lundi 30 novembre 2009
Paris Sob a Neve
Era Dezembro. Fazia um frio de rachar e eu não tinha aquecimento no meu quarto. Deus tinha-me providenciado a mais sublime de todas as braseiras: Heinz passou a dormir todas as noites comigo para me aquecer e para que eu o aquecesse. De manhã tomávamos o nosso pequeno almoço e depois íamos quase de mãos dadas até ao Metro Jasmin apanhar o nosso combóio. Ambos descíamos em Havre Caumartin. Eu apanhava a Rue Scribe para a Swan e ele, para o seu jornal, o Boulevard Haussmann.
Na boutique fazia menos frio porque tínhamos o aquecimento central do prédio todo. Durante muito tempo deixei de me exibir à porta, pois que, por um lado eu tinha agora o Heinz que me descongelava e, por outro lado, porque a neve cobria Paris toda de branco e me coagulava o sangue nas veias. Moshé aquecia-se no primeiro andar com as suas contas correntes e eu, em baixo, aquecia-me a ler os anúncios dos jornais em busca duma saída da butique e começar uma nova vida longe do Moshé.
Numa dessas gélidas manhãs escrevi uma carta ao Pat a quixar-me da neve e do frio, e que não tinha aquecimento na minha água furtada. Claro que não mencionei a presença do meu alemão para me aquecer o corpo e a alma. Na butique, os únicos momentos humanizados que tinha eram as visitas do Melo e do porteiro do Hotel Scribe a pedir-me um cigarro para ter a certeza que eu os tinha. Outros momentos agradáveis, quando tinha dinheiro, eram as minhas idas ao Self-Service almoçar. Aí comecei a ter boas relações com o pessoal e a fazer novos conhecimentos com certos clientes que faziam questão de comer à mesma mesa que eu. Por outro lado, na butique, encantava-me estar de pé por detrás da porta a ver a neve cair e as pessoas todas encapuchadas, cabeça baixa, mãos nos bolsos, a fugirem aos etéreos flocos na sua efémera brancura .
Um certo fim de semana sou bafejado pela visita do Pat e do Peter que me vieram trazer um pedaço do nosso apartamento na Ainger Road. Tratava-se do pequeno aquecedor a petróleo que tínhamos no hall para aquecer a casa toda. Como Pat se fazia abençoar pelo aquecedor a gaz que havia na lareira da sala, teve a doce e brilhante idéia de me trazer o nosso aquecedor a petróleo que se aprumava apagado e silencioso no seu reduzido canto sem qualquer uso. Para mim foi uma grande alegria ter a visita deles, mas a visita do aquecedor ainda foi muito mais bem-vinda! Depois duma rápida troca de beijos, a primeira preocupação foi descer e ir a correr à drogaria comprar uma botija de petróleo para por o meu aquecedor a abrigar-me com a sua divina azulada chamazinha. Nesse fim de semana fui mostrar ao Pat e ao Peter o pouco que eu conhecia de Paris, os três sob o mesmo chapéu de chuva que milagrosamente se transformava em chapéu de neve. Cada vez que entrávamos num Café para tomar um bebida bem quente, tínhamos que o fechar e sacudi-lo à porta, antes de entrar, a libertá-lo da brancura imaculada desses interruptos flocos caindo mansamente das cinzas dum céu dum cinzento assustador. Foram apenas duas noites que tive aquele grande prazer de ter a companhia do Pat e do Peter. Pusémos o colchão do meu divã no chão e, eu e o Pat dormimos na cama, e o Peter no colchão no chão. Nessas duas noites não sei com quem nem onde dormiu o meu Heinz com o seu morno corpo de róseo veludo!
Os dias foram passando sob aquele manto de neve. Graças ao Pat eu tinha o meu aquecedor e o Heinz para me libertarem um pouco dos horrores que o frio sempre me causaram. Heinz continuou a subir todas as noites para jantarmos e, depois dum filme na televisão, irmos para a cama fazer amor antes de nos entregarmos a um sono profundo. O aquecedor também ia dormir, pois que receávamos deixá-lo a carborar a noite toda. De resto, durante a noite, eu era o aquecedor do Heinz e ele o meu. Tudo isto tinha começado a entrar numa muito agradável rotina, mas sem grandes novidades. O Moshé continuava a proteger-se por detrás daquele alto muro que ele construira à volta da sua pessoa, para não ser incomodado pelos problemas dos outros. Heinz entretanto foi transferido para a Suissa e propos-me eu apanhar o seu estúdio ali no seu rés-de-chã, dizendo-me que lá em baixo fazia menos frio e que me via livre das penosas escadas de caracol até ao meu sexto andar. Mas a renda era de 500 francos e eu não tinha meios para tal promoção do conforto. Continuei na minha água furtada à espera de melhor emprego e melhores dias. Longe do Moshé!
Esses enregelados dias em Paris foram-se arrastando e o Natal aproximava-se. O porta-moedas a definhar e o Moshé a engordar. Cada vez que lhe pedia pagamento dos meus 1.200 francos que ele me devia ele fechava-se em copas, alegando que não era culpa sua se eu não sabia fazer render o meu excelente ordenado. O Moshé virava-me as costas e o meu aquecedor também! Um dia tentei acendê-lo mas ele, talvez morto de frio, recusou-se! Tudo o que tentei nada resultou. Enraivecido, abro a minha janela e lá foi ele pelos ares. Espero que não tenha aterrado sobre ninguém! Nos momentos de cólera não consigo dominar-me e pensar duas vezes antes explodir!
O Melo e a Rita tinham-me convidado a jantar com eles nessa noite de Natal, mas como eu não tinha dinheiro para comprar prendas para todos os três, esquivei-me, alegando que já tinha aceite um outro convite com os amigos de Boulogne Billancourt. Comecei a entrar numa depressão que me comia por dentro e por fora! O Heinz tinha partido, o Pat estava em Londres com o seu Peter, o Moshé com a sua mulher e filho, e eu comigo só, sem dinheiro nem aquecedor, e sem vontade de viver! Eu não tinha sequer dinheiro para comer, festejar o meu Natal e, sobretudo, eu não tinha um cigarro nem dinheiro para os comprar! Nesse momento percebi que o mundo era apenas um aquário onde os tubarões se alimentavam do peixe miúdo, e que o peixe miúdo estava condenado a ser devorado sem poder fugir às redes e carnívoros dentes bem aguçados!
Num dos meus muito característicos arremessos de raiva, abri a janela e empoleirei-me no telhado. Olhei lá para baixo e vi apenas uma rua sem viva alma, toda coberta de neve, como se apenas eu existisse sobre a terra. Essa terra inóspita que parecia insensível à minha solidão e desespero. Os meus pés escorregaram ligeiramente sobre o gelo que se tinha criado sobre as telhas e, para não cair, agarrei-me ao parapeito da janela. Nesse momento, ao agarrar-me ao parapeito, comreendi que bem no fundo eu não queria morrer, ir ter com o meu querido Alberto. Eu queria viver para o Pat, para o meu futuro, para pagar a minha promessa de viver os anos e as alegrias e tristezas que ao Alberto tinham sido recusado, e saltei! Não lá para baixo, mas sim lá para dentro! Enquanto sobre o telhado, falei com Deus e ele pareceu dizer-me que não saltasse, que continuasse a viver o meu destino, que a vida ainda tinha muito que me dar, além desse dificel momento que eu estava a passar! Obedecendo à voz de Deus, vesti o meu sobretudo que tinha um grande capuz e desci as minhas escadas a correr! Eu queia chegar lá fora, pisar a neve, tentar a minha sorte para sobreviver e pagar a minha sagrada promessa ao Alberto. Mal pus os pés sobre essa espessa neve cobrindo literalmente toda a rua René Basin, baixei-me para acariciar a neve, sentir a sua gélida frieza. Ao tocar a neve, como por um divino milagre, uma nota de 50 francos discretamenta me espreitava. Arranquei essa nota prisioneira da branca neve, sacudi-a, beijei-a, ergui os olhos aos céus e sussurrei: Obrigado, meu Deus! Afinal não estou tão só como pensava!
Agarrei nos meus enregelados pés e escorreguei sobre o gelo até chagar aquele meu tão querido Café ali a fazer esquina com a avenida Mozart. Entrei, pus-me na bicha para comprar os meus cigarros e, depois, sentei-me a uma mesa, como sempre, na montra! Pedi uma meia de leite e uma meia baguette com manteiga, queijo, e fiambre! O Café estava aquecido de tal modo que tive de despir o sobretudo. Fumei aí uns três cigarros um atrás dos outros, enquanto procurava decidir o que fazer com aquela vida que me tinha restado depois de ter saltado para dentro. Cheguei à conclusão que a melhor coisa que eu podia fazer era encontrar um melhor emprego e um melhor ordenado e, depois, decidir o meu futuro. Voltar para Londres, para o meu Pat, o meu Peter, o meu ninho de amor? Voltar para Israel e converter-me ao Judaismo para me legalizar e viver e morrer no país que tanto amava? ou simplesmente voltar à minha água furtada e desta vez realmente saltar? Desta vez para baixo!
Ao fim de tantas perguntas compreendi que a melhor coisa seria comprar o jornal e catar os anúncios. Certamente que, assim como nessa dolorosa manhã eu tinha tido um sinal de Deus que me tinha posto 50 francos ali na neve, à minha espera, talvez também tivesse posto um anúncio no jornala a oferecer-me emprego. Foi o que fiz! Levantei-me, comprei um jornal, abri a página dos anúncios e ele ali estava à minha espera! O tal anúncio que Deus tinha posto por mim nesse jornal, nessa pungente manhã de inverno:
“Hôtel Claridge, aux Champs-élysées, cherche standardiste male multi langue pour faire les nuits. Se présenter personnellement entre 10 heures et midi » !
dimanche 29 novembre 2009
Belos "pasteles de kabalhau"
No outro dia de manhã levantei-me antes que o sol o fizesse. Senti-me como um outro homem. Até na Swan o dia me pareceu mais simpático! Moshé também lá estava a preparar o seu negócio para os saldos. Achei muito estranho, pois que ainda faltavam duas semanas para que os ditos abrissem por toda a parte no país. O mais estranho e alarmante era que ele, em vez de descer os preços estava a dobrá-los. Quando lhe perguntei que lhe tinha passado pela cabeça? Os vestidos passavam de 800 a 1.600 francos! A sua manhosa resposta foi:
- Assim é que a gente os leva à certa! Quando virem os vestidos a 50% de desconto vão de certeza achar isso um bom negócio!
Achei este tipo de manobra repugnante! Mais uma vez tive de pensar muito a sério em arranjar outro emprego, agora que, graças ao Moshé, eu tinha todos os meus papéis franceses e estava totalmente legalizado no país! Nessa tarde, quando fui almoçar, já perguntei no “Self-Service” se eles precisavam de pessoal. Como a resposta foi negativa comecei de novo a comprar os jornais para ver os anúncios. Eu tinha que deixar de estar sob a alçada de tal criatura que me devia 1.200 francos de horas extraordinárias que tinha feito e que continuava a não ter direito a avanços de ordenado quando, a partir dos dias vinte, estava aflito para poder pagar os meus almoços!
Nessa noite quando regressei a casa bati à porta da porteira, que era portuguesa, se ele sabia onde era que eu podia comprar bacalhau. Ela disse-me não era nada fácil mas que ela me podia dispensar duas postas, que era uma prenda. Subi e fui ver se tinha todos os condimentos para os fabricar. Tinha tudo menos as cebolas. Desci e fui comprar as ditas. De regresso da da loja bati aos vidros do Heinz para o convidar para os “pasteles de kabalhau” no dia seguinte. Ele não estava em casa. Voltei à minha porteira e pedi-lhe uma caneta e uma folhinha de papel para deixar um recado por debaixo da porta do Heinz informando-o que no dia seguinte ele podia vir jantar em minha casa, que haveriam “pasteles de kabalhau”! Nessa noite, depois de jantar, depois de ter visto um filme na televisão, fui para a cama cedinho, depois de ter posto o bacalhau no molho. Nessa noite não precisei de ir vadear pelo Bosque. Tinha o meu homem a quem podia convidar a jantar no outro dia!
De manhã passei pela porteira a perguntar se o bacalhau podia ficar no molho até essa noite. Ela disse que não era problema! Que um senhor muito alto e loiro me tinha deixado um bilhetinho. Foi buscá-lo e estendeu-mo perguntando quem era aquele senhor? Que era um bonito homem! Disse-lhe que era meu amigo e nosso vizinho. Desdobrei o papelinho onde ele me dizia que estaria por volta das nove e que não comprasse vinho. Esse bilhetinho fez de mim o homem mais feliz dessa manhã em Paris! Fui trabalhar com a alma cheia de esperanças de ter encontrado enfim alguém a quem me pudesse dedicar. Até o Moshé nessa manhã me pareceu mais respeitável. Disse ao Moshé que nessa noite tinha convidados para jantar, se podia sair um pouco mais cedo. Ele surpreendeu-me quando me disse que não era problema, que ele ia ficar o dia todo na butique para tratar das suas contas mensais.
Quando voltei do almoço, para meu espanto, ele disse-me que podia ir para casa, que ele estava à espera duma pessoa muito importante e que não sabia exactamente a que horas ele chegaria. Fui a correr para casa e antes de subir entrei na padaria para comprar pão fresco. Chegado a casa arregacei as mangas e comecei a preparar o bacalhau para os meus pastéis. Tudo correu bem e os pastéis sairam-me com cara de alguém que acabava de chegar de férias! Fiz um arrozinho e preparei a minha mesa com talheres para dois. Como tinha alguns vasos no telhado, com sardinheiras, pus um castiçal com uma vela amarela no meio da mesa e dois pés de sardinheira deitados ao pé, sobre a toalha. A mesa estava bonita e eu ansioso que o Heinz chegasse! Era tão mais saudável e romântico do que ir todas as noites aos gatos rafeiros pelo bosque!
Ainda tive tempo de imitar um duche no bidé e barbear-me. Depois vesti umas calças ligeiras e uma bonita camisa de manga curta e fui por-me à janela, mas da janela, por causa do telhado, eu não podia ver a rua. Voltei à carga e preparei dois cálices e abri uma garrafa de vinho do Porto. Eu queria que aquela noite fosse uma noite muito especial para mim e para o Heinz! Por volta das nove batem-me à porta. Escancaro a minha porta e ali ele estava, o homem da minha noite com uma garrafa de Bordeaux na sua branca mão, abraçada pelos seus longos e finos dedos. Ele também estava lindo. Era evidente que ele também se tinha feito bonito para esse nosso jantar! Depositou a garrfa sobre a mesa e, dizendo como a mesa estava bonita, enlaçou-me contra si, e beijou-me ternamente. Depois sentou-se em cima da minha cama e estendeu-me a mão para aceitar o Porto que eu lhe estendia. Passámos uns momentos ali sentados um contra o outro saboreando o aperitivo e o longo cigarro que crepitava aos nssos ouvidos enquanto o azulado transparente fumo fazia caprichosos desenhos frente aos nossos olhos. Depois fomos para a mesa. Abri a garrafa de Bordeaux e servi. Quando pus a travessa com os pastéis em cima da mesa ele delirou. Pegou logo num com a ponta dos dedos e mordiscou um dos meus pastéis de bacalhau que tinham acabado de regressar de férias. Ele fez um grande cumprimento aos meus pastéis dizendo que os meus ainda eram melhores do que os que costumava comer pelas tascas de Lisboa. Quando lhe disse que tinham sido feitos com muito amor ele pousou um pequeno beijo na ponta dos seus longos e brancos dedos, que veio aterrar sobre os meus lábios ainda molhados do Porto.
O jantar decorreu bem mas um tanto apressadamente. Era evidente que ambos queríamos levar mais longe os nossos afagos mas eu disse-lhe que depois de jantar não devíamos fazer amor, segundo as crenças portuguesas. Ele deu-me um grande beijo na boca e sugeriu irmos dar uma volta e ir tomar um café. Descemos e entrámos no Café ali à esquina, na avenida Mozart. Sentámo-nos e deliciámo-nos com um bom Express e conversámos acerca dos nossos futuros. Um dos temas foi indagar quais os meus projectos, se tencionava fixar-me em França ou se voltaria para Portugal. Falei-lhe do meu amor por Israel, mas que não podia voltar para esse país por não estar autorizado pelo facto de eu não ser Judeu. Aí ele pareceu-me preferir não comentar esse facto. Em contrapartida, perguntei-lhe quais os seus planos. Os seus planos eram muito vagos e imprecisos. Que trabalhava para um grande jornal alemão que o enviava constantemente como enviado especial de país em país, pelo facto de ele falar bem o Inglês, e que essa língua era tão internacionalizada, que em todos os paises ele podia trabalhar, pois que em todos eeses paises, na imprensa, todos falavam essa língua. Que ele estava agora em Paris mas que podia ser transferido para outro país qualquer, segundo as ordens dos responsáveis desse jornal alemão. Depois saímos e fomos a pé até ao Trocadero ver a torre à noite toda iluminada. Regressámos a penates na maior das calmas.
Chgados à rua René Basin parámos em frente da sua porta. Eu disse-lhe boa noite, dorme bem, obrigado por este belo... mas ele atacou mesmo antes de eu ter terminado a frase. Que eu entrasse, que ele gostaria de me mostrar algumas fotos dele e da casa onde ele crescera. Entrámos. Ele mostrou-me as bonitas fotos que aparentemente carregava com nas suas bagagens para onde quer que fosse. Ele era um homem lindo mas nessas fotos, um tanto mais jovem, ele era divino, com aquela loira melena a cortar-lhe a testa, descendo até aos seus límpidos olhos azuis. Ele propos-me um whisky, que aceitei. Sentados na sua cama ambos despejámos alguns whiskies e a cabeça começou a andar-me à roda. Recostei-me na sua cama suspirando fundo. Ele cai-me em cima e sussurrou-me que me queria todo! Que não queria nem sequer pensar que um dia o destino, tal como ele nos tinha posto no caminho um do outro, também um dia nos separaria.
Essa noite passámo-la juntos no seu estúdio. Foi uma noite de amor como se ela fosse a última que passaríamos juntos! Talvez a mais bela noite de amor que me seria dado viver! Obrigado meu Deus! Repousa em paz, Alberto!
samedi 28 novembre 2009
Passeios Nocturnos Pelo Bosque
Na Swan, sempre a mesma monotonia. Trabalho, pouco! Horas encostado à porta a ver passar as belezas, muitas! Mesmo sem descer do meu degrau eu atraía a fauna! Uma das primeiras vítimas foi um belo janota que era um dos membros do pessoal duma dessas famosas Galerias ali no Boulevard Haussmann. Às horas do almoço ele passava à porta da butique e ali ficava especado a apreciar os vestidos expostos na vitrina. Pensei que, ou ele pensava em fazer uma surpresa à sua esposa comprando-lhe um daqueles belos vestidos até aos pés, ou talvez para ele próprio quando ia a festas muito especiais. Ele mantinha um olho sobre a montra e o outro sobre mim! Acabei por perceber que era a minha pessoa que o interessava verdadeiramente. Como na butique havia uma escadinha que nos levava a uma pequena dependência que fazia de arrecadação, decidi meter conversa com ele. Ele era um jovem bastante bonito, e eu raramente sabia resistir a homens bonitos. Convidei-o a entrar para ele deitar uma vista de olhos à nossa vitrina no interior onde tínhamos em exposição dezenas de “bijous”. Ele deixou os seus olhos passearem sobre esses pechisbeques, mas o pechsibeque que mais lhe interessava estava escondido entre as minhas pernas. Fechei a porta, convidei-o a subir, e mostrei-lhe o pchisbeque. Ele gostou, mas como não estava à venda, limitou-se a experimentá-lo para ver se era a sua medida. E era! Durante algum tempo veio uma vez por semana para provar uma vez mais a minha jóia rara, para ver se ainda servia!
Depois duma longa temporada de abstinência os negócios arrancaram a grande velocidade. Não tinha clientes para nos comprarem um vestido mas tinha muitos interessados na única mercadoria ali exposta à porta: o meu corpo! Nem foi preciso fazer saldos! A clientela começou a entrar para apreciar o artigo e, por vezes, experimentavam o tamanho, ali mesmo na pequena cabine de ensaios! Até um português que trabalhava ali ao lado, numa garagem, começou a vir meter o nariz onde não era chamado! Ou tinha sido? Pois que depois as remessas começaram a ser entregues ao domicílio, ali contra um camião indiferente ao que se passava!
Para mim, o sexo passou a ser uma espécie de droga dura, e quanto mais dura era essa droga que Deus decidira implantar entre as pernas dos homens, mais dura era a minha droga! Isso porém transformou-se numa especiaria que tinha vindo dar algum sabor à minha sensaborona rotina ali naquela butique onde multidões passavam à sua porta sem entrarem, à parte Moshé quando me vinha substituir para eu ir almoçar, assim como aqueles que entravam para tirar as medidas no primeiro andar. A minha vingança era, chegado a casa onde ninguém me esperava, fingir que jantava e, logo a seguir, dar um salto ao Bois de Boulogne, ali mesmo à porta, para encontrar alguém que me ajudasse a digerir o meu pobre jantar e a minha rica solidão! Nesses passeios nesse bosque apenas iluminado pelo luar - quando a lua se atrevia a mostrar-se - eram uns atrás dos outros, como um cigarro que apenas se apaga depois de muitas ávidas fumaças! Essa insolente bulímia que me obrigava a fumar todos os meus cigarros até ao filtro, até me queimarem os dedos!
O Melo continuava permanentemente dormitando no meu pensamento, mas isso era o fruto proibido pendendo na árvore dos meus pecados. Aquele ardente beijo trocado naquela noite em Herzelia continuava a ser aquele ponto final definitivo nas nossas vidas, nos nossos destinos! Talvez mesmo ao nosso amor! Eu, por vezes, mergulhava no meu subconsciente à procura duma saída. Eu tinha que sair das garras do Moshé e da sua butique e dos meus dias e noites submersos em sexo passageiro!
Além da monotonia daquelas oito horas por dia na butique, cortada apenas pelas visitas do português, do belo magnate daquela famosa Galeria parisiense, e de muitas novas caras passando à porta detendo-se apenas para vazar os testículos, a minha vida não tinha qualquer rumo! Para preencher aqueles insondáveis momentos de solidão, por vezes passava-me pela mente voltar para Londres, aos braços do Pat e do Peter, mergulhando na sumaúma da minha cama, entalado entre ambos. Eu começava a sentir uma necessidade imperiosa de, em Paris, encontrar alguém a quem me pudesse dedicar inteiramente, e sair daquela sombria selva do Bois e das orgias em Boulogne, em casa desses dois promíscuos e das suas tão apreciadas duplas penetrações e respectivas orgíacas festas com dezenas de depravados e seus vibradores e tantos outros apetrechos duma sexualidade pervertida. Deixei de frequentar essa casa na noite em que, como grande atracção, um dos convidados enrabou o seu próprio filho perante os extasiados olhos de todos os outros sádicos espectadores!
Um domingo de manhã, acordado pelo irreverente sol através das minhas persianas, depois do meu primeiro cigarro do dia, desci os meus encaracolados seis andares e fui ao padeiro comprar uma baguette para o meu pequeno almoço. A caminho da padaria esbarrei contra um jovem muito alto, muito loiro, olhos muito azuis, um bom exemplar da exultante raça ariana. Ele sorriu-me e disse-me “bonjour”! Eu respondi aos seus insinuantes votos dizendo-lhe “bonne nuit”, pensando comigo mesmo que teria preferido uma "boa noite" com ele na cama. Ao regressar da padaria com a minha baguette na mão como se fosse para a guerra decidido a ganhar a batalha, dei com esse belo ariano encostado ao umbral da porta de escada mesmo ao lado da minha. Ao passar por ele, ele novamente me sorri e me pergunta por que razão tinha eu correspondido ao seu “bom dia” com um “boa noite”? Ele era duma beleza tal que não resisti à tentação de, com um dos meus sorrisos muito intencionais, lhe traduzir o meu pensamento de havia poucos minutos. Ele aproveitou a ocasião para, olhando para a minha longa baguette, perguntar se eu ia tomar o meu pequeno almoço com os meus. Respondi-lhe que não, que vivia só! Ele ripostou dizendo-me: que tristeza, uma tão bela manhã dum soalhento domingo, tomar o pequeno-almoço a sós. Que ele também vivia só e que ainda estava em jejum, que o acompanhasse a sua casa, trouxesse a minha baguette e, assim, tomaríamos o pequeno-almoço juntos. Abri os braços ao inesperado convite e segui-o. A minha bulímia rapidamente também acordou, pronta para saborear uma boa refeição!
Ele morava ali mesmo no rés-de-chão esquerdo, num pequeno estúdio muito mal ajeitado. Fechou a porta e tirou-me a baguette da mão e pousou-a sobre a pequena mesa perto da janela que dava para a rua. Pediu-me para me acomodar. Como a sua larga cama estava ali toda desfeita a sorrir-me convaditivamente, acudi ao apelo e sentei-me na sua borda. Ele preparou o pequeno almoço com ovos estrelados e café com leite. Pôs a mesa ao mesmo temp que se apresentava: que era alemão, que se chamava Heinz, e que era jornalista. Também me apresentei e, em Alemão, disse-lhe que era português e que tinha vindo de assalto até Paris; que trabalhava numa butique na Rue Scribe, ali à Ópera. Ele, muito surpreendido, pousando os talheres sobre a sua muito bem atoalhada mesa perto da janela, exclamou:
- Ich habe auch dort in der Oper arbeiten! Nicht nur die Bewohner und die Arbeit in der gleichen Gegend!
Não compreendendo muito bem aquela lengalenga, pedi-lhe que mo traduzisse em Francês! Ele então fez-me compreender que não só éramos vizinhos, como também ambos trabalhávamos na mesma área de Paris!
Depois das apresentações sentámo-nos ambos à mesa e deliciámo-nos com aqueles belos ovos estrelados e a minha baguette que ele descontraidamente cortara à mão. Enquanto nos regalávamos com aquele imprevisto pequeno almoço, falou-se de Portugal, da França, e da Alemanha. Da Alemanha soube que ele tinha nascido em Berlim, onde tinha feito os seus estudos e começado a sua carreira como joranalista. Que já tinha feito algumas reportagens em Portugal para o jornal para que trabalhava, e que tinha adorado o país! O seu clima, os seus belos muito orientais homens, a sua comida! Que adorara “pasteles de kabalhau”! Achei graça ao seu “kabalhau” e disse-lhe que um destes dias lhe fariam pastéis de bacalhau. Ele aceitou a proposta com uma condição: “as soon as possible”! Depois desta curta frase em Inglês começámos a comunicar apenas nessa língua! Língua essa que passaria a ser a única língua a ser utlizada entre nós, embora um desejo muito intenso de utilizar as nossas duas líguas em bilingue se apoderou de mim! Como ele tinha mencionado que tinha gostado do visual um tanto oriental dos portugueses, pousei a minha mão na sua coxa e perguntei-lhe se eu também tinha algumas semelhanças com os árabes? Ele, aprisionando a minha faminta mão, disse que não, que eu era especial, que não tinha tipo de português mas que quando eu passara por ele na rua, com a minha baguette na mão, lhe tinha desperto o desejo de me conhecer melhor, e como eu lhe tinha desejado uma "boa noite" ele agora gostaria de nos proporcionar uma "boa manhã", ali naquela sua cama vazia à nossa espera. Levantei-me e fui sentar-me na borda dessa prometedora cama e aguardei os acontecimentos. Ele não tardou a juntar-se a mim. Finalmente eu fazia amor com um homem numa cama fofa, entregando-me totalmnte nos seus longos braços que tanta ternura e desejo albergavam! Foi uma "boa manhã" de dar e receber os nossos corpos, ambos, talvez, desejosos de que aquela vez não tivesse sido a única vez!
Depois, contente com o sol no céu azul e o meu corpo completamente saciado, subi ao meu sexto andar enquanto ele ficou no seu estúdio a lavar a loiça e a limpar as migalhas. Talvez, como eu, desejando que aquela vez não tivesse sido apenas a única vez!?
A Butique SWAN, ali à Ópera
O trabalho na butique era dum tédio mortal. Haviam poucos clientes e eu passava os dias à porta a ver passar os “petiscos” ambulantes. O telefone só tocava duas vezes por dia e clientes, também dois ou três, e nem sempre compravam alguma coisa. Como a porta da butique era mesmo ao lado da porta principal do Hotel Scribe, fiz amizades com um dos porteiros, um simpático cavalheiro já duma certa idade, que fazia muitas gorgejetas e que de vez em quando me punha algumas moedas na palma da minha mão. Isto a partir do dia em que lhe pedi um cigarro. Ele ofereceu-me um cigarro e disse-me para eu ir ali ao Café mesmo ao lado comprar tabaco, que ele tomaria conta da butique até que eu voltasse. Quando lhe disse que não tinha dinheiro para tal luxo, sacou dumas moedas do seu bolso e mandou-me ir comprar a minha droga! Desde esse dia, frequentemente ele me perguntava se eu tinha tabaco. Ele era arménio e uma doçura de pessoa!
O Moshé andava sempre na boa-vai-ela e só vinha tomar conta da butique quando tinha de me substituir para eu ir almoçar. Eu, quando tinha dinheiro, ia almoçar num pequeno “self-service” ali numa rua das trazeiras do Olympia, mesmo em frente da entrada dos artistas. Comia-se lá bem e barato, mas como o Moshé não me pagava o ordenado adiantado, o primeiro mês foi-me bastante pouco alimentício. O Melo por vezes também me ajudava, mas como eles também não andavam a nadar em dinheiro, era só de vez em quando. A propósito destas dificulades, uma vez o Moshé foi almoçar e quando voltou disse-me:
- Agora vai tu almoçar. Tens uma hora!
Respondi-lhe que tinha uma hora mas não tinha dinheiro para pagar o almoço, se ele me podia avançar uns cobres. Respondeu-me que o problema era meu, que ali não era a Casa da Misericórdia! A partir desse dia fiquei a detestar essa monstruosa criatura dum egoismo e duma arrogância atrozes! Ao sair, sem sequer ter um centavo para comprar fosse o que fosse, ele teve o descaramento de, muito cinicamente, me desejar “bom apetite”! A semente da discórdia e do ódio acabara de ser lançada! Uma hora mais tarde, quando regressei, fui dar com o Moshé ainda a arrotar e a espevitar os dentes, com um palito entalado entre as beiças. Nesse momento, como um vulcão que entra em erupção, um ódio, como lava, começou a ser vomitado pela cratera e, destruindo tudo pelo caminho, desceu até ao vale!
Uma tarde ele recebeu uma chamada de um sobrinho seu de Jerusalem a perguntar-lhe se ele podia vir para Paris trabalhar para ele. A sua resposta foi clara e impertinente:
- O mais que eu te posso pagar são 1.500 Francos! Com este ordenado ninguém pode sobreviver em Paris!
Nesse dia jurei vingar-me daquele insulto à minha porca miséria! E esse dia, um certo dia, chegaria! Quando prometo alguma coisa, seja a quem for, sempre cumpro!
Os dias foram passando e ao fim do primeiro mês recebi o meu primeiro ordenado. Claro que tive de ter muito cuidado, não me meter em cavalarias altas, pois que desse ordenado, a primeira coisa que tinha de fazer era pagar o meu quarto, que me custava 250 Francos por mês! Depois tinha de tomar em conta as despesas para o almoço e mais tarde, em casa, para o jantar. Sem tão-pouco esquecer o tabaco. Que era já caríssimo! Alugar um televisor é que não resisti! Era, dum certo modo uma companhia, embora eu continasse a não gostar do som da língua francesa. Embirrava com aquele uso de acentuarem sempre a última sílaba de cada palavra, mas isso ocupava-me os serões. De vez em quando ia à Rue Erlanger passá-los com com o Melo e a Rita mas, por outro lado, não queria ser um permanente intruso na privacidade deles.
Outro problema era que a minha necessidade de carne fresca fazia-se sentir pesadamente. Um dos meus vizinhos, um dos irmãos africanos vinha por vezes bater à minha porta para bater o papo, e algo nos seus olhos me fazia pressentir que ele se sentia tão necessitado como eu. Mas nem um nem outro ousou manifestar-se abertamente. Comecei então a sair à noite. Grandes passeatas até ao Bois de Boulogne,como um esfaimado lob em busca duma presa. Foi numa dessas minhas idas que esbarrei com dois jovens franceses que me convidaram a ir tomar uma bebida em casa deles. Eles moravam em Boulogne Billancourt. Claro que não tomámos nenhuma bebida. Nem quente nem fria! Fomos logo direitinhos à cama e matámos a fome uns aos outros. A especialidade da casa parecia ser a dupla penetração, coisa a que comecei a gostar muito particularmente. Um deles, o mais jovem, era evidente que apreciava aquele tipo de intrusão. Foi assim que o nosso serão, depois de termos lido muitas páginas do Kama Sutra, terminou. Foi a “grande finale”!
Michel-Ange Auteil
Chegado a Paris, lá estava o Melo à minha espera com o seu grande sorriso e braços abertos para me receber a mim e as minhas duas malas. Depois dum grande abraço tomámos o Metro para nos apear em Michel-Ange Auteil, ali muito perto da Rue Erlanger, onde eles viviam. Esta rua era curta, estreita, e pouco movimentada. Eles viviam num pequeno rés-de-chão dum modesto prédio sem grandes ares. Tinham apenas uma sala com um grande sofá que abriam à noite para eles dormirem. O único quarto que havia era propriedade privada de Sua Majestda a Raínha Dona Anaiss! Tinham também uma minúscula cozinha que era o domínio da Rita, e uma pequena casa de banho. Da sala ao quarto da Anaiss havia um pequeno corredor onde eles iriam desenrolar algumas noites um pequeno colchão que seria o único espaço onde eu iria poder estender-me à noite para dormir ou, pelo menos, tentá-lo, pois que sempre que eles queriam ir à casa de banho durante a noite, tinham de passar por cima de mim e acordarem-me. O que não era nada práctico para qualquer de nós!
Rita recebeu-me de braços abertos mas, mesmo assim, não conseguia sentir-me tão confortável como no meu doce “chez-moi” em Chalk Farm. O pior problema foram as minhas duas malas que foram escondidas por detrás do pequeno bar que havia na sala e era um grande desconforto sempre que eu precisava de algo feito prisioneiro nessas malas entaladas entre a parede e pequeno balcão do bar. Era o cabo dos trabalhos! Uma das poucas venturas era estar de novo perto do meu Tété e da Rita! Anaiss continuava impertinente e desagradável. As minhas predições acerca dela tinham-se realizado! Julguei crer que eu conseguia ler o futuro ainda com mais clareza do que uma cigana ou um marabu! As minhas maiores alegrias ainda eram as fugas que eu e o Melo fazíamos a um grande Café ali na Rue D’Auteil, onde passávamos bons momentos entre nós dois. Rita trabalhava para um grande magnate mexicano ali perto, e o Melo fazia de caixeiro-viajante para o Moshé.
Zé levou-me uma manhã visitar o seu patrão, o Moshé, que tinha trespassado a sua butique no King David Hotel, em Jersualem, para tamém fugirem - ele, sua mulher, e filho - à Guerra ds Seis Dias. Esta sua butique em Paris encontrava-se perto da Ópera, ali na Rue Scribe, mesmo ao lado da entrada principal do hotel com o mesmo nome. Era uma pequena butique com uma simplória montra onde se podiam ver expostos vestidos pretos bordados a ouro, que eram confecionados algures em Jerusalem. O Moshé - que eu já conhecia de Jerusalem - ficou contente de me ver e imediatamente me propôs trabalho. Comecei logo no dia seguinte. Foi a Suzy, a mulher dele, quem me explicou como dirigir esse negócio. Como o meu ordenado iria ser de 1.500 Francos mensais, sem perda de tempo, comecei logo à procura dum quarto que pudesse vir a ser o meu cantinho e poder abrir as minhas malas.
Graças a um pequeno anúncio no Café-Tabac, na rue d’Auteil, onde costumava ir comprar os meus cigarros, fui visitar um quarto ali perto, na Rue René Basin. Era uma pequena água-furtada num sexto andar sem elevedor! O quarto era espaçoso e tinha o encanto muito especial de ter uma bonita janela de água-furtada mesmo à beirinha do telhado. Tinha apenas um divã, uma mesa e duas cadeiras, uma cómoda para pôr a minha roupa, e um lavatório com água quente e fria, assim como um espelho sobre uma pequena prateleira para alojar os meus cosméticos. Ao lado do lavatório havia igualmente um daqueles muito românticos bidés dos tempos da Maria Antonieta, que viria a ser-me de grande utilidade! A retrete encontrava-se no corredor e era de acesso a todos os outros inquilinos. Chuveiro não havia, mas eu remediei a situação comprando um longo tubo de borracha que eu enfiava na torneira do bidé e, dentro dele, com esse tubo por onde passava a água temperada ao meu gosto, tomava os meus duches! Havia também um pequeno canto de cozinha com um fogareiro a gaz, para eu me ragalar com os meus cozinhados!
Sem tardar, comecei a decorar esse quarto à minha maneira, ao meu gosto, tal como fizera no Sing-Sing. Pintei as paredes todas de branco, lavei bem o soalho, comprei uma colcha nova para o divã e umas almofadinhas para enfeitar. Nas paredes acabadas de serem pintadas de branco, com um lápis de carvão, fiz alguns dos meus desenhos que ficaram muito decorativos. Quando lá levei a Rita e o Zé ver o meu palácio, imediatamente a Rita se lembrou do trabalho que tínhamos feito em Beit Ha’Kerem! Os únicos inconvenientes era não ter casa de banho privativa e não ter ascençor que me acartasse até lá àquel sexto andar, tudo em escada de caracol. Nessa altura eu era jovem e saudável mas, mesmo assim, chegava alá ao topo com os bofes à boca! Uma das grandes vantagens era que tinha uns vizinhos todos muito cominicativos e, assim, convidavamo-nos constantemente a jantar uns em casa dos outros. Como éramos todos de etnias diferentes, cada qual tinha a sua cozinha tradicional a fazer provar aos outros. Gostava particularmente da garrida cozinha de dois irmãos africanos que viviam na porta mesmo ao lado da minha.
mercredi 18 novembre 2009
Inesquecíveis Passividades
A presença de Peter na minha vida, a partir dessa data, passou a ser uma bênção! O Pat era o meu companheiro mas Peter trouxe-me o encanto do seu belo pequeno corpo e a sua sublime passividade. Temos o Norte, o Sul, o Este, e o Oeste. Pat era o meu Norte, o Peter o meu Sul, o Este o meu talento para o desenho, e o Oeste, a minha permanente necessidade de escrever. Senti-me um homem completo, preenchido! Era então tão bom viver! Saber, sentir, que o meu corpo tinha uma razão de existir, de estar sobre esta terra, enquanto o meu coração me pulsasse no peito. Esse peito tão cheio de amor por tudo e por todos. Sobretudo o meu grande amor pela Vida, essa Vida que só se vive uma vez! Até mesmo a nebulosa Londres senti que se tinha tornado soalhenta! Acordar de manhã ao lado do Pat o meu primeiro pensamento era para o Peter e aquele seu corpo ali todo à minha espera era uma outra razão para viver! Para mim era importantíssimo viver, amar, ser feliz, gozar essa vida que tinha tão injustamente sido roubada, recusada, ao meu querido irmão Alberto!
O trabalho na Foyles era outra grande conquista da minha vida. Fazer um trabalho que me apetecia fazer, trabalhar com gente com a qual tanto gostava de estar, ter um pequeno apartamento onde eu era rei, sem que o Pat fosse meu vassalo! Até ir almoçar todos os dias ao Woolworth’s era uma lança em África, tomando em consideração que nesse continente se morria de fome! Eu tinha o meu emprego, o meu lar, o meu companheiro e, acima de tudo, tinha o Peter, aquele aquele jovem corpo cheio duma frescura abrasadora! Todos os fins de semana tinha a presença do Peter para me iluminar os sombrios londrinos dias! Todos os domingos íamos os três esmiuçar essa bela e grande cidade! Depois desses gloriosos momentos vividos lado a lado através dessa Londres a transbordar História por todos os poros, todos os recantos, todas as ruas, acabar o dia na cama entre dois homens que amava, era a suprema dádiva dos céus!
Nessa altura da minha vida, em Londres, tive um dia a aparição de outro homem que tanto também tinha amado! O Zé Melo e a Rita vieram passar uns dias connosco. Por causa da Guerra dos Seis Dias tinham deixado tudo para trás em Jerusalém e procurado refúgio em Paris. Tinham vindo a Londres para conhecer essa real cidade e darem-me um real abraço cheio de saudades dos nossos belos tempos em Jerusalém! Eu continuava a ser importante na vida do Melo. De tal modo que quase me implorou que eu viesse viver com eles em Paris. Que eles trabalhavam para um grande milionário em Paris e que me podiam colocar a trabalhar numa butique israelita ali para a Ópera. Tanto insistiram que acabei por ceder! Chalk Farm, Pat, Peter, Londres, eram tudo o que eu tinha e já era tanto, mas o meu instável ciganado sangue que me corria nas veias levou-me até Paris. O Pat e o Peter vieram acompanhar-me à estação onde apanhei um comboio que me levaria até Dover, onde apanharia então um barco até Calais, e daí outro comboio até Paris, ali nos Champs de Mars, onde o Melo estaria à minha espera com as minhas duas malas. Ao despedir-me do Pat e do Peter com lágrimas nos olhos, sabia que os não deixava sós. Tinham-se um ao outro para se sentirem menos sós sem a minha presença e, depois, como combinado com o Melo e a Rita, o Pat mais tarde viria ter connosco. Só o Peter foi como uma facada perder o seu corpo que tão bem aprendera a dar-se inteiramente ao meu! Peter que certamente encontraria outro alguém e um dia esqueceria que eu passara por ele na sua vida!
Esse Famoso Curto Domingo
Mal regressados a casa, a primeira coisa que fizemos foi abrir as malas e por tudo no cesto da roupa suja, excluindo o belo cinzeiro que tinha roubado no hotel para o Peter. A segunda foi dar um salto à agência onde o Peter trabalhava para lhe entregar a lembrança de Torremolinos. Não percebi muito bem se a sua grande alegria foi de acariciar esse cinzeiro ou o prazer de me ver de volta e talvez poder acariciar-me também, pois que quando lhe estendi a mão para o cumprimentar, ele reteve-a longamente bem aconchegada na sua! Agradecemos de nos ter enviado a Torremolinos, onde realmente tínhamos passado umas boas duas semanas de férias. Ele agradeceu o cinzeiro mas que ele não fumava. Perguntei-lhe se bebia, que o podia convidar para um copo. Também não bebia. Desesperado, disse-lhe:
- Goog God! You do not smoke, you do not drink! Hope you do...
Ele cortou-me a palavra para me dizer simplesmente:
- That? We never know!
Convidei-o a vir almoçar connosco em nossa casa, que lhe faria um petisco português à base de bacalhau. Ele mostrou-se muito entusiasmado, que já tinha ouvido falar desse peixe, mas que nunca tinha provado. Dei-lhe o nosso número de telefone e sugeri que ele nos telefonasse a dar-nos uma data que lhe conviesse. Ele saltou sobre a ocasião e propôs-me “next Sunday”! E assim ficou combinado. Nesse domingo preparei um bacalhau à Gomes de Sá. Prato que o Pat também muito apreciava. Dei-lhe igualmente a nossa morada em Chalk Farm, que seria um “grande prazer” recebê-lo! Ao saír voltei-me para trás e pisquei-lhe o olho, ao qual ele correspondeu com um grande sorriso e um discreto aceno de mão.
Foi também com muito gosto que voltei ao Foyles e reencontrei todos os meus amados colegas e o meu P.B.X. que parecia sorrir-me. Acariciei-o e disse-lhe “nice to see you again”! Todos os meus colegas queriam tudo saber acerca de Torremolinos e como tudo se tinha passado. Até o Christopher me chamou ao seu escritório para me dizer “nice to see you back” e pedir-me para eu dar umas pequenas lições de Francês à Suzanne, que ela tinha sentido muito a minha falta.
Em casa, depois do Pat ter lavado a roupa suja ainda a cheirar a Torremolinos e a tê-la engomado, tudo entrou nas normas, sem esquecer as minhas compras, os meus cozinhados, e o nosso “babysiting” ao Papuzinho. Mrs. Murray convidou-nos uma vez mais para jantar, afim de saber como tinham sido as nossas férias. Mr. Murray sorria-me a lembrar-me que os seus dentes nesse dia, para variar, tinham saído do seu copo e vindo dar uma volta. Voltámos às nossas passeatas no Primrose Hill Park e os nossos “fish and chips” e, como quem não quer a “coisa”, dei um saltinho ao Dr. Tom para por as contas em dia.
No sábado fiz as minhas compras para por o bacalhau no molho para o bacalhau à Gomes de Sá para o meu tão desejado Peter. Pat fez limpeza geral, como sempre fazia quando tínhamos visitas. No domingo de manhã levantei-me cedo, barbei-me e tomei um longo banho, para me fazer bonito para o meu doce Peter. Na cozinha preparei os condimentos para o meu bacalhau e pus a mesa para três. Depois sentei-me na sala, impaciente para que a campainha tocasse.
Por volta as dez a campainha tocou. Foi como os sinos duma igreja num domingo de manhã a chamar os fiéis aos seus serviços. A verdade é que eu tinha rezado para que o Peter não faltasse, que chegasse cedo para o almoço. Quando abri a porta pareceu-me ter visto a aparição dum anjo! Meu coração bateu desordenado e a minha carne começou a fervilhar! Enfim eu ia poder por em jogo a minha arte de seduzir aquela pequena criatura que despertara em mim desejos até então nunca pressentidos! Indiquei-lhe o caminho para a nossa pequena salinha e convidei-o a tomar lugar no diminuto sofá que, por vezes, fora o princípio de grandes eventos! Ofereci-lhe um Porto para começar. Pat, sentado na nossa frente, observava as manobras do grande descobridor em busca da sua bússola. Ofereci-lhe também outro Porto e verti outro para a minha pessoa impaciente de saber quão longe este meu programado assalto de sedução iria chegar! Uma coisa era certa tudo no meu corpo se inflamara! Urgia tê-lo nos meus braços e esfrangalhar aquela sua tão sensual boca!
Leguei o Peter ao Pat enquanto, na cozinha, eu preparava o bacalhau. Não sei o que se passou exactamente durante a minha ausência. Ambos eram um tanto introvertidos. Logo que pus o bacalhau no forno voltei a tomar o meu lugar no pequeno sofá ao lado do Peter. Pat continuava silenciado sobre o seu cadeirão perto do telefone. Fui buscar as poucas fotos que tínhamos feito em Torremolinos para mostrar ao Peter. Ele deixou-se envolver com as minhas fábulas acerca das férias e dessas fotos que pouco contavam. Apenas a minha foto dentro do meu famoso bikini o fez sorrir! Encostei-me um nadinha mais a ele e ele consentiu, encostando-se um pouco mais fortemente contra mim.
Quando o bacalhau nos enviou aqueles convidativos aromas até ao salão, levantei-me e fui tirá-lo do forno. Dei mais uns retoques na mesa, fiz uma boa salada, abri duas garrafas de vinho, pois que vinho seria essencial essa tarde para amolecer o Peter e arrebitar-me a mim. Fui buscá-los à sala e acomodei-os nos seus lugares. Servi o bacalhau e a salada. Peter provou o meu bacalhau e entusiasticamente disse que estava delicioso, que era realmente algo de muito diferente da cozinha inglesa! Depois dos queijos servi um arroz doce também muito português, com muita canela.
Depois do almoço fomos tomar café para a sala e conversámos um pouco sobre certas actualidades dessa época. Às tantas Peter pergunta-me onde era a casa de banho. Levantei-me para lhe mostrar o caminho. Era ali mesmo no pequeno hall. Quando ele saiu da casa de banho esfregando as mãos, disse-nos que tínhamos uma bela casa de banho, que onde ele vivia não havia tal luxo! Convidei-o então a visitar o resto da casa, ou seja, o nosso quarto! Ele olhou em redor dizendo “very nice”, e quando se preparava par sair do quarto, eu barrei-lho o caminho abrindo-lhe os meus braços. A sua primeira reacção foi empalidecer e os seus olhos mostraram-me o susto que lhe ia na alma e no corpo. Apertei-o docemente contra mim e beijei aquela amedrontada boca que parecia evitar a minha. Quando cuidadosamente fechei a porta do quarto ele perguntou-me:
- How about Pat?
Respondi-lhe:
- Pat is watching television!
Aí ele cai-me finalmente nos braços! As nossas bocas uniram-se num muito longo e profundo beijo. Minhas mãos exploraram desvairadamente aquele pequeno corpo ali todo entregue à minha mercê! Caímos em cima da cama. Os nossos corpos despojaram-se rapidamente das suas roupas e das suas inibições! A entrega foi total! Quando o montei as suas pernas abriram-se generosamente à espera da devastadora penetração que pairava no ar! Gentilmente introduzi-me no seu corpo claramente ansioso de se fazer trespassar pelo meu! A penetração foi difícil pois que ele estava bastante contraído. Pouco a pouco fui-lhe invadindo aquela muito íntima parte do seu jovem corpo. A cada pressão ele gemia sufocadamente mas, depois do caminho bem aberto, gemia dum prazer evidente. Longamente os nossos corpos se deram um ao outro numa comunhão absoluta. Depois de ter descido de cima daquele belo jovem corpo que acabava, enfim, de possuir, ele pousou a sua bela cabeça sobre o meu peito e segredou-me:
- I want you to know that it was my first time!
- So was mine! –
- Liar!
- I am not a liar! It was also my first time too! With you!
- Liar! You already have fucked me many times before with your eyes!
Um dia tão bem passado
mardi 17 novembre 2009
O Muito Falado Bikini
Chegada a data de partir para a nossa grande viagem até Espanha para umas primeiras grandes férias fora de Inglaterra, na véspera preparámos duas malas. Cada um a sua mala, a sua independência. Pat gostava de carregar consigo coisas que nunca usaria ou lhe seriam de qualquer utilidade. Ao passo que eu era apenas o mais indispensável. Algumas camisas, dois pares de calças, cuecas, algumas peúgas, e uma toalha de banho. Ao dobrar a minha toalha e ao pondo-a na mala, repentinamente me lembrei que não tinha um único fato de banho, pois que em Inglaterra é algo que ninguém se preocupa em ter, tão inútil tal peça de vestuário é. O mais necessitado em Inglaterra é gabardinas, galochas, chapéus de chuva, e luvas. Era tarde demais para ir comprar um pois que as lojas já estavam todas fechadas! Desenrascado como sempre fui, agarro numa velha T-Shirt que tinha na cozinha para limpar o pó e corto-a em dois triângulos. Fiz-lhe umas bainhas, introduzi os elásticos, provei, e pronto! Já tinha bikini para as minhas férias em Torremolinos!
No outro dia de manhã levantámo-nos muito cedo para apanharmos um comboio que nos levasse até Stanstead Airport, nos arredores de Londres. A viagem de comboio foi monótona e cansativa mas, depois, no avião foi uma alegria. Foi-nos servida uma pequena refeição, coisa que agora já não acontece, agora atiram-nos com um “cachorro” para debaixo dos queixos, como se fôssemos cachorros! As hospedeiras eram lindas e os comissários de bordo um insulto à minha dignidade quando me via ao espelho! Pat mostrava-se um tanto excitado com esta nossa nova aventura. Não era a primeira vez que ele apanhava um avião mas, mesmo assim, era como se o fosse. Chegados ao aeroporto de Málaga tínhamos lá à nossa espera um autocarro que nos levou até ao hotel.
O hotel, tomando em conta o que tínhamos pago, foi a nossa primeira surpresa! Era um hotel de luxo com um serviço impecável! Nós tínhamos reservado com apenas meia-pensão para estarmos livres à noite para irmos jantar fora e conhecer a vida nocturna de Torremolinos. O nosso quarto era muito confortável e tinha uma grande varanda que dava para a piscina. Mal desfizemos as malas, vesti o meu novo bikini e fui estreá-lo na grande piscina. O ambiente da piscina era acolhedor. Haviam muitas famílias com as suas criancinhas aos saltos e aos gritos, jovens casais amorosamente enlaçados, e alguns solitários que não tiravam os olhos do meu reduzido bikini. Pat sugeriu que eu comprasse um fato de banho decente na boutique do hotel, mas preferi provocar o pudor dos jovens espanhóis que trabalhavam na piscina. O salva-vidas mirou-me como alguém à beira de me dizer que me vestisse mais decentemente! Por outro lado, os quase adolescentes que serviam refrescos aos hóspedes que, à volta da piscina, constantemente se besuntavam com óleos especiais para bronzearem rapidamente sem causar queimaduras sérias, vinham todos os cinco minutos perguntar-me se queria um refresco, mas o único refresco que me apetecia era o raio do salva-vidas que era uma espécie rara da beleza masculina. Apeteceu-me atirar-me à água e começar a gritar por socorro, mas não ousei!
Depois, a rotina no hotel era sempre toda muito igual. Depois do sumptuoso pequeno almoço no luxuoso restaurante, íamos passar a manhã na piscina para nos bronzearmos rápido, dar uns mergulhos e, sobretudo, eram os meus olhos que mergulhavam nos fatos de banho masculinos muito bem recheados que todo o tempo me passavam pela frente.Chegou a tornar-se numa obsessão! Realmente, para mim, o sexo era algo de imprescindível no meu dia a dia. Pat não me bastava! “Grass is always greener on the other side” e eu andava sempre com vontade de ir pastar a outros prados! Depois do almoço fazíamos longas hispânicas “siestas” e, depois dum banho vestiamo-nos para ir dar uma volta pela cidade. À noite, depois de jantar, um “drink” no Bar e, por vezes, uns passos de dança no “Night-Club” do hotel. Algumas vezes, depois de jantar, uma volta pela cidade para ver Torreolinos “by night” e ver as belezas lá do sítio em busca aventuras fáceis. Eu era uma aventura fácil mas a presença do Pat inesperadamente me pareceu tornar-se num singular travão aos meus assaltos inevitáveis. Durante essas duas semanas nada de carne fresca. Penso que, mesmo sem o ter planeado, ambos decidimos fazer dessas duas semanas a nossa lua de mel. Os únicos hóspedes que se tornaram nossos amigos, foram uma senhora inglesa com as suas duas filhas. Tudo começou na piscina quando essa dama me perguntou onde tinha eu comprado o meu bikini. Quando lhe disse que o tinha feito em casa na véspera da viagem, ela deu uma grande gargalhada e afirmou que eu era “a case”!
Haviam bastantes excursões a serem propostas por toda a parte mas os nossos meios tinham de ser muito bem controlados. Tínhamos de nos lembrar de guardar uns pataco para pagar o comboio de Stanstead até Chalk Farm, quando se acabassem as presumidas farturas! A única extravagância a que nos demos ao luxo de concretizar foi uma viagem de autocarro até Málaga onde passámos um belo dia à descoberta dum pouco do passado histórico da Espanha que, tantos séculos se bateram para expulsarem os portugueses da Península Ibérica! Ao fim e ao cabo, foram umas boas férias que jurámos não serem as últimas!
A outra grande aventura foi um dia passado numa grande propriedade pertencente a um casal de ingleses que recebiam excursões para passarem o dia com eles. Esse dia foi passar a manhã a dar um passeio a cavalo para visitar a grande extensão da propriedade, parando para um grande piquenique à beira-rio. Depois, à sombra duma árvore secular, fizémos uma longa “siesta”. Depois, à noite, depois dum grande mergulho na piscina, a um fulgurante por-de-sol, uma grande “paella” e “sangria” ao ar livre. A noite caída, tivemos um fabuloso espectáculo de “flamenco” feito por um fabuloso grupo de ciganos locais. Que pena não termos uma única foto dessa extrordinária noite tão espanhola!
Quando chegou a data de deixar o nosso quarto antes do meio-dia para apanharmos um autocarro para Málaga onde apanharíamos o nosso avião de regresso a Stanstead, enquanto aguardávamos a chegada do autocarro que nos levaria a Málaga, Pat ficou sentado na Hall do hotel a tomar conta das nossas malas e na conversa com a senhora inglesa e as suas duas filhas. Eu aproveitei para dar mais um mergulho na piscina usando o meu bikini como cuecas. Entrei no vestiário da piscina e pus as minhas coisas num armário e lá fui dar as últimas braçadas dessas nossas primeiras e inesquecíveis férias no estrangeiro. Quando o meu relógio me anunciou que eram horas de me aprontar para a nossa viagem de regresso, voltei ao vestiário, tirei o meu encharcado minúsculo bikini, vesti a camisa e as calças, calcei os meus citadinos sapatos que já tinha palmilhado Londres quase de ponta a ponta, e fui ter com o Pat e a tal senhora inglesa. Torci o bikini e ao chegar à mesa onde eles me esperavam, não sabendo o que fazer do meu bikini todo molhado, coloquei-o no pequeno cinzeiro que se encontrava sobre a mesa. Para meu espanto, a senhora pede desculpa e permissão e agarra no meu bikini e põem-no na sua malinha de mão, explicando-me que o levava com ela para Londres como recordação das férias, e para mostrar à sua outra filha que não tinha vindo, pois que se ela lhe falasse de como ele era diminuto ela nunca a acreditaria, e que só lho mostrando, ela a acreditaria! Quando ouvi a palavra “recordação”, de repente lembrei-me que tinha prometido ao Peter levar-lhe algo de Torremolinos. Entrei em pânico e a única última solução que se me deparou foi roubar esse pequeno cinzeiro do hotel que meti no meu saco à tiracolo, para não chegar à Agência de Viagens com as mãos a abanar e sem nada para meter nas mãos do meu tão desejado Peter, que se consolaria apenas com a minha modesta pessoa!
No outro dia de manhã levantámo-nos muito cedo para apanharmos um comboio que nos levasse até Stanstead Airport, nos arredores de Londres. A viagem de comboio foi monótona e cansativa mas, depois, no avião foi uma alegria. Foi-nos servida uma pequena refeição, coisa que agora já não acontece, agora atiram-nos com um “cachorro” para debaixo dos queixos, como se fôssemos cachorros! As hospedeiras eram lindas e os comissários de bordo um insulto à minha dignidade quando me via ao espelho! Pat mostrava-se um tanto excitado com esta nossa nova aventura. Não era a primeira vez que ele apanhava um avião mas, mesmo assim, era como se o fosse. Chegados ao aeroporto de Málaga tínhamos lá à nossa espera um autocarro que nos levou até ao hotel.
O hotel, tomando em conta o que tínhamos pago, foi a nossa primeira surpresa! Era um hotel de luxo com um serviço impecável! Nós tínhamos reservado com apenas meia-pensão para estarmos livres à noite para irmos jantar fora e conhecer a vida nocturna de Torremolinos. O nosso quarto era muito confortável e tinha uma grande varanda que dava para a piscina. Mal desfizemos as malas, vesti o meu novo bikini e fui estreá-lo na grande piscina. O ambiente da piscina era acolhedor. Haviam muitas famílias com as suas criancinhas aos saltos e aos gritos, jovens casais amorosamente enlaçados, e alguns solitários que não tiravam os olhos do meu reduzido bikini. Pat sugeriu que eu comprasse um fato de banho decente na boutique do hotel, mas preferi provocar o pudor dos jovens espanhóis que trabalhavam na piscina. O salva-vidas mirou-me como alguém à beira de me dizer que me vestisse mais decentemente! Por outro lado, os quase adolescentes que serviam refrescos aos hóspedes que, à volta da piscina, constantemente se besuntavam com óleos especiais para bronzearem rapidamente sem causar queimaduras sérias, vinham todos os cinco minutos perguntar-me se queria um refresco, mas o único refresco que me apetecia era o raio do salva-vidas que era uma espécie rara da beleza masculina. Apeteceu-me atirar-me à água e começar a gritar por socorro, mas não ousei!
Depois, a rotina no hotel era sempre toda muito igual. Depois do sumptuoso pequeno almoço no luxuoso restaurante, íamos passar a manhã na piscina para nos bronzearmos rápido, dar uns mergulhos e, sobretudo, eram os meus olhos que mergulhavam nos fatos de banho masculinos muito bem recheados que todo o tempo me passavam pela frente.Chegou a tornar-se numa obsessão! Realmente, para mim, o sexo era algo de imprescindível no meu dia a dia. Pat não me bastava! “Grass is always greener on the other side” e eu andava sempre com vontade de ir pastar a outros prados! Depois do almoço fazíamos longas hispânicas “siestas” e, depois dum banho vestiamo-nos para ir dar uma volta pela cidade. À noite, depois de jantar, um “drink” no Bar e, por vezes, uns passos de dança no “Night-Club” do hotel. Algumas vezes, depois de jantar, uma volta pela cidade para ver Torreolinos “by night” e ver as belezas lá do sítio em busca aventuras fáceis. Eu era uma aventura fácil mas a presença do Pat inesperadamente me pareceu tornar-se num singular travão aos meus assaltos inevitáveis. Durante essas duas semanas nada de carne fresca. Penso que, mesmo sem o ter planeado, ambos decidimos fazer dessas duas semanas a nossa lua de mel. Os únicos hóspedes que se tornaram nossos amigos, foram uma senhora inglesa com as suas duas filhas. Tudo começou na piscina quando essa dama me perguntou onde tinha eu comprado o meu bikini. Quando lhe disse que o tinha feito em casa na véspera da viagem, ela deu uma grande gargalhada e afirmou que eu era “a case”!
Haviam bastantes excursões a serem propostas por toda a parte mas os nossos meios tinham de ser muito bem controlados. Tínhamos de nos lembrar de guardar uns pataco para pagar o comboio de Stanstead até Chalk Farm, quando se acabassem as presumidas farturas! A única extravagância a que nos demos ao luxo de concretizar foi uma viagem de autocarro até Málaga onde passámos um belo dia à descoberta dum pouco do passado histórico da Espanha que, tantos séculos se bateram para expulsarem os portugueses da Península Ibérica! Ao fim e ao cabo, foram umas boas férias que jurámos não serem as últimas!
A outra grande aventura foi um dia passado numa grande propriedade pertencente a um casal de ingleses que recebiam excursões para passarem o dia com eles. Esse dia foi passar a manhã a dar um passeio a cavalo para visitar a grande extensão da propriedade, parando para um grande piquenique à beira-rio. Depois, à sombra duma árvore secular, fizémos uma longa “siesta”. Depois, à noite, depois dum grande mergulho na piscina, a um fulgurante por-de-sol, uma grande “paella” e “sangria” ao ar livre. A noite caída, tivemos um fabuloso espectáculo de “flamenco” feito por um fabuloso grupo de ciganos locais. Que pena não termos uma única foto dessa extrordinária noite tão espanhola!
Quando chegou a data de deixar o nosso quarto antes do meio-dia para apanharmos um autocarro para Málaga onde apanharíamos o nosso avião de regresso a Stanstead, enquanto aguardávamos a chegada do autocarro que nos levaria a Málaga, Pat ficou sentado na Hall do hotel a tomar conta das nossas malas e na conversa com a senhora inglesa e as suas duas filhas. Eu aproveitei para dar mais um mergulho na piscina usando o meu bikini como cuecas. Entrei no vestiário da piscina e pus as minhas coisas num armário e lá fui dar as últimas braçadas dessas nossas primeiras e inesquecíveis férias no estrangeiro. Quando o meu relógio me anunciou que eram horas de me aprontar para a nossa viagem de regresso, voltei ao vestiário, tirei o meu encharcado minúsculo bikini, vesti a camisa e as calças, calcei os meus citadinos sapatos que já tinha palmilhado Londres quase de ponta a ponta, e fui ter com o Pat e a tal senhora inglesa. Torci o bikini e ao chegar à mesa onde eles me esperavam, não sabendo o que fazer do meu bikini todo molhado, coloquei-o no pequeno cinzeiro que se encontrava sobre a mesa. Para meu espanto, a senhora pede desculpa e permissão e agarra no meu bikini e põem-no na sua malinha de mão, explicando-me que o levava com ela para Londres como recordação das férias, e para mostrar à sua outra filha que não tinha vindo, pois que se ela lhe falasse de como ele era diminuto ela nunca a acreditaria, e que só lho mostrando, ela a acreditaria! Quando ouvi a palavra “recordação”, de repente lembrei-me que tinha prometido ao Peter levar-lhe algo de Torremolinos. Entrei em pânico e a única última solução que se me deparou foi roubar esse pequeno cinzeiro do hotel que meti no meu saco à tiracolo, para não chegar à Agência de Viagens com as mãos a abanar e sem nada para meter nas mãos do meu tão desejado Peter, que se consolaria apenas com a minha modesta pessoa!
Torremolinos Aguardava-nos
Depois de mais alguns meses cheios de peripécias, lá chegámos à conclusão que era tempo que o Pat visse algo mais do que Devon e Cornwall. Assim, um dia, à hora do almoço, como havia ali muito perto da B.B.C., onde o Pat trablhava, uma Agência de Viagens, parámos a ver aquela montra cheia de sedutoras propostas. Ainda era mais difícil escolher aonde ir do que num restaurante o que havíamos de encomendar. Decidimos entrar e indagar como eram os preços de todas aquelas fugas ao nevoeiro londrino. Chegámo-nos ao balcão onde um jovem ainda mais belo do que todos aqueles luminosos cartazes a lembrarem-nos quanto mais bela a vida era sob um céu azul onde, lá em cima, o sol resplandecia! Sendo Pat muito tímido, era sempre eu quem passava ao ataque! Aquele sorriso ali por detrás do balcão fez-me esquecer todos os cartazes que me tinham incendiado aquela ânsia de apanhar sol que quase lhe perguntei quanto me custaria um fim de semana com ele, onde ele muito bem entendesse. Ele certamente se apercebeu da minha fome do seu franzino corpo, daquele doce mel a escorrer-lhe daquela boca a escaldar de promíscuas promessas, pois que numa voz a transbordar de carícias, apresentou-se:
- I am Peter! Can I help you?
Maliciosamene respondi-lhe:
- At this very moment nobody could help me better than you!
Ele enviou-me um sorriso muito consentidor a sugerir-me que todos os meus desejos podiam ser satisfeitos.
Falei-lhe da nossa vontade de ir passar duas semanas de férias, algures, ao sol. Mas, por favor, não demasiado dispendioso! Ele respondeu-me que o mais barato seria Espanha, pois que era o mais próximo de Inglaterra. Apontou-me um cartaz de Torremolinos como sendo muito bonito e o mais acessível. Conservando um olho sobre o cartaz e o outro sobre aquele divino sorriso, perguntei-lhe quanto? Não recordo qual o custo, mas aceitei pois que estava ao nível das nossas economias. Ele pegou no telefone e tratou das reservações. Depois produziu dois bilhetes ida e volta que me empurrou na direcção dos meus irrequietos dedos sobre o balcão, invadindo-me os olhos com os seus belos olhos cheios de nítidas escaldantes promessas. Paguei e, antes de sair, agradeci-lhe a atenção, e perguntei-lhe:
- Would you like me to bring you a nice “souvenir” from Torremolinos?
A sua resposta foi a mais inesperada e ao mesmo tempo a mais apetecida:
- Just bring me yourself back!
Saí dessa agência mais leve do que uma pluma esvoaçando pelo espaço! Eu desejava ainda mais aquele seu pequeno corpo todo entregue nos meus braços e aqueles seus grossos e rubros lábios que tanta vontade me davam de os morder, do que ir de férias a Torremolinos!
Ao sairmos, Pat sorriu-me discretamente dando-me a entender que ele tinha compreendido o que já pairava no ar, e que estava pelos ajustes!
lundi 16 novembre 2009
As Nossas Primeiríssimas Viagens
A vida continuava a avançar docemente para não chegar depressa demais fosse lá onde fosse que ela teria de chegar! Era o trabalho na Foyles com as minhas longas conversas com o responsável do “Foreign-Departmennt”, em Hebraico, que era um grande prazer para ambos. Ele queria que eu fosse trabalhar com ele sob as suas ordens, mas Christopher Foyle julgou-me muito mais útil como telefonista, pelo facto de eu falar muitas línguas. Quando lhe pedi transferência para o “Foreign-Department”, a sua resposta foi aumentar-me o ordenado e promover-me a “responsável” do P.B.X.! Aceitei, pois que realmente muito gostava de trabalhar ao lado da minha querida colega, a Suzanne, a minha bela dinamarquesa! Claro que também teria gostado de ter sido transferido para o “Foreig-Department” onde, estou certo, veria caras e não apenas escutar “vozes”, como acontecera com a Joana d’Arc! Haviam outras razões! Gostava de ir almoçar com o Pat todos os dias úteis no Self-Service do Woolworth’s, onde muitas vezes a Hella nos vinha fazer companhia. Por outro lado queria deixar de novo crescer o cabelo e vestir as minhas “hipsters” e ser seguido na Oxford Street por jovens cujos olhos não sofriam de fastio! Por vezes ia até à Carnaby Street ver as montras e seduzir algum distraído que quisesse entrar ali num certo vão de escada onde procurávamos acelerar a digestão.
Os fins de semana eram quase todos passados em Chalk Farm tomando banhos de sol no Primrose Hill Park, quando o Astro-Rei não nos virava as costas; fazer a limpeza do nosso pequeno ninho de amores e, de vez em quando, irmos passá-los a Braintree com os pais do Pat. Eu gostava bastante de Braintree e do pai do Pat que parecia ter-me adoptado como um outro filho. Ele era o único. O resto da família faziam-me sentir um tanto afastado, como se eu fosse apenas um intruso. Um “bloody foreigner”, como uma vez o escutei vindo da boca da mãe que julgara poder reter o seu Pat sempre a seu lado, pois que tinha certamente percebido que ele, como não andava com raparigas, nunca lhe seria roubado por uma nora, coisa que ela, como possessiva mãe que era, evitava demasiados contactos. Não como a minha mãe que, um dia, quando fomos a Portugal pela primeira vez e o apresentei à minha, ela, pondo-lhe uma mão sobre o ombro, ternamente lhe disse: “Deus deu-me mais um filho”!
Gostávamos muito de ir passear pelo parque, pois que havia muita gente que por lá andava, entre eles, muito rapaz novo que, mal havia um raio de sol, exibiam as suas belas pálidas coxas. O outro luxo desses domingos no parque eram os fatais “fish and chips” embrulhados num jornal para saborearmos sentados num banco ou à sombra duma verdejante pequena árvore oscilando à brisa. Eram nesses momentos que fazíamos planos de futuro. Falávamos de viagens que gostaríamos de fazer. A primeira viagem que fizemos ao estrangeiro foi precisamente Portugal! Pat adorou o país e o seu céu azul e sol derramando-se sobre as nossas faces, enchendo tudo de luz, coisa que em Londres era bastante raro. Nesses tempos uma das características de Londres era ainda o famoso nevoeiro que não nos deixava ler os nomes das ruas quando procurávamos uma morada qualquer! Haviam também as idas aos Pubs. Começámos a ir à pesca a um Pub em Camden Town e outro em Hampstead, onde os “peixinhos” eram mais frescos e saltitantes. Muitas vezes éramos dois quando saíamos de casa, e três quando voltávamos. Ambos tínhamos compreendido que a vida era curta e que devíamos aproveitá-la o mais e o melhor que se podia!
Certo dia alugámos um carro e fomos descobrir um pouco dessa bela Inglaterra sempre verdejante o ano todo. O Pat conduzia muito bem porque tinha tirado a carta com muitos “valores”, e o seu grande sonho era ter um carro que o esperasse lá em baixo em frente da nossa porta. Uma vez pedimos à irmã do Pat que nos emprestasse a sua tenda e fomos por aí fora descobrir Devon e Cornwall. Algures em Cornwall, armámos a nossa tenda numa bela clareira onde, depois de ter feito algumas compras, improvisei uma pequena refeição utilizando um pequeno fogareiro a gás e, depois de termos arrotado umas tantas vezes, fechámos a tenda e fomos - depois de uns momentos de intimidade - dormir! Pat estava cansado de conduzir o dia todo e eu estafado de interferir com a condução dele, sugerindo onde irmos, seguindo as instruções do meu grande mapa. Ao meio da noite fomos acordados por um violento vendaval que nos levou a tenda pelos ares. Apanhámos um grande susto mas sobrevivemos. Quando devolvemos a tenda à irmã do Pat, compreendemos que com o clima inglês não era mesmo nada fácil andar de tenda às costas. Nesse dia decidimos que as próximas férias seriam no estrangeiro, algures onde o sol e a calmaria imperassem!
Livros, leitura e coisas mais...
E a vida lá continuava sem grandes incidentes no nosso pacato ninho de amor! O Pat gostava muito de ler e eu procurava fazê-lo ler livros que o instruíssem, não apenas entreter. Para não gastar dinheiro com a compra de livros nas caras livrarias lá do sítio, comecei a ir regularmente à Biblioteca local - a dois passos - procurar livros para trazer para casa, para ambos lermos. Uma tarde, estava eu muito ocupado a passar os dedos pelas lombadas dos livros enfileirados nas estantes, em busca dum título ou dum autor que me inspirasse quando, repentinamente, senti uma estranha sensação na minha nuca. Era um misto de carícia e facada. Virei-me bruscamente e dei com um belo par de olhos muito negros que me despiam descaradamente. Olhei-o com uma certa firmeza e pensei: se queres cama aproxima-te! Eu também ando com ganas de cama fresca! Pareceu-me que ele era receptivo à telepatia, pois que imediatamente se aproximou e perguntou-me se eu gostava de Pitigrilli, apontando-me um dos livros desse autor italiano. Recomendei-lhe o livro que ele apertava entre ambas as suas longas brancas mãos, dizendo-lhe que já tinha lido e que era um bom livro e um bom autor! Ele era um belo exemplar do homem alto, moreno, e simpático. Ele, sempre devorando-me com os olhos, sussurrou-me que morava ali mesmo em frente, se eu queria subir com ele para uma bebida. Como já andava com saudades de pecar, aceitei o convite. Atravessámos a rua. Ele abre a porta da sua escada e mal entrámos e a porta se se fechou sobre as nossas costas ele salta-me em cima ali mesmo no patamar e come-me a boca. Subimos ao primeiro andar onde ele morava e, mal a porta foi trancada, pegou-me ao colo, como se tivéssemos acabado de nos casar, e docemente me depos sobre a sua larga cama que parecia ter-se aberto para nos receber sem perda de tempo. Despimos as nossas armaduras, pegámos nas nossas armas, e guerreámos a tarde toda. Quando cheguei a casa o Pat fez-me apenas uma pergunta:
- The book you bring me, did you write it yourself? It took you a long time!
Nessa noite não havia jantar porque não tinha tido tempo de fazer as minhas compras. Assim, como assiduamente fazíamos, fomos à Regents Park Road, entrámos na loja do “fish and chips”, comprámos duas doses embrulhadas em jornais, e fomos sentarmo-nos num banco do Primrose Hill Park, naquele ali logo à entrada, e regalámo-nos, como habitualmente, com os nossos sempre deliciosos “fish and chips”!
As minhas visitas a esse meu novo vizinho e amante, que era sul-africano, começaram a ser obrigatórias cada vez que eu ia devolver ou buscar novos livros à Biblioteca. Uma dessas vezes ele não estava só. Estava com ele amigo dele francês que tinha vindo de Paris passar uns dias com ele. Nessa tarde a guerra foi renhida! A cama parecia demasiado pequena para tanta labuta! Insinuaram-me, fizeram-me compreender, que estavam ambos interessados numa dupla penetração, sendo eu o condenado. Respondi que não, nem com anestesia local! Quem acabou por ceder foi o lúbrico francês. Gostei da experiência. Era algo de novo que nunca tinha tentado!
O Pat começou a desconfiar das minhas longas ausências e eu, como sempre, muito assumido, sugeri que, se ele quisesse, poderíamos um dia fazer umas viagens de ida e volta a quatro. Ele não pareceu opor-se e, assim, uma tarde, convidei-os ambos a tomar um chá e eles aceitaram. Chegaram com uns bolinhos e depois do chá fomos todos para a cama. Despimo-nos todos e galagámos em cima da nossa cama, que parecia pequena demais para tanto trânsito. Era evidente que o francês, a sua especialidade era a dupla penetração e quando vi que o programa deles era utilizar o Pat como bode espiatório, agarrei nas roupas deles, abri a porta da escada e atirei com tudo para o patamar da escada e expulsei-os ambos todos nus!
Não sei o que realmente se passou depois, mas presumo que eles se vestiram e regressaram a casa deles. O Pat e eu fizemos como se nada se tivesse realmente passado e a vida continuou. Nunca mais vi o meu delicioso sul-africano, com o qual, certamente, poderie ter aprendido mais algumas laboriosas técnicas do Kama Sutra!
Mrs. Murray enchapelada
Realmente foi uma prenda do céu aquele emprego no Foyles! O P.B.X. já sabia como o utilizar e, ainda por cima, tinha, sentada a meu lado, uma bonita assistente dinamarquesa que era um prazer tê-la ali meu lado mostrando os seus belos joelhos! Ela era uma rapariga bastante culta e imediatamente simpatizámos um como outro. Nós falávamos o Inglês e assim começámos a nos descobrir por dentro. Como os fins de semana eram feitos por dois outros telefonistas nós tínhamos os fins de semana e frequentemente ela os vinha passar connosco a Chalk Farm para se sentir menos só. Levámo-la uma manhã ao Zoo, o que ela apreciou. O que ela mais aprciava, além da nossa copanhia, eram os meus cozinhados, acepipes para ela uma grande novidade, pois que nunca visitara Portugal nem nunca tinha ido a um restaurante português. Tornámo-nos grandes amigos e no dia em que deixei a Foyles ela verteu uma pequena lágrima!
O nosso pequeno apartamente começou também a ser visitado pelos nossos vizinhos. Nós estávamos no primeiro-andar e Mrs. Palozzi vivia no rés-do-chão e amiudadamente me pedia para eu lhe ensinar a preparar pratos portugueses. Ela tinha um enorme cão já muito velho e quando esse cão morreu ela chorou o dia todo lá em baixo, e eu cá em cima! No segundo andar morava a Mrs. Murray e seu marido. Eles eram ambos reformados e muitas vezes nos convidavam para jantar com eles. Nunca esquecerei aquela noite quando subimos para jantar e todos os quatro nos sentámos à volta da mesa da cozinha onde haviam talheres para quatro pares de maxilares. Para nossa surpresa, ela começou a trazer-nos os pratos já bem atulhados que punha sob os nossos queixos. Nós pegámos nos garfos e nas facas e atacámos. Só Mr. Murray não tinha sido servido. Quando ele perguntou onde estava o seu prato, Mrs. Murray respondeu-lhe que o prato dele estava ao pé dos seus dentes! Mrs. Murray queria que ele tivesse a sua dentadura permanentemente na boca e ele só a usava para comer. Ela queria que, ao menos, ele a pusesse quando tinham visitas. Ela estava furiosa! Ele insistiu, que queria o seu prato mas o seu prato estava ao pé dos seus dentes que aparentemente passavam os dias e as noites num copo de água na casa de banho. Subi à casa de banho e o seu prato lá estava perto do copo no qual os seus dentes me sorriam! Nessa noite quem serviu o jantar ao Mr. Murray fui eu, divertidíssimo com a birra da Mrs. Murray!
Mrs. Murray era uma mulher cheia de vida e gostava de sair à noite. Ir ao cinema, ir dançar. Ela gostava muito de dançar, mas como não frequentava clubes limitava-se a ir às festas da igreja ali perto onde ela ia à missa todos os domingos de manhã. Sempre que havia um baile lá na igreja, ela, como não gostava de sair sozinha, vinha-nos convidar para um pé de dança. Pat adorava e aceitava sempre. Eu aceitei apenas algumas vezes. Mas agora recordo com muita saudade essas idas ao baile com a nossa querida Mrs.Murray! Mr. Murray nunca ia connosco. Preferia ficar perto dos seus dentes!
Recordo o dia quando deixei Chalk Farm, ela lá estava à sua janela, no seu segundo andar, para me acenar boa viagem. Depois disso ainda a vimos algumas vezes em casa do seu filho, para onde se tinha mudado quando Mr. Murray deixou para sempre os seus dentes num copo, numa casa de banho em Chal Farm.
Anos passaram e, um dia, recebemos uma carta do seu filho com apenas uma uma curta frase: “Mother joined father”!
dimanche 15 novembre 2009
Foyles Book-Shop
Tudo voltou ao normal quando um dia fui à Foyles Book-Shop tentar encontrar discos da Amália. Ao empurrar a porta de entrada li um pequeno cartaz pedindo “telefonista mutilingue”! Esqueci os discos da Amália e indaguei com quem falar acerca desse posto. Enviaram-me ao quarto andar e pedir para falar com Mr. Rush. Mr. Rush não se encontrava e dirigiram-me até ao escritório do patrão. Mr. Foyle, um jovem extraordinariamente belo, pediu-me para me sentar e pediu-me para prestar provas linguísticas. Ele precisava de bom Inglês – sendo eu um estrangeiro – bom Francês e, se possível, um pouco de Espanhol. Quando ele ouviu o meu Inglês ficou encantado! O meu Espanhol, depois de o ter aprendido com a Anita, em Beit Hashitá, foi também logo aprovado. Depois, pediu-me, no seu pobre Francês, para eu dizer umas frases nessa língua. Logo a seguir à minha tentativa num Francês muito improvisado, anuiu com a cabeça, dizendo, com um sotaque fortemente britânico: “merrci bian”! O que mais o surpreendeu foi quando lhe disse que eu também falava Português e Hebraico. Assim como um pouco de Italiano e Alemão. Aí, abriu a sua gaveta, sacou uma folha de papel e redigiu um curto contrato que me fez assinar. Antes de assinar li o contrato. Constava de horários das 9 às 13 e das 14 às 18 horas. De segunda a sexta-feira. Óptimo! Assim eu podia guardar as limpezas em Holborno, assim como Mr Marx! Depois, quando vi o ordenado, pensei comigo mesmo: Que se lixe Holborn e Mr. Marx! E assinei!
Então Chistopher Foyle diz-me que teria primeiro de aprender a trabalhar com o “switchboard” (P.B.X.)! Quando lhe disse que eu tinha trabalhado no Hod Hotel em Israel como telfonista ele ficou pasmado! Informou-me que o seu chefe do “Foreign-Department”, onde vendiam livros em todas as línguas, também era israelita, e que ficaria muito contente de ter alguém com quem falar Hebraico!
Desci e fui à procura do Pat que tinha lá ficado em baixo à procura dos discos da Amália. Quando ele me estendeu dois discos dela, dizendo-me:
- How lucky! I found two records of Amália that we did not have yet!
(Que sorte! Encontrei dois discos da Amália que nós ainda não tínhamos!)
A minha resposta, dando-lhe um abraço muito apertado, procurando não quebrar esses dois preciosos discos, foi:
- How lucky we are! I found a job paid as well as your own!
(Que sorte tivémos! Encontrei um trabalho tão bem pago como o teu!)
Deixei a agência de limpezas, o Mr. Marx, assim como Holborn! A vida recomeçava a sorrir-nos de novo! Desde esse dia e até que deixasse a Inglaterra para seguir o meu destino de Judeu Errante, vivemos como reizinhos sem trono, sem ceptro, mas com muitas coroas!
Limpar casas de porta em porta
Durante semanas andei à procura de trabalho mas esbarrava sempre com portas fechadas. Finalmente, pensando que talvez fosse por causa dos meus cabelos até aos ombros, decidi ir a um cabeleireiro e pedi um corte tradicional. Mas, aparentemente, não eram os meus cabelos longos que me impediam de encontrar emprego, era, presumo agora, uma talvez passageira crise de desemprego nessa indústria. Como o meu diploma era para hotelaria e não tinham quaisquer outras qualificações e o ordenado do Pat não chegava para pagar todas as despesas da casa, uma noite, quando a Berta veio, como era habitual, deixar o Papuzinho em nossa casa quando eles saíam à noite, eu queixei-me e ela informou-me que a empresa onde ela trabalhava, a tal em Holborn, procuravam alguém para todos os dias, depois das seis da tarde, quando os escritórios fechavam, para fazer a limpeza de todos os escritórios espalhados pelos três andares do edifício. Aceitei essa proposta e o Pat costumava, quando deixava a B.B.C. a essa mesma hora, vinha até Holborn dar-me uma ajuda. O trabalho consistia em despejar os cestos dos papéis, limpar o pó e passar o aspirador do terceiro andar até chegarmos ao rés-de-chão. Depois apanhávamos o Tube e regressávamos a casa, onde eu tinha que improvisar um pequeno jantar fossem lá quais fossem os restos da véspera.
Para angariar mais umas patacas para aguentar a situação mais ou menos de pé, um dia, vendo um anúcio no jornal pedindo “cleaners” para uma agência de limpezas em Hampstead, dei lá um salto e fui logo contratado. O meu primeiro trabalho foi em Golders Green em casa duma família judaica que tanto gostou do meu trabalho que me recomendaram a todos os seus amigos e vizinhos e, assim, graças ao meu amor a Israel, fui adoptado por todos e até comecei a ensinar Hebraico um dos filhos duma dessas famílias. O miúdo tinha aí uns seis anos e aprendia com uma facilidade surpreendente! Porém, como não eram eles que me pagavam, tinha de ir à agência receber o meu ordenado todos os sábados de manhã, pois que eu era pago semanalmente pela agência. Uma dessas vezes o proprietário, olhando-me fixamente nos olhos, disse-me que era um desperdício eu, com as minhas capacidades, andar a fazer limpeza em casa de quem calhava, e propos-me eu tomar conta da agência, pois que ele ia abrir uma outra e que não podia estar em ambas ao memo tempo. Assim eu deitei fora os meus baldes e esfregões e, sentado por detrás daquela grande secretária, um telefone, fichas, um livro de apontamentos, uma lista telefónica dos clientes, e uma pesada caneta, organizei o trabalho todo nessa agência, respondendo ao telefone daqueles que procuravam uma mulher a dias, assim como contratar novas empregadas para fazerem esse trabalho e, assim, eu satisfazia as necessidades do patrão, dos clientes, e dos trabalhadores.
Ao lado dessa agência havia uma outra. O seu proprietário procurou roubar-me ao seu concorrente e vizinho, mas eu recusei. Mas como ele era um bonitão e me fazia olhinhos, prestei-lhe outro tipo de serviços que ele parecia muito apreciar, pois que todos dias fechávamos entre o meio-dia e as duas da tarde, o que aproveitávamos para uma “limpeza geral” no seu quartinho da retaguarda e depois íamos almoçar a um pequeno restaurante ali na mesma rua. A nossa situação financeira melhorou um pouco mas, mesmo assim, precisávamos de mais uns “English-Pounds” para as nossas farras comprar de vez em quando roupa nova, aceiteitámos a proposta de um dos nossos clientes em Hampstead que queria alguém que fizesse uma limpza geral no seu vasto apartamento aos domingos, pois que durante a semana eles não estavam em casa, pois que ele e sua esposa ambos trabalhavam numa pequena empresa que eles dirigiam. Quando lhe apareço lá em casa pela primeira vez com o Pat - dois pelo preço de um - ele ficou contentíssimo com o bom negócia que tinha feito! Ele, o Mr. Marx, e sua esposa eram encantadores. Todos os domingos começávamos às nove da manhã e enquanto nós trabalhávamos a Mrs. Marx – uma doçura de pessoa – fazia o almoço e ao meio-dia sentávamo-nos os quatro à volta da mesa da cozinha e deliciavamo-nos todos com os saborosos petiscos de Mrs. Marx. Foram uns tempos duros mas simpáticos, que a despeito de tudo, nos deixaram saudades!
O Edward Hotel - Uma solução?
O Edward Hotel era um relativamente pequeno hotel mas muito agradável e bem decorado. Era mais um hotel para turistas menos afortunados que não podiam pagar as altas tarifas dos Hiltons. Era um hotel muito familial e situado numa muito calma rua de Paddington. Porem não tive muito tempo de estar perto do Johnny! Como eu andava sempre a falar de Israel e dos belos tempos que lá vivera, dos amigos que lá deixara, foi o fim da macacada! Os proprietários do hotel eram anti-semitas ferrenhos e tomara-me por Judeu e fizeram-me a vida tão insuportável que eu um dia disse-lhes na cara o que eu pensava deles! Que eu não era Judeu, e que se o fosse estaria então a viver em Israel! Que tinha deixado Israel depois de dois julgamentos por estar ilegal por não ser Judeu! Informação que eles aproveitaram para me fazerem compreender as razões pelas quais eles detestavam os Judeus. Que eram uma raça espalhada pelo mundo inteiro, monopolizando todo o comércio, que era um povo habituado a viverem em guetos, que não se queriam misturar com outras religiões, que até, mesmo em paises que não eram os deles, exigiam cemitérios à parte para, mesmo mortos, não se misturarem com outras raças e culturas! Mas o mal estava feito! Eu tinha-lhes dito na cara o que eu pensava dos racismos, fossem lá eles quais fossem! Nem eu os infestei com as minhas idéias nem eles me infestaram com as suas. Parti sem um adeus! Foram uns dias de tortura para mim, que acabaram tristemente. Nem sequer fui pago por esses dias que lá trabalhei! Uma espécie de repugnância pela humanidade de mim se apoderou!
Continuo à procura duma saída! Em Israel não posso estabelecer-me por não ser Judeu, e noutros países não me dão trabalho por pensarem que eu o sou! Beco sem saída!? Não! Um dia, depois de mortos, vamos estar todos juntos! Espero não haverem no Paraiso segregações! Mortos, num caixão, somos todos iguais uns aos outrs! Temos todos os olhos fechados, as mãos enlaçadas sobre o peito e, sobretudo, totalmente indiferentes a todos esses absurdos fanatismos que infestam e sempre infestaram este mundo!
Hilton após Hilton
Mrs. Sellar organizou um pequeno e muito discreto copo de despedida, entregando-me uma carta de boas referências do Mr. Wood, desejando-me muita sorte para o meu futuro profissional e sobretudo, uma frase que muito me tocou:
- I shall miss you!
Comecei as minhas noites no Hilton logo no dia seguinte. Pat teria preferido que eu continuasse a trabalhar de dia, pois que dormir sozinho e ao voltar da B.B.C., por volta das seis e meia, eu ainda estava a dormir e que, depois, a minha presença era apenas o jantar e quase logo a seguir sofrer as minhas malfadadas noites no Hilton.
Essas noites foram-me muito difíceis por muitas razões! Antes de mais nada, saber o Pat sozinho, sem mim para me sentar a seu lado para ver um filme na televisão, um salto ao Pub, e outros pequenos hábitos que tínhamos criado. Depois, o trabalho de “night-auditor” nunca me tinha agradado! Sempre me desagradaram essas funções de, sozinho nos bastidores duma recepção, sem ver ninguém, ter de fazer as contas diárias de centenas e centenas de hóspedos cujas caras nunca lhes tinha posto os olhos em cima! O grande prazer de trabalhar de dia numa recepção era ver gente, dispensar os meus serviços a pessoas que normalmente me apreciavam. Muitas vezes hóspedes que de regresso a suas casas por esse mundo fora me enviavam uma carta a agradecer as minhas atenções e a oferecerem-me as suas casas e préstimos! Como “night-auditor” eu sentia-me como se fosse apenas um fantasma com os pés agrilhoados, a cumprir um castigo!
Um dia voltei a falar com o chefe do pessoal e queixei-me das minhas agruras. Que me tinha “casado” recentemente e que precisava de continuar a garantir as minhas obrigações maritais. Esta minha preocupação pareceu tocar-lhe bem fundo do humanismo que dele se desprendia e logo me prometeu tentar resolver o meu problema. Dias depois ele convocou-me ao seu escritório e estendeu-me um outro contrato para eu assinar. Era para recepcionista de dia num outro Hilton. O Hilton em Lacaster Gate, ali a Paddington! Fiquei radiante! Não só poderia recomeçar a fazer uma vida normal com o Pat, como também ficava ali tão perto do Johnny. Quem sabe?
O trabalho no Lancaster Gate foi uma solução temporária, pois que quase imediatamente novamente recebi ordens de cortar o cabelo! Quanto a mim era um absurdo! Todos os homens andavam de cabelos pelos ombros, não percebia porque razão um recepcionista não teria direito de andar à moda! Não tive tempo de fazer amizades ou fabricar recordações. Como, ali não muito longe, havia um pequeno hotel com menos importância do que o Berners e os Hiltons, um dia entrei nesse hotel e pedi trabalho. Fui logo aceite! Perguntei se tinha de cortar o cabelo? A resposta foi imediata e salvadora:
- No problem at all!
Modas e suas consequências
O tempo foi passando. No Berners tudo se passava pelo melhor. Miss Pollack tinha finalmente aceite a presença dum homem na sua recepção. Isto até ao dia em que a moda dos homens deixarem crescer os cabelos até aos ombros me agarrou! Moda muito ambígua! Nas ruas de Londres já era difícil saber quem era quem! As mulheres começaram a usar “hipsters” e cabelos até ao meio das costas, e os homens idem! Quando caminhávamos num dos passeios da Oxford Street e na nossa frente se deparava um belo traseiro, nunca se sabia se essa dádiva divina pertencia a um homem ou a uma mulher! Mesmo assim, posso garantir que não foi nessa época em Londres que foi descoberta a bissexualidade. Isso já vinha dos tempos da Idade da Pedra! Uma coisa era certa! Ficava-me bem e todas as minhas colegas invejavam o meu penteado, mas Miss Pollack exigiu que eu cortasse o cabelo à homem, como ela se pronunciou! Recusei! Dias mais tarde fui chamado ao escritório do Mr. Wood, onde ele me aguardava na companhia de Mrs. Sellar. Ele também me deu ordem definitiva de cortar o cabelo. Mrs. Sellar foi a única que me defendeu, dizendo que era a moda e que me ficava muito bem, que não via nisso nenhum mal. Que não seria os meus longos cabelos que me impediriam de fazer o meu trabalho com a mesma eficácia e que até os hóspedes gabavam o meu visual. Eu, com o apoio de Mrs. Sellar, recusei e, dias mais tarde tinha uma carta do Mr. Wood dispensando os meus serviços! Essa carta arrasou-me! Eu gostava de trabalhar no Berners, dava-me bem com todos os meus colegas, e adorava as minhas refeições no restaurante dos hóspedes, na doce companhia da minha querida Hella! Hella aconselhou-me a cortar o cabelo para continuarmos juntos, que ser minha visinha não chegava, que queria continuar a ser minha colega! Respondi à Hella que quem mandava na minha vida e nos meus penteados era eu, mais ninguém! Assim, comecei a por os pés a caminho em busca de outro emprego. O primeiro hotel a cuja porta bati, foi o Hyde Park Hilton, ali a dois passos. Quando lá entrei e me dirigi à recepção a indagar como poderia eu falar com o chefe do pessoal, fiquei surpreendidíssimo! O recepcionista que encontrei por detrás do balcão foi um rapaz que tinha tirado o curso comigo no Tadmor Hotel em Herzelia. Ele apresentou-me o dito responsável que, depois de lhe ter mostrado o meu diploma, sem exitação, ofereceu-me trabalho como “night-auditor”! Esse trabalho não me aprazia porque detestava fazer as noites e o trabalho nele envolvido. Sobretudo evitava fazer as noites porque tinha muito poucos contactos com os hóspedos, o que, a meu ver, era uma das grands vantagens de trabalhar numa recpção: conhecer gente! E mais importanto ainda, queria dormir na minha cama com o homem que se tinha instalado na minha vida!
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