mardi 4 août 2009

Um mal nunca vem só!






Depois de todas as lágrimas que derramei pelo meu querido irmão Alberto, depois dessa insubstituível perda, algo mais viria a perder que muito me magoaria! Além de ter perdido o Alberto, agora teria de também perder o Café Estrela, esse doce/amargo ambiente onde ousei abrir as asas à Vida!

O tempo corroía-nos todos um pouco mais cada dia que passava. Cada dia que cada vez mais nos aproximavamos dessa meta final, esse dia quando apenas nos trazem uma lápide, crisântemos para a decorar, pondo um ponto final definitivo a essa curta frase chamada Vida!

Para mim foi um terrível golpe no dia em que a tia Laura muito nervosamente me participou que ela estava já muito cansada da vida de trabalho que tinha no Estrela, que queria voltar para Montachique, para perto da sua irmã, para a casa onde ela tinha crescido, essa pitoresca casa onde se encontrava instalado o Café Satélite. Como ela conformadamente me confessou:

- Apenas mudar de Café!

O senhor Caetano trespasou o Estrela, assim como as sete assoalhadas no segundo andar, a um casal que tinha regressado do Brasil onde tinham ido, já lá iam muitos anos, para fazer fortuna. Eles eram da região de Mafra, e para lá tinham querido voltar. Que esse pequeno negócio dum Café em Mafra era óptimo para ambos para se entreterem e ganhar mais umas patacas. Eles eram muito simpáticos e tinham um sotaque muito esquisito, uma espécie de Português saloio misturado com esse Português cantado que se ouve nas telenovelas brasileiras, que detesto! Eles tinham um filho ainda pequeno, encantador, cujo nome esqueci. Os novos patrões eram a Dona Casimira e o Senhor Martins. Eu pensei que seria conservado no Estrela como criado de mesas, mas isso não viria a ser o caso. Guardaram-me apenas uns meses para eu os guiar e ensinar o dia a dia desse seu novo negócio e, sobretudo, queriam que eu ensinasse a Dona Casimira a fazer os queques, os bolos de arroz e, sobretudo, os pastéis de feijão e bolos de amêndoa, que eram a especialidade da casa.

Quando comecei estas minhas funções, ainda muito convencido que continuaria a trabalhar no Estrela, era com grande prazer que eu lhes ensinava o quotidiano do Estrela, assim como a fazerem os bolos, porém fiquei bastante chocado quando eles me disseram que não me dariam quarto, pois que os quartos que não utilizaassem nessa sete assoalhadas, seriam para alugar aos cadetes! Eu apenas teria as gorgetas e três refeições por dia. Que entretanto, os ajudaria a servir às mesas, das oito da manhã à meia-noite. Enfim, um bom negócio, depois do que possa ter sido o negócio que tenham feito no Brasil!

Como, entretanto, os meus pais tinham mudado de casa, pois que a minha mãe não queria nem podia continuar a viver na casa onde o Alberto tinha expirado, foram viver para a casa que eu, enquanto o Alberto ainda em casa, no seu caixão, aguaradava os preparativos do cangalheiro para esse absurdo ritual com que engalanam um funeral, por muito modesto que seja, fui eu que andei pelas ruas todas de Mafra, de porta em porta, à procura doutro domicílio. Foi na pacata Travessa da Narcisa que encontrei duas janelas com escritos, ali no primeiro andar. Subi, bati à porta e fui atendido pela senhoria. Ela mostrou-me aquela pequena parte de casa, dividida por apenas um tosco tapume com a outra parte de casa ao lado. Expliquei do que urgência se tratava, e a senhora prometeu por um divã num dos quartos, para que a minha se pudesse repousar. Deu-me imediatamente as chaves, que não me preocupasse com a renda, que depois ela falaria com o meu pai, o senhor Alberto.

Agarrei nas chaves e corri para casa, a buscar a minha pobre mãe, que dizia que os seus filhos eram a sua única fortuna! Ao chegar lá, fui buscar a minha Mãe Coragem que não teve coragem de ver o seu querido Aberto ser acartado aos ombros daqueles que nos levam por ofício.

Ela lá estava na sua arrecadação, embrulhada no seu xaile preto, tapando as suas lágrimas com as suas mãos espalmadas sobre o seu rosto transfugurado pela dor. Antes de saír ela chegou-se à porta do qurto do Alberto e, entre portas, acenou ao caixão já fechado com duas velas acesas à sua cabeceira, e soluçou:

- Adeus Alberto! Até qualqer dia, meu amor!

Depois apertou-me nos seus trémulos braços e, olhando o líquido que saía do caixão, do corpo do Alberto que se liquefazia, a fazer uma poça sobre o chão sob o seu caixão, implorou-me:

- Levem-me daqui p’ra fora!

Carreguei com a minha mãe em lágrimas, a pé, até à Travessa da Narcisa. O divã já lá estava à nossa espera, cama feita de lavado, no pequeno quarto de passagem. Deitei minha mãe nesse divã e tombei depois a seu lado, a misturarmos os nossos prantos.

Entretanto tinham chegado a Tia Judite e a Maria Emília que passaram a noite com ela. A nossa senhoria, que habitava na casa ao lado, nesse mesmo primeiro andar, teve a estrema bondade de nos vir convidar a jantarmos na sua casa. Depois desse ligeiro jantar deixei Mãe Coargem nos braços da Tia Judite e segui para o Estrela. Subi ao segundo andar, atirei-me para cima da minha cama, pedi perdão ao Alberto de não o velar, ficar com ele mais umas horas, e só adormeci quando o Carretas fechou o Café e subiu ao nosso quarto. Ele aconchegou-me na minha cama e disse-me de tentar dormir, que me conformasse, que a vida era mesmo assim, que também ele já tinha perdido entes muito queridos da sua família, mas que a vida continua.

De cansaço, dor, de desgosto, entreguei-me nos braços de Orfeu, que me acalentou nas minhas penas, até o sol de novo renascer para todos, menos para o meu querido Alberto, que já não precisava de sol nem de lua, nem de horizontes. Apenas das nossas lágrimas! Secalhar, nem mesmo disso ele já precisava!

No dia seguinte foi ao funeral. Foi nesse dia que jurei ao Alberto que eu viveria por ele todos esses tantos anos que lhe tinham sido tão injustamente recusados!

***

O meu trabalho continuou no Estrela com a Dona Casimira e o Senhor Martins. E era nesse tal quarto de passagem na Travessa da Narcisa que eu comecei então a dormir, depois das mobílias terem sido transferidas da Rua dos Bombeiros Voluntários para a nossa nova residência. Porém, a partir do momento que a Dona Casimira já sabia como fazer os bolos e o Senhor Martins como dirigir o Café, muito gentilmente me disseram que não precisavam mais dos meus serviços.

Uma vez mais me senti como um lenço de papel que depois de utilizado é friamente atirado ao lixo como algo já sem qualquer outro préstimo!

2 commentaires:

  1. Rogério, a tua história de vida dava mais do que um filme, é um facto.
    Nas descrições que vais fazendo, recuando no tempo, fortes emoções humanas afloram à superficie da mente em plena consciência para ti que as viveste e para aqueles que te leêm.
    E não acredito que ao percorrerem as tuas palavras as pessoas não se emocionem ao ponto de lágrimas correrem porque todos somos seres humanos e todos sentimos de igual modo, perante as adversidades da vida.
    Pressinto a urgência em escreveres a tua vida, como se algo muito forte de dentro de ti te incutisse o imperativo disso.
    Fazes esse descrever de vivências de forma original, como se estivesses conversando com amigos, como se nos deleitasses a todos contando histórias.
    Desejo que continues a contá-las, para deleite de quem as lê.

    Um abraço grande de amizade
    Ana Oliveira

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  2. Tem graça! Ou não tem graça nenhuma?
    Acabo de reler este episódio da minha vida e sempre que o faço as lágrimas tombam, como se houvesse em mim uma fnte cristalina sempre pronta a transboradr. Felizmente que, com muita imaginação, também sabemos e podemos viver mmentos duma felicidade inesquecível, como esta de ainda estar vivo e a procurar acabar este meu lvro de memórias para deixar alguns rastos da minha breve passaem por este mundo a que viemos apenas para a continuação de todas as raças. Pena qu netre todas essas raças exista também uma raça que detesto: Os cabrões!

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