vendredi 8 janvier 2010

Rue Dr. Paul Laurens, 5 - 2°- Esq.







O apartamento transformou-se num belo ninho de amor, tranquilidade, e flores. Mas o facto da cidade se chamar Villejuif (Jewish Town) preocupou-me desmesuradamente. Eu que andava perseguido pelo meu ser ou não ser Judeu, dúvida essa que já me tinha transtornado a vida duma maneira atroz e singular, receei a continuação dessa maldição! Parecia-me que eu não conseguia fugir a essa terrível praga! Mesmo assim continuava a fazer projectos de futuro e tentar esquecer essa abominável injustiça humana. Deixei de tentar compreender as razões pelas quais as pessoas se diferenciavam uma das outras. Saber-me ser feito de carne e osso como todos os demais me bastou para saber que um dia deixaríamos este mundo e que esse sacramental absurdo enfim deixaria de me tolher os passos. Pela simples razão que seria a justiça divina que o faria por nós todos, fosse qual fosse a lavagem ao cérebro que os nossos pais nos tivessem impingido! A educação que recebera de minha mãe continuaria a ser sempre a minha religião: Respeitar e ajudar os nossos vizinhos! Penso que existe apenas um só Deus, o Deus de toda a gente, seja lá ela a língua com a qual lhe falamos, pois que Deus é poliglota! Segundo a Bíblia, foi ele quem tudo Criou! Nós somos todos irmãos! Dêmo-nos as mão e vivamos todos juntos em Paz! Abaixo as guerras que enriquecem os fabricantes, e vendedores dessas desprezíveis armas e munições inventadas para tudo destruir, arrasar, ficando apenas de pé essas escandalosas fortunas que se escondem por todos esses paraísos fiscais espalhados pelo mundo!

Como era de prever, tive de voltar aos meus velhos clientes da avenida de Versalhes todas as manhãs para fazer umas patacas para fazer avançar o barco nas suas turvas águas de renegado pelos outros. A minha única alternativa para tentar sair dessas águas antes que me afogasse, foi agarrar-me ao R.C.P. como tábua de salvação. Uma tarde, antes de fazer as minhas compras nesse grande Centro Comercial onde essa rádio estava modestamente instalada, fui dizer olá ao Carlos Duarte para ver se haviam algumas possibilidades de eu começar a fazer o que mais gostaria de fazer na vida: Rádio!

Carlos Duarte propôs-me - antes de mais nada - aprender a fazer a técnica. Aconselhou-me a estar lá todas as tardes para ele me ensinar como fazer funcionar todos aqueles botõezinhos com os quais a rádio vai para o ar. Comecei logo na tarde seguinte. Toda a aparelhagem em serviço era bastante elementar. Levou-me apenas umas duas horas a saber como manipular todos aqueles elementos, para que a R.C.P. entrasse pela casa adentro de todos os portugueses que conseguiam captar essa estação. Eram apenas os dois gira-discos, um microfone, todos aqueles botões, e os discos empinados naquelas rústicas prateleiras por detrás de nós, para fazer rádio. O resto seria tudo a criatividade das pessoas que se sentariam naquela alta cadeira frente ao microfone. Havia também o telefone, mas isso interessava-me menos. Eu queria entrar em casa dos outros, mas que as casas dos outros entrassem na antena, era-me muito menos aprazível.

Como já muito bem esperava, haviam lá elementos a que se chama muito vulgarmente "animadores", que o seu intuito não era fazer rádio, era que a rádio os "fizesse"! O que não era exactamente o meu caso. Eu estava demasiado desfeito para que uma rádio me refizesse! O que eu realmente queria era fazer companhia aos ouvintes com as pequenas histórias que eu lhes contava, e fazê-los escutar boa música portuguesa e iniciá-los noutras músicas que nos vinham de todos os cantos do mundo. A nossa discoteca era bastante pobre, e eu comecei a trazer de casa alguns discos meus para compartilhar com todos aqueles que estariam à nossa escuta!

Muito rapidamente Carlos Duarte me propôs fazer as duas horas do programa da manhã que ele preenchia. Penso que para ficar mais um pouco na cama todas as manhãs. Foi o meu primeiro trabalho como animador que me foi cofiado. Tive de começar a fazer a minha limpeza ao domicílio na parte da tarde. Em outras palavras, tive de mudar de "freguesa" ! Mas foi um gozo monumental levantar-me todos os dias às seis da manhã para estar a postos perante o meu microfone às sete da manhã em ponto!

A primeiríssima vez que me vi sozinho sem a ajuda de ninguém frente a todos aqueles botões, a manipular dois discos e encontrar a faixa que queria enviar, foi um tormento. Os meus dedos pareciam tão amedrontados como o estava eu ! Vi-me reflectido na vidraça que separava a cabine do estúdio em frente e disse a mim mesmo: Querias fazer rádio? Avança! Abre o micro e diz bom dia aos ouvintes e lança uma das faixas dum dos dois discos! Abri o micro e disse: "Bom dia a todos! Estão à escuta da Rádio Clube Português! São sete e cinco da manhã! Levantem-se! São horas de começar ou continuar o vosso dia"! E lancei uma faixa dum dos discos! A mais alegre!

Enquanto a primeira faixa girava, preparei a outra faixa do outro disco. Como tinha ouvido dizer que eu só era bom para dizer poesia, decidi mostrar a outra face da minha personalidade: Completamente desvairado! Continuei a passar música alegre e a motivar os ouvintes a começarem o seu dia de boa disposição. Carlos Duarte chegou uns dez minutos antes das nove para pegar na antena. Disse-me bom dia e - olhos postos no chão - que eu me tinha desenrascado muito bem.

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