mardi 11 août 2009

A VELHA CASA EM VALE DE LOBOS

No Hotel Vale de Lobos foi outra grande e agradável surpresa! O Hotel era um encanto! Acabadinho de ser construído mas respeitando a arquitectura local, era como um palácio de Fadas de Walt Disney!

Fiquei igualmente encantado com a recepcionista, uma jovem escandinava que falava um Português perfeito! Ela, como escandinava, imediatamente se apercebeu quem eu realmente era. Com ela podia assumir-me sem qualquer pudor! Ela parecia até apreciar-me ainda mais por esse facto. Foi ela que começou a ensinar-me umas palavras de Inglês pois que o hotel era frequentado apenas por estrangeiros e todos eles era a língua que eles utilizavam.

O único inconveniente é que eles não me podiam dar quarto no hotel e alugaram-me um quarto numa velha casa onde vivia um velho casal de camponeses que alugavam o quarto do seu único filho, quando ele decidiu imigrar para a Alemanha. Eles eram um casal muito arraigado às velhas tradições. Tinham uma grande lareira na cozinha onde eles preparavam as suas comezainas. Eram duma simplicidade tal que até pareciam acabados de sair das páginas dum livro de Júlio Dinis. O problema era que era bastante longe do hotel e que eu tinha de vir a pé todas as noites, altas horas, através dos pinhais e isso assustava-me bastante, pois que se falava de roubos e agressões acontecidas nesse percurso recentemente. Mas tive de fazer das tripas coração e aguentar a tarefa e levar a água ao meu moínho!

O trabalho em si não era como no Hotel Turismo, que trabalhava apenas oito horas por dia. Neste novo hotel pagavam-me ordenado, o quarto fora de portas e, como então se dizia:

"Cama, mesa, e roupa lavada"!

Tinha de pegar no meu trabalho às sete da manhã e só regressava a casa por volta das duas da manhã, pois que eu fazia os pequenos almoços dos hóspedes no restaurante e, logo a seguir, tomava conta da piscina. Isto apenas servir bebidas e petiscos aos banhistas. O resto da manutenção dessa piscina estava a cargo dum bonito rapazão lá do sítio que sabia nadar e fazia também de salva-vidas. Ele era o João, um bonito jovem camponês muito simples e delicado com todos, mas que não tinha culpa nenhuma de ter um corpo soberbo. Coisa que eu já não via há meses. Eu não tinha tocado num homem há eternidades! Pensei que sendo um simples camponês não teria a mínima oportunidade de o seduzir.

Erro monumental!

Quando ele, dentro do seu minúsculo fato de banho preto me olhava insidiosamente, ao mesmo tempo amassava o seu enchumaço, em segundos tinha uma erecção que lhe chegava aos cordelinhos que o cingiam à volta da cintura! O problema foi que ele era daqueles tipos de gente simples que não estavam nada ao corrente de certas preliminares. Ia direitinho ao assunto. Era pão-pão, queijo-queijo! Era só meter e tirar!

Depois das manhãs na piscina eu ia direitinho à cantina do pessoal encher a pança. Regalar-me com comidas a que não estava mesmo nada acostumado, pois que comíamos a mesma comida que os hóspedes. De seguida, lavar as mãos e os dentes, e ir a correr para o faustoso restaurante dos clientes e começar a servir a estrangeirada. As mesas já tinham sido postas pelo pessoal da cozinha. Via-me aflito para compreender os esfomeados mas, com a ajuda da Melika, a recepcionista escandinava, ia devagarinho aprendendo umas coisas de Inglês. A outra grande vantagem era que não haviam ementas a propor ao cliente. O menu estava escarrapachado na parede à entrada do “dining room”, ao qual ninguém prestava qualquer atenção. Depois de bem acomodados nas suas cadeiras, penduravam o guardanapo ao pescoço e papavam o que lhes punham à frente. Normalmente era a entrada, que eles escolhiam à vontade - “self-service” – e só depois é que servíamos primeiro a sopa do dia, depois o prato de peixe, a seguir prato de carne. Depois eram os queijos e sobremesas, mas aí eles tinham de levantar o rabinho da cadeira e servirem-se segundo os seus apetites. Finalmente era o café! O café, éramos nós que servíamos! Para mim tudo isso, foram grandes novidades. Nunca tinha visto em parte alguma, as pessoas servirem-se por si próprias! A outra grande novidade foi aquele balão de vidro onde se fazia o café. Nada a ver com os hábitos do Café Estrela com o café de saco. Mas como eu tinha vindo a este mundo para tudo aprender à minha custa, ia aprendendo!

Depois dos almoços, como a maioria dos hóspedes ou faziam a sesta ou iam fazer alguma excursão pelas arredores, eu dava-me ao luxo de me repousar um pouco numa daquelas longas cadeiras sob um pára-sol à beira da piscina. Isto graças ao facto de que o João ia almoçar a casa e tinha de ir e vir a pé. Senão teria de também servir o João, o tal que, muito antes dos americanos, inventara essa facilidade do “fast-food”: só meter e tirar! Assim eu dava-me ao luxo de fazer uma pequena soneca. Era frequentemente acordado pelos primeiros clientes ao saltarem para a piscina. Depois era apenas prestar atenção às mãos dos banhistas. Quando eles queriam algo, como não conheciam o humilhante hábito dos portugueses de baterem palmas para serem atendidos, limitavam-se a acenar com uma das mãos. Eu ia correr ver o que desejavam. A minha sorte era que na piscina tínhamos um menu com o nome dos pratos e bebidas propostas e, por baixo, a tradução em Inglês, Francês, e Alemão. Como cada prato ou bebida tinha um número ao lado, assim comecei a aprender a contar em Inglês, Francês, e Alemão.

Os serviços a serem prestados eram normalmente ir buscar um jornal ao “loby” para o freguês ler. Sem esquecer, claro, as muitas idas ao bar buscar bebidas frescas e sandes. Outras vezes ir comprar um frasco daqueles onde havia um óleo especial para proteger a pele das queimaduras solares. O mais divertido era que, quando era um casal, a senhora fazia as costas do marido e o marido as costas da senhora, mas quando eram celibatários era eu que tinha de fazer essa aplicação. Isso para mim era por vezes ainda melhor do que uma boa gorjeta! Alguns pediam-me para fazer apenas as costas, outros voltavam-se para eu também fazer a fachada. Especialmente os cavalheiros. As senhoras não me propunham a fachada e por vezes bem teria gostado do o fazer.

Haviam também duas amigalhaças belgas, muito gordas, que entre nós, eu e os meus colegas, chamávamos-lhes “as baleias”! Elas queriam que eu lhes fizesse a massagem dos pés à cabeça, as fachadas e as traseiras. Foi com elas que comecei a aprender um pouco de Francês. Elas costumavam pedir-me “ pille et face”! Porém, quando era um senhor bem apresentado que tinha deixado a esposa em casa eles apenas queria que lhes fizesse as costas mas eu insistia para fazer ambos os lados, questão de ser serviçal. Um deles, um alemão muito bem servido, ficava um tanto embaraçado com o içar da bandeira, por causa das minhas massagens, para não dizer carícias. Uma vez, por sinais, apontou-me a direcção das escadas que levavam aos vestiários da piscina para estarmos mais à vontade. Claro que nos vestiários o serviço era muito mais completo, de pé, numa das retretes, onde copular não era mesmo nada fácil.
Para mim esses tempos nesse hotel foi como uma indemnização pelos longos meses de castidade sofridos na Ericeira.

Depois das tardes na piscina, era a tal corridinha para a cantina do pessoal para jantar. Logo a seguir o restaurante dos hóspedes. Depois do jantar dos clientes era ir ao nosso vestiário tomar um duche e mudar de uniforme. A seguir a triunfal entrada no grande Bar do hotel onde, por vezes, haviam variedades. Umas vezes um grupo folclórico lá do sítio, outras uma noite de fados com fadistas amadores. Um dia sugeri ao responsável do Bar de talvez uma noite espantar a clientela com um “strip-tease”, mas ele disse que esse tipo de coisa só em Lisboa, nos bares mal afamados. Com um sorriso maroto insinuei-lhe que podia ser eu a fazer o “strip-tease”! Ele olhou-me primeiro bastante surpreendido e, depois duns segundos, segredou-me ao ouvido:

- Isso só em minha casa, depois do trabalho!

Mas como ele era um senhor já de uma certa idade, muito flácido, disse-lhe que esse tipo de coisa entre colegas ou superiores era muito contra os meus princípios!

Essas longas noites no Bar eram qualquer coisa! Eram muitas mesas e muitos clientes que depois de jantar e antes de irem para a cama fornicar as respectivas esposas, gostavam de apanhar uma piela para, talvez, na cama com as consortes, no desempenho das suas obrigações maritais, serem capazes de conseguir “performances” conjugais que ficassem a ser a melhor recordação dessas férias em Portugal, em Vale de Lobos.
A maioria das bebidas solicitadas era o whisky. Constantemente me chamavam para mais dois wiskies, “please”! Eu ia ao bar encomendar dois wiskies e os dois colegas que estavam por detrás do balcão a servir os clientes que ao balcão se encostavam, assim como satisfazerem as minhas encomendas. Quando eu pedia dois wiskies, eu pagava os meus pedidos com um cupãozinho que eu tinha feito assinar pelo cliente e que depois eram lançados nas suas contas a serem pagas quando da sua partida do hotel. Para meu espanto, começaram a pregar-me uma partida que achei graça mas que podia tornar-se em desgraça! Eu aguardava dois wiskies e eles apresentavam-me três wiskies. Eu protestava, que tinha pedido dois wiskies, “not” três! Eles piscavam-me o olho e murmuravam-me ao ouvido, com a mão em pala:

- Um é para ti, cabrão! Emborracha-te!

E eu bebia esse whisky só duma assentada! Depois ia levar os outros dois ao cliente.

Uma noite as “baleias”, já um tanto embebidas de whisky lançaram-me um apelo para eu subir ao quarto delas depois do serviço, que se sentiam muito sós as duas depois da meia-noite. Fingi não compreender o Francês delas e voltei-lhes as costas e voltei às minhas outras tarefas. No outro dia de manhã a Melika previne-me que tivesse cuidado, que as “baleias” andavam a dizer pelo hotel fora que eu devia ser maricas, que dava mais atenção aos homens do que às mulheres. Imediatamente comecei a pôr um travão aos avanços do João e às demasiado frequentes solicitações do alemão. Resolvi portar-me bem pois que adorava trabalhar nesse hotel, a despeito de poder apenas dormir cinco horas por noite. Preferi passar os meus dias de folga em casa do casal onde eu estava hospedado, pois que me afeiçoara a eles quase sem dar por isso. Para eles eu era como o filho deles que se tinha pirado para a Alemanha deixando-os sós naquele casarão de pedra solta, vivendo das rendas dumas terras que tinham alugado. Eles realmente acarinhavam-me e dispendiam-me uma ternura que me falava dos meus velhos tempos da minha infância.

Porém esta minha estadia em Vale de Lobos iria acabar pouco airosamente. Um dia aparece por lá um Costureiro português que ia fazer uma passagem de modelos no Bar do hotel. Ele era um rapaz bastante jovem e bem apresentado e fazia-me olhinhos. Desejei corresponder mas não ousei, respeitando os conselhos da Melika. Ele só lá passou três dias no hotel. No segundo dia dirigiu os preparativos para as mostras das suas criações. Uma longa alcatifa escarlate foi instalada ao meio da grande sala. Puseram as mesas e as cadeiras ao longo dessa larga alcatifa e instalaram holofotes, a que ele chamava “spot-lights”, para seguirem os manequins durante a passagem de modelos.

Na noite seguinte, depois do meu duche e envergado o meu belo uniforme, segui para o Bar e fiquei espantado! As mesas e cadeiras já estavam todas ocupadas, penso que graças aos grandes cartazes que tinha sido afixados por toda a parte no hotel, que tinha também sido anunciado nos jornais locais e os de Lisboa. Nessa noite, além dos muitos hóspedes do hotel, tinha também mais umas dezenas de caras que nunca tinha visto antes. Pensei ter reconhecido algumas actrizes de cinema e teatro cujas fotos tinha visto nos jornais. Nessa noite a azáfama era como nas horas de ponta na Rua da Prata! Eu andava sempre em correrias para atender a todas as minhas mesas. Os pedidos de whiskies eram constantes! Quase cada vez que eu ia ao bar pedir dois whiskies apareciam-me três em cima da bandeja. Claro que eu sabia que o suplementar era para mim. Comecei a engolir dum só trago essas gorjetas dos meus colegas por detrás do balcão! Eu pensava que isso iria ajudar-me a aguentar essa noite dum trabalho descomunal.

Por volta das 10 horas da noite afrouxaram as luzes da sala e puseram uma música de fundo muito suave muito baixinho. O Costureiro pega num microfone e anunciou o seu desfile das suas criações. Anunciou, para começar, um vestido muito garrido a que ele dera o nome de “Tarde de Outono”. Uma rapariga muito jovem, muito bela, muito esguia, saiu da sombra e pôs-se a caminhar duma maneira muito desusada, ao longo da felpuda alcatifa. Os clientes aplaudiam e tomavam notas num bloco de bolso. Os modelos sucederam-se uns após os outros, sempre trajados por essas esbeltas raparigas que marchavam duma maneira muito esquisita. A despeito do “show” ainda estar no meio, esses talvez clientes de Lisboa continuavam a fazer-me sinal para pedir mais uma bebida. Eu ia a correr, talvez também duma maneira esquisita, pois que os os whiskies com os quais eu tinha sido prendado me tinham subido à cabeça e eu já nem sabia a que contas andava nem onde pôr os pés. Para disfarçar, com a bandeja numa mão e a outra na anca, comecei a caminhar sobre a alcatifa, seguindo um dos manequins que devia ser o último da colecção, pois que era sumptuosamente branco e se chamava “Casamento Real”! Bêbedo como estava, desequilibrei-me e a bandeja foi por esses ares fora e eu, no outro dia de manhã, já restabelecido, fui chamado ao senhor director que me pagou três meses de ordenado e me disse olhando por cima dos óculos:

- O senhor está despedido!

Não me preocupei muito. Tinha os meus três meses de salário na mão, uma boa maquia na "Caixa Geral de Depósitos", pedi desculpa do meu comportamento, virei as costas ao senhor director e dirigi-me à porta de saída que viria a ser a minha porta de entrada em Lisboa, para fazer Teatro!

Mas primeiro passaria uns tempos em Mafra nos abençoados braços da minha tão querida e saudosa mãe!

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