samedi 11 février 2012
O Acidente
Tudo na vida tem um começo e tem um fim. A vida é uma longa ou curta peça de Teatro. Umas vezes comédia, outras vezes dum acerbo dramatismo, mas um dia o pano terá que cair! Foi o que me ia acontecendo no dia 8 de Junho de 2011, às 15.30, em Meudon, quando fui fazer as compras para o jantar. Antes de atravessar a rua, na passarela, nos semáforos, aguardei que o senhor encarnado se fizesse verde, para eu atravessar a rua sem correr grandes riscos, mas, repentinamente, senti algo que esbarrou com a minha perna direita e, o que quer que fosse, foi tão rápido, que nunca saberei ao certo o que realmente se passou! Na minha memória, depois do tal "senhor encarnado" nos semáforos, a imagem seguinte que retive, foi eu estar numa maca, dentro duma ambulância, e ao abrir os olhos vi o belo rosto dum jovem bombeiro que tentava reanimar-me. Foi ele que me explicou o que se tinha passado:
Eu tinha sido colhido por uma mota, caído de costas, aberto o cotovelo direito, e uma fractura do crânio.
Depois dos primeiros socorros fui conduzido ao Hospital Becler, em Clamar, tendo antes telefonado ao Pat para que ele me viesse buscar.
Durante o trajecto, continuando a prestar-me os primeiros socorros, pondo pensos no meu cotovelo, cabeça e perna direita seriamente esfacelada, esse zeloso bombeiro explicou-me o que se tinha passado. Eu tinha sido colhido por uma mota, mas o motorista tinha seguido viajem sem me ter prestado os tais primeiros socorros. Que tinha sido um transeunte que tinha chamado os bombeiros, e que eu estava a ser conduzido ao hospital para mais eficazes hospitalares atenções !
Chegado ao hospital, prisioneiro da minha maca, nas Urgências, aguardei a minha vez de ser atendido.
Entretanto Pat tinha chegado e, colado à minha maca, muito preocupado, indagava acerca do que se tinha passado. Expliquei-lhe o melhor que pude, segundo o pouco que eu recordava. Fomos interrompidos por um enfermeiro que me veio buscar para me levar a uma dependência onde três médicos me aguardavam impávidos. Uma das médicas começou então as suas investigações. Cuidadosamente pensou as largas chagas na minha perna direita, pensou o meu crânio, e pôs-me dois pontos de sutura no meu cotovelo direito! Isto feito, informou-me que eu teria de esperar oito horas, antes de poder fazer um scanner para mais completas verificações!
Em baixo, numa espaçosa dependência muito escura, divida em pequenos espaços por uma cortina, vários acidentados aguardavam nas suas macas o momento de serem chamados para serem observados pelo scanner. Durante oito horas ali permaneci sem qualquer assistência, uma bebida, um afago, agredido pelos gritos de dor dos outros acidentados, meus vizinhos. Durante essas infinitas oito horas senti-me como um objecto ali posto de parte, não como um ser humano carente de atenções! Senti-me lixo à espera de ser despejado!
Às tantas, aparece-me, como caído do céu aos trambolhões, uma criatura doutros planetas que, sem me dizer uma palavra, me empurra corredores fora, e me abandona, sem qualquer informação, a um canto dum dos muitos corredores que tínhamos atravessado! Aguardei ali, possuído duma angústia asfixiante, até que outro marciano me veio buscar e me empurrou para dentro da dependência onde se encontrava o scanner, onde, igualmente, outro marciano rindo às gargalhadas duma anedota que o seu assistente lhe tinha contado, me enfia no scanner sem me dirigir uma palavra! Fiquei chocado com aquele tipo de serviços hospitalares onde os pacientes eram coisas e não pessoas!
Depois do scanner reconduziram-me ao meu buraco escuro e, uma vez mais, sem uma palavra, um sorriso, fui novamente abandonado sozinho com a minha fome, a minha sede, o imenso desejo de acender um cigarro, e, sobretudo, o pavor de ter sido ali esquecido para todo o sempre!
Horas depois, um médico, infinitamente humano e atencioso, me veio falar, perguntando como me sentia eu, que o scanner não tinha acusado nada de grave, e que eu podia ir para casa. Dito isto ele entrega-me um relatório dos meis primeiros socorros, desejando-me um bom restabelecimento. E que se eu tivesse dores durante a noite, tomasse uma grama de Doliprane todas as oito horas. Com um alívio imenso telefonei ao Pat, pedindo-lhe que ele me viesse buscar logo que pudesse. Era quase uma da madrugada!
Foi quase correndo que subi as escadas que levariam à entrada das Urgências, onde eu poderia enfim respirar um pouco de ar menos bafiento e fumar um cigarro! Chegado lá fora apercebi-me que eu não tinha cigarros comigo. Ansiosamente aguardei a chegada do Pat para que ele me fornecesse um desses diabólicos cigarros que matam, mas que, quando eu era miúdo, nos gigantescos cartazes por toda a parte em Lisboa, um belo mancebo sobre um imponente cavalo, apertando um belo cigarro entre os grossos lábios, ostentava em grandes letras: « Para ser Homem tem de fumar Marlboro ! »
Mal Pat chegou pedi-lhe um cigarro, mas ele também não os tinha com ele. Como ali à porta vários jovens médicos praticantes fumavam, perguntei se algum deles me podia dar um cigarro, mas fui totalmente ignorado. Continuava a ser uma coisa, não um dos seus semelhantes!
A viagem de regresso a casa foi rápida, e mal subi os degraus que me separavam dos meus malditos cigarros, cai-lhes desalmadamente em cima, enquanto Pat preparou um bom café e umas sandes.
Depois dumas trocas de palavras e de cigarros, fomo-nos deitar. Cada qual na sua cama, no seu quarto, nas suas dúvidas e angústias!
Mal afundei a face na minha almofada, rapidamente mergulhei no mais profundo dos sonos. Não sei se tive sonhos ou pesadelos, sei apenas que, ao meio da noite, fui acordado por horrorosas dores no corpo todo! Dores diabólicas que nunca suspeitara podessem existir! Nesse momento compreendi por que razão o médico me tinha prescrito Dolipran, uma grama todas as oito horas! Levantei-me e alvoroçadamente tomei esse tal remédio! Momentos depois, as dores abrandaram e voltei a adormecer.
Durante catorze dias e catorze noites fui avassalado por essas dores escandalosas! Por sorte, o tratamento ajudou-me a suportar essas dores insuportáveis! Ao fim desses catorze dias, como prescrito, fui ao médico para ele me retirar os pontos do meu cotovelo, e pensei que o caso tinha ficado arrumado mas, muito pelo contrário, dores horrorosas começaram a roer-me de novo. Era domingo e quase meia-noite, e como as dores eram intoleráveis, chamei um médico de guarda, aqueles que nos socorrem quando toda a gente dorme ou foi de férias.
Esse médico, depois de lhe ter falado no meu acidente, explicou-me que as dores no corpo eram dores ósseas, que passariam com o tempo, mas, não sabendo o que fazer, chamou uma ambulância e reenviou-me novamente para esse pestilento hospital donde, duas semanas atrás, eu tinha tão alegremente saído!
Chegado às Urgências desse temido hospital, novamente me instalaram na mesma maca, nessa tenebrosa dependência onde reinavam os gemidos dos negligenciados pacientes, e a total indiferença dos enfermeiros.
Momentos depois apareceu um dos tais enfermeiros que se limitam a empurrar as macas, e acabei novamente enfiado num scanner. Depois duma rápida verificação, informaram-me que estava tudo muito bem, e devolveram-me ao breu da dependência das Urgências, sempre prisioneiro da minha maca, sem qualquer assistência!
Durante três dias e três noites aí fiquei abandonado às minhas dores, com apenas, quando eu pedia socorro, dois comprimidos para acalmar as dores. Ao fim desses três dias, depois de ter feito mais três scanners, queixei-me, que, ao menos, podiam pôr-me numa cama, num dos quartos do hospital!
Momentos depois transferiram-me para um quarto no quinto andar, partilhando com outro doente. Mas, para cúmulo da ineficácia desse hospital, o outro doente era um atrasado mental que quando ia à retrete defecava pelo chão, e limpava as mãos às paredes!
Chamei uma enfermeira e pedi-lhe que me enviasse alguém de responsável que me resolvesse esse problema! Momentos depois um médico veio visitar-me e anunciar-me que eu tinha um problema num rim e que eles não tinham serviço de Nefrologia, e que me iam transferir para um hospital em Villejuif. Eu conhecia esse hospital, quando morei nessa Vila, e que era tão pestilento como aquele onde então me encontrava. Recusei essa transferência ! Sugeriram-me então uma Clínica em Meudon Laforet, que eu bem conhecia e apreciava. Concordei, elevando as mãos aos céus!
Em boa hora cheguei a essa clínica em Meudon! Um sítio limpo e arejado, e as enfermeiras atentas constantemente aos cuidados com os seus doentes! Durante dez dias, sob morfina para aguentar as dores, fui lavado e alimentado com carinho! Não aprecio hospitais nem de clínicas, mas esta merece todo o meu respeito e admiração! Bem hajam todos aqueles que se ocupam de doentes que, para eles, não são doentes nem clientes, são pessoas!
Bem hajam todos aqueles que vieram a este mundo para fazerem o bem!
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