dimanche 2 août 2009
O Monumental
Passaram-se umas semanas e um dia telefono. Rogério diz-me que ele almoçava todos os dias no Café Monte Carlo, por baixo do Monumental, que estava lá sempre entre a uma e duas da tarde. Que não era preciso marcar encontro. Que viesse quando pudesse e me apetecesse.
Um dia dei lá um salto e encontro-o almoçando na companhia de Paulo Renato. Ele apresentou-me ao Paulo como sendo um amigo dos tempos da sua tropa em Mafra, e agora um futuro colega como actor. Disse também que eu era um grande poeta e pediu-me para eu recitar um dos meus poemas para o Paulo. Eu recitei-lhes o único poema que sabia de cor, o “Cais do Sodré”, um poema que eu tinha escrito recentemente, durante uma dura fase da minha existência quando, desempregado, a minha última Noite de Natal tinha sido vivida, sobrevivida, no vão duma escada da Sacadura Cabral, faminto e enregelado, chorando as mais amargas lágrimas do meu corpo e que, para não morrer de fome, algumas vezes vagamente me tinha prostituído no Cais do Sodré. Foi a Carmen Dolores que me arranjou trabalho no Aeroporto da Portela, e seria ela também, que muitos, muitos anos mais tarde, quando do lançamento do meu livro de poemas “Vagas”, em Mafra, telefonicamente, num programa da Rádio de Mafra, recitou esse mesmíssimo poema. Por coincidência ou por instinto feminino, ela escolhera o poema que eu mais gostaria de ter escutado na sua voz de grande declamadora nacional, que me fez verter mais algumas discretas lágrimas, por ter tido a grande honra de ter aquele meu muito especial poema recitado por essa mulher pela qual eu me tinha apaixonado quando, muito puto, a vira no ecrã do Cinema de Mafra, no “Amor de Perdição”, onde ela, linda e talentosa, me faria descobrir a idolatria.
O Paulo ficou muito surpreendido com o meu talento como declamador e propôs ao Rogério ele convidar-me para uma matinée de poesia que iam fazer no Monumental dentro de duas semanas. O Rogério concordou plenamente e pediu-me que eu decorasse três poemas meus para essa tarde. Que tinha finalmente criado o meu estilo pessoal, que desta vez o meu poema só parecia influenciado pelo que a vida me tinha ensinado!
”Cais do Sodré”
Olhai gente toda a gente olhai!
Não me fixem do soslaio discretamente…
Olhai-me bem nos olhos frente a frente
Para além de todas as regras e convenções
E digam-me se acharam qualquer resposta
Às vossas dúvidas às vossas suposições!
Não!
Os meus olhos vão fechados e vão desfeitos
E não há moiros na minha costa
Nem portas secretas nem dissimulados alçapões!
Procurai ler a minha história
No livro aberto da noite
Onde as letras sejam estrelas!
Tentai juntá-las e procurar compreendê-las!
Um dia
Pensei escrever a minha história
Com o fumo enrolado e negro dum vapor
Na linha do horizonte sobre o mar
Mas ao iniciar a história verifiquei
Que além d’amor amor muito amor
Eu nada mais tinha para contar.
Por isso nada contei!
Assim deixei o fumo subir
Deixei o barco seguir
E ao mundo as costas virei!
Um dia dei lá um salto e encontro-o almoçando na companhia de Paulo Renato. Ele apresentou-me ao Paulo como sendo um amigo dos tempos da sua tropa em Mafra, e agora um futuro colega como actor. Disse também que eu era um grande poeta e pediu-me para eu recitar um dos meus poemas para o Paulo. Eu recitei-lhes o único poema que sabia de cor, o “Cais do Sodré”, um poema que eu tinha escrito recentemente, durante uma dura fase da minha existência quando, desempregado, a minha última Noite de Natal tinha sido vivida, sobrevivida, no vão duma escada da Sacadura Cabral, faminto e enregelado, chorando as mais amargas lágrimas do meu corpo e que, para não morrer de fome, algumas vezes vagamente me tinha prostituído no Cais do Sodré. Foi a Carmen Dolores que me arranjou trabalho no Aeroporto da Portela, e seria ela também, que muitos, muitos anos mais tarde, quando do lançamento do meu livro de poemas “Vagas”, em Mafra, telefonicamente, num programa da Rádio de Mafra, recitou esse mesmíssimo poema. Por coincidência ou por instinto feminino, ela escolhera o poema que eu mais gostaria de ter escutado na sua voz de grande declamadora nacional, que me fez verter mais algumas discretas lágrimas, por ter tido a grande honra de ter aquele meu muito especial poema recitado por essa mulher pela qual eu me tinha apaixonado quando, muito puto, a vira no ecrã do Cinema de Mafra, no “Amor de Perdição”, onde ela, linda e talentosa, me faria descobrir a idolatria.
O Paulo ficou muito surpreendido com o meu talento como declamador e propôs ao Rogério ele convidar-me para uma matinée de poesia que iam fazer no Monumental dentro de duas semanas. O Rogério concordou plenamente e pediu-me que eu decorasse três poemas meus para essa tarde. Que tinha finalmente criado o meu estilo pessoal, que desta vez o meu poema só parecia influenciado pelo que a vida me tinha ensinado!
”Cais do Sodré”
Olhai gente toda a gente olhai!
Não me fixem do soslaio discretamente…
Olhai-me bem nos olhos frente a frente
Para além de todas as regras e convenções
E digam-me se acharam qualquer resposta
Às vossas dúvidas às vossas suposições!
Não!
Os meus olhos vão fechados e vão desfeitos
E não há moiros na minha costa
Nem portas secretas nem dissimulados alçapões!
Procurai ler a minha história
No livro aberto da noite
Onde as letras sejam estrelas!
Tentai juntá-las e procurar compreendê-las!
Um dia
Pensei escrever a minha história
Com o fumo enrolado e negro dum vapor
Na linha do horizonte sobre o mar
Mas ao iniciar a história verifiquei
Que além d’amor amor muito amor
Eu nada mais tinha para contar.
Por isso nada contei!
Assim deixei o fumo subir
Deixei o barco seguir
E ao mundo as costas virei!
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