põem a cabeça em estilhaços. Todas as noites, capota aberta e o rádio altíssimo, aguardavam ali na esquina que dava para a Yarkon Street, que os semáforos voltassem ao verde. Com toda essa barulhada e algazarra, eu não conseguia conciliar o sono! Ainda por cima, na cave do prédio, abriram um “Night Club”. A música era tocada tão alta que ressoava por todo o edifício até às cinco da manhã! Todos os inquilinos se queixaram ao Dan, o senhorio, mas ele não se comoveu com qualquer dessas queixas, pois que esse Clube era igualmente um dos seus negócios, e esse negócio dava-lhe muito mais lucros do que todos os estudios espalhados por esses seus quatro andares!

Fui falar com o Dan. Ele, para resolver o meu problema, transferiu-me para um outro apartamento num outro prédio que eles tinham mais acima, na Shlomo Hamelech, onde ele próprio habitava. Esse apartamento era ocupado por uma velha senhora e seu filho. O meu quarto tinha uma larga janela que dava para as traseiras. Fiz a mudança sozinho, rua abaixo rua acima, com as minhas malas e os meus haveres, a pouco e pouco, e o meu gato foi o último a ser transportado dentro duma fronha de almofada. Claro que deixei as minhas Mil e Uma Noites pintado com as cores de Eilat e, sobretudo, a minha bela cozinha lá naquele precioso cantinho, assim como a minha varanda que dava para o mar! Da Frishman Street até à Shlomo Hamelech Street eram apenas alguns quarteirões, um dos quais a Dizengoff!

Nesse edifício da Shlomo Hamelech, havia, mesmo por baixo do meu quarto, um pequeno comércio pertencendo a um casal de certa idade, muito pituresco, onde eu fazia todas as minhas compras de comestíveis. Mesmo ao lado, na esquina com a Frishman Street, havia igualmente uma belíssima esplanada onde eu frequentemente ia tomar o meu pequeno almoço e alguns bons Espressos durante o dia. Era um prazer enorme sentar-me ali nessa esplanada a saborear a minha fresca cervejinha e a ver passar pessoas apressadas de chegarem, sabia Deus aonde! Era muito perto do Kikar Ha’Mediná onde, anos mais tarde, Itzchak Rabin seria assassinado. Nesse largo haviam muitos comércios e Cafés, e era sempre um grande prazer deambular por lá! Foi lá, num desses pequenos quiosques que viria a conhecer o Omar, que viria a ser o pneu suplementar da minha carripana carregada de efémeros amores. Nunca o partilhei com o Augusto, pois que o Omar, casado e pai de dois filhos, era duma beleza tal que receei perder ambos. Que eles engraçassem um com o outro e me pusessem de parte. Assim eu ficava com dois pneus suplementares em vez de apenas um volante e dois pedais!

De novo, com os meus pincéis e algumas tintas, novamente procurei fazer daquele quarto o meu refúgio. Fiz mais alguns pequenos móveis e pus alguns cartazes na parede e, de novo, eu tinha um lar, reduzido a um pequeno quarto, ali na tranquilidade daquela rua. O único drama que se passou nesse quarto foi - como em Eilat e a Pusky - o meu gato, aquele bébézinho que encontrara vasculhando os caixotes de lixo da Yarkon, que o trouxe para casa e fiz dele um muito amimado gatinho todo branco com manchas amarelas. Ele, nas primeiras noites, como se sentiu fora do seu território, como a minha cama estava colada à parede onde havia a larga janela sempre aberta para deixar entrar a brisa, ele utilizava a minha cama como trampolim para saltar par o parapeito da janela, talvez com ganas de voltar para a rua, porque não eram ali os seus aposentos das Mil e Uma Noites. Tantas vezes me acordou que, exasperado, o empurrei da janela abaixo. Como era apenas um primeiro andar, pensei que ele teria sobrevivido. Desci ao páteo em baixo à sua procura, mas nenhuns vestígios dele! No outro dia de manhã pus a sua tijela de água e o pratinho da sua comida lá em baixo no patamar do rés-de-chão, na esperança que ele voltasse e reconhecesse a sua casa de jantar. Um tremendo remorso se instalou na minha alma torturada. Imaginava-o morto de fome por essas ruas de Tel Aviv em busca de mim! Pedi a uma vizinha da frente que ficasse atenta à minha porta de escada onde tinha instalado a casa de jantar do meu gato mas ela, um dia, veio contar-me que o meu gato tinha sido atropelado e que alguém o tinha deitado ao lixo! Ainda hoje, como se pode ver, o não esqueci, e o meu remorso sempre crescendo, como uma planta maligna a envenenar-me a vida!

O meu trabalho no Hilton era a minha grande compensação de tantos dissabores. Outra grande conpensação era visitar a velhinha que morava no outro quarto frente ao meu. Ela tinha um filho que trabalhava e só à noitinha o via. Ela adorava a minha companhia quando dava um salto ao seu quarto e me sentava a escutar as suas histórias da Shoa e esse indigno sofrimento. Ela tinha escapado ao forno graças à liberação desses horríveis campos de morte! Eu acarinhava-a, fazia-lhe algumas compras e, sobretudo, fazia-lhe companhia. Só que eu também trabalhava e tinha muitas inopinadas visitas do Augusto e do Omar. O seu filho que, era óbvio, era homosexual, não dispensava as devidas atenções à sua mãe, ali isolada, apenas acompanhada pelas suas tristes recordações do seu dramático passado, preferia escutar à minha porta quando eu estava ocupado a por as contas em dia com o Augusto ou o Omar. Um dia perguntou-me como era que eu fazia para ter tais bonitos amigos que vinham para a cama comigo todas as noites, e ele não! Respondi-lhe que era tudo uma questão de rotina, para não lhe dizer muito simplesmente que ele era demasiado feio para conquistar criaturas tão belas como o Augusto e o Omar!

Aucun commentaire:

Enregistrer un commentaire