jeudi 21 janvier 2010

Vai ter com ele meu amor
















Rita não tardou! Alguns dias depois fomos buscá-la a Roissy. Ele surgiu-nos muito pálida, magríssima, no seu rosto um pequeno sorriso tentava romper. Os seus olhos lágrimas tentavam reter. Trazia apenas um pequeno saco, pequeno demais para acomodar a sua tão grande dor. Essa dor que ela ocultava no mais profundo da sua alma em pedaços! O Pat pegou no seu ligeiro saco e ela caiu-me nos braços. Não trocámos uma única palavra. Apenas, como ela tinha previsto, as nossas lágrimas misturaram-se silenciosamente. Descemos e entrámos no carro. Pedi-lhe para se sentar à frente, ao lado do condutor, para melhor rever a França, rever Paris! Aí a sua boca entreabriu-se para dar à luz a sua primeira frase :

-Sem o nosso Tété Paris não é Paris! Apenas uma cidade como tantas outras!

Chegados a casa ela sentou-se uns momentos sobre o canapé que se abria em cama de casal onde ela, no passado, tinha dormido nos braços do nosso tão querido Tété. Oferecemos-lhe um café mas ela recusou. Que já tinha tomado vários no avião que a trouxera do México. Os seus olhos visitaram todas as paredes da sala. Não sei se para matar saudades de todos os quadros que a enfeitavam, se para as noites que ela ali dormira compartilhando a mesma almofada com esse alguém que ambos tanto amámos! Depois suspirou e pediu para se repousar um pouco, que a viagem tinha sido muito longa e fatigante. Apontámos-lhe o caminho para o nosso estúdio, onde o seu divã já estava aberto à sua espera. O divã era certamente suficientemente espaçoso para a magreza do seu fragilizado corpo, mas diminuto demais para essa gigantesca dor que ela carregava dentro de si. Ela empurrou com um pé o seu saco para um canto e depois pediu licença para fechar a porta, que estava muito cansada, que se ia repousar um pouco. Vagarosamente cerrou a porta, oferecendo-nos um envergonhado até logo. Momentos depois ouvimo-la soluçar sufocadamente. Deixei-a chorar sozinha até que ela talvez tivesse adormecido ou afogado nas suas próprias lágrimas. Uma coisa ela nunca virá a saber: Nesse momento as nossas lágrimas não se misturaram como no aeroporto. Desta vez ela soluçava no estúdio à porta fechada, eu soluçava a um canto da sala para que ela se não apercebesse. Ambos tínhamos perdido alguém que muito amámos, mas agora teríamos de aprender a viver sem esse grande amor que fora o maior amor das nossas vidas!

Embaraçados, nem um nem outro ousávamos tocar no assunto que tanto nos afligia. Ela apenas com os seus lindos olhos verdes me enviava de vez em quando um apelo à quebra do silêncio onde nos enclausurávamos, mas eu temia corresponder a essa súplica temendo carregar ainda mais o seu luto. Passávamos o tempo juntos como se nada de realmente esmagador nos tivesse acontecido. Para fugir a essa tão embaraçosa situação e ao mesmo tempo tentar devolvê-la à roda da vida, como ela tinha trazido pouca roupa, e como sabia quanto ela gostava de andar de armazém em armazém em busca de coisas bonitas para vestir, comecei a levá-la a todos esses grandes armazéns ali nas redondezas. Aí ela recuperou um pouco o seu radioso sorriso de outros tempos. Uma vez comprou um par de sapatos e, como ela sugeriu, para os bater, fomos a pé de Kremlin-Bicêtre até Villejuif. Ela chegou a casa com os pés cheios de bolhas e três dias não pôde calçar sapatos alguns e passou esses dias em casa a ler ou a ver televisão. Claro que eu queria quebrar aquele gelo que nos impedia de falar do nosso Tété. Enfaticamente atirei-lhe à queima-roupa:

- Rita! Diz-me como tudo se passou com o Zé! Preciso de saber para poder fazer o meu luto!

Ela baixou os olhos e pediu-me humildemente:

- Ainda não, Rogério! Aguarda! Está tudo ainda tão fresco!

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